Os direitos humanos, a economia global e a solidariedade contemporânea

30 de novembro de 2021

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A humanidade durante séculos sofreu vicissitudes dos mais variados tipos, contudo, a vida humana ainda persiste até os dias de hoje, cada vez mais plural e diversificada em decorrência dos elementos históricos, étnicos, culturais, políticos, sociais, econômicos, dentre tantos outros.

Com o passar dos anos algumas tradições são reformuladas, transformando-se em costumes com nova roupagem, mas esse processo não é rápido nem se interrompe, por isso, tais tradições sofrem contínuas mutações e dão uma nova face à sociedade internacional.

É importante ressaltar que absolutamente nada é imutável no mundo dos seres humanos, pois a vontade e o livre arbítrio são características típicas dos seres racionais que aprendem com seus erros ou, ao menos, deveriam aprender com esses infortúnios, podendo, justamente, por esse motivo, alterar o próprio destino. A alteração do rumo da humanidade submete-se à vontade, bem como à necessidade e aos anseios dos grupos e subgrupos que compõe a comunidade nacional e internacional, por conseguinte, trata-se efetivamente de uma força dinâmica que impulsiona as mudanças sociais. Essas alterações implicam modificações adaptativas nos direitos humanos que, por serem humanos, devem, essencialmente, acompanhar as exigências da humanidade, evoluindo na tutela dos direitos de primeira, segunda e terceira geração com parcimônia e sagacidade.

Nas últimas décadas, os diversos países que compõem a sociedade global integrada, com maior liberdade de comunicação, de transporte e de circulação de bens, serviços e pessoas, foram impactados pelas crises econômicas locais, regionais, nacionais e internacionais. Como a sociedade internacional e a distribuição de empresas, da agricultura, da pecuária e de tantos outros produtos e valores materiais e imateriais não são uniformes entre os diversos países, uma vez que, muitos deles, acabam por concentrar sua participação no mercado internacional em ramos específicos da economia, vislumbra-se uma dependência intrínseca de todos ou, se não todos, da maioria dos países. Essa situação é perceptível, por exemplo, com as subsequentes crises do petróleo em que poucos são os Estados produtores e o aumento do preço do óleo diesel e de seus derivados eleva o preço de toda a cadeia produtiva que depende direta ou indiretamente de combustível. 

Outro exemplo da interdependência dos países é visualizado com os furacões, cataclismas, terremotos e demais fenômenos da natureza que podem atingir a agricultura de Estados exportadores de alimentos, ocasionando um abrupto aumento do valor monetário desses produtos não só no país produtor, ou seja, no mercado nacional, mas também no mercado internacional, diante da maior escassez do específico produto agrícola. 

As singelas variações de câmbio do dólar, por outro lado, que apresentam elementos de influência multifacetários, por exemplo, ante uma alta significativa, pode estimular os produtores nacionais a direcionarem toda a produção para a exportação, rareando os produtos no âmbito dos países de origem que amargarão, com a redução da oferta, o aumento dos preços desses produtos, refletindo, ainda, no custo da cesta básica e, por isso, tornando-a menos acessível à população, por conseguinte, impulsionando a inflação que corrói o poder econômico do povo. 

Muitos estudiosos poderiam compreender que, em virtude das crises econômicas, com a redução do produto interno bruto dos países, há um colapso também dos direitos humanos, principalmente quando o enfoque é dado aos denominados direitos humanos de segunda geração, porque focados na igualdade (direitos sociais, econômicos e culturais), em que ao se exigir uma prestação positiva dos Estados, com investimentos orçamentários, por exemplo, na saúde e na educação, os recursos seriam proporcionalmente reduzidos, com a diminuição da arrecadação de tributos decorrentes da retração das atividades econômicas. 

Esse raciocínio apresenta uma conotação lógica e razoável, entretanto, nem todos os direitos humanos exigem um alto investimento público ou privado, como a saúde e a educação, de outro lado, os direitos de primeira geração, focados na liberdade (direitos civis e direitos políticos), e os de terceira geração, focados na fraternidade (meio ambiente, autodeterminação dos povos, desenvolvimento etc.), não exigem investimentos vultosos, mas, tão somente, o respeito a esses direitos pelos Estados, pelos demais cidadãos e membros da sociedade. 

Curiosamente, nesse contexto, a solidariedade ou a fraternidade devem ser consideradas como um dos direitos humanos mais essenciais, com a vantagem de não custar absolutamente nada para ser exercitada no dia a dia, pois exige apenas vontade e empatia no curso de nossa vida social e profissional.

Em tempos de pandemia e de outras catástrofes, como se fosse uma fênix mitológica inerente à sociedade, ressurge a solidariedade em variadas frentes, cada vez mais flexível, inovadora e atraente, na medida em que cativa tanta gente a auxiliar as pessoas e os grupos sociais que, naquele momento, por circunstâncias alheias à sua vontade, precisam de calor e de carinho para sobreviver e superar os obstáculos dispostos no seu caminho que, por sua vez, prejudicam sua existência enquanto seres humanos contemporâneos. O calor e o carinho são figuras de linguagem para expressar tudo que possa proteger a vida do ser humano, como, por exemplo, roupas, alimentos, abrigo, dinheiro e qualquer outro instrumento que venha a gerar benefícios aos desprovidos de algum direito.

Uma evolução, em nosso pensamento, portanto, é crucial para que possamos aprimorar o elemento humano: não só em períodos apocalípticos, pandêmicos e catastróficos, em que obrigatoriamente devemos cultuar a solidariedade, mas também em todos os dias de nosso cotidiano e durante nossa permanência no planeta. Pergunta-se: por que quando nós, diante de eventos da natureza, como um terremoto, temos tanta compaixão e solidariedade com o próximo, enquanto, diante dos mais diversos tipos de sofrimento impostos pelo próprio ser humano, não somos tão resolutos e eficientes na logística da solidariedade? Na verdade, podemos dizer que a solidariedade é um dos poucos recursos que quanto mais se usa mais se intensifica a sua força transformadora e, consequentemente, multiplica-se a sua incidência.

Por fim, não devemos nos olvidar da esperança que nos faz ver a vida e o futuro com maiores e melhores expectativas sobre diversos aspectos, o que nos impõe repensar o conceito de direitos humanos e inserir, em seu vasto plexo, a “esperança” ao lado da “solidariedade”, ou seja, como direito humano inalienável de poder almejar prosperidade, melhorando a qualidade de viver e não apenas sobreviver, no presente e no futuro, em qualquer sociedade integrante do globo terrestre.

Esses são os sinceros votos dos acadêmicos e estudiosos dos direitos humanos e do Direito Internacional na era contemporânea, para, com isso, consagrarmos uma real esperança em um mundo melhor e mais solidário.