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Ensino jurídico – Novos rumos

5 de novembro de 2003

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Realizar-se-á no Rio de Janeiro nos dias 24 e 25 de novembro, na sede da OAB-RJ o XXXIII Encontro Brasileiro de Faculdades de Direito. O mais importante acontecimento no Brasil sobre ensino jurídico. Estarão presentes professores e pesquisadores de todo o  Brasil, neste encontro promovido anualmente pelo Colégio Brasileiro de Faculdade de Direito. O Presidente do CBFD, professor Álvaro César Iglesias, recentemente recuperando as origens do colégio observou que o primeiro Encontro Brasileiro de Faculdades de Direito realizou-se em 1971, por iniciativa da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Juiz de Fora. Ao final do evento, foi proclamada a Carta de Juiz de Fora, com preciosas recomendações para o aperfeiçoamento do ensino jurídico.  Mas a principal e unânime resolução ali tomada foi a de que os Encontros teriam que continuar acontecendo, o que se tem cumprido ao longo destes mais de trinta anos.  Já em sua 33.ª edição, constitui-se atualmente no mais tradicional e influente evento de âmbito nacional relacionado ao ensino do Direito.

Nos Encontros VI e VII, realizados em Blumenau e em São Luís, sugeriu-se a criação de uma entidade permanente, cujo único objetivo fosse o contínuo aprimoramento do ensino jurídico e que garantisse a continuidade dos certames.  No VIII Encontro, que aconteceu em Campos do Jordão no ano de 1978, nasceria o Colégio Brasileiro de Faculdades de Direito.

A realidade do ensino jurídico do País mudou muito nestas três décadas testemunhadas pelos Encontros.  E infelizmente não mudou para melhor.  As políticas públicas da área não foram adequadas e o resultado foi a proliferação de cursos, sem o necessário controle da qualidade do ensino ministrado.

É nesse contexto desfavorável, preocupante, que o Colégio tem tido decisiva atuação, procurando unir suas forças às dos segmentos diretamente interessados na boa formação dos bacharéis – OAB, Magistratura, Ministério Público –, para denunciar e, na medida do possível, conter as constantes agressões ao ensino de qualidade.

Na verdade, aqueles que ativamente militam no Colégio, prestigiando seus Encontros, seguindo suas recomendações, divulgando seu trabalho – acreditam que a sólida formação do bacharel sempre dependerá muito mais do esforço dos que efetivamente nela se empenham, no cotidiano das aulas e atividades pedagógicas, do que de fórmulas mágicas e de ambiciosos projetos oficiais, elaborados por quem não tem compromisso com o bom ensino do Direito.

A característica mais marcante do Colégio, enquanto estrutura institucional, é sua absoluta independência, jamais comprometida por quaisquer vínculos privados ou com órgãos governamentais.  Há um quarto de século, tendo por único patrimônio a reconhecida autoridade moral, persegue seus objetivos sem contar com verbas oficiais e alimenta o entusiasmo dos que comungam de seus ideais, oferecendo-lhes, de forma objetiva e eficiente, valores referenciais para a prática do ensino jurídico de qualidade.

A evolução destas questões ligadas ao ensino jurídico tornou expressivo vulto no Brasil moderno. O professor Paulo Roberto de Gouvêa Medina, Presidente da Comissão de Ensino Jurídico do Conselho Federal da OAB, tomando como gestão central a expansão dos cursos jurídicos no Brasil  que vem ocorrendo de forma desordenada.  Já ultrapassou a casa dos setecentos o número de cursos autorizados a funcionar.  São, hoje, 704 esses cursos!  A maior concentração deles verifica-se no estado de São Paulo.  Em cada unidade da federação, não só as capitais e as grandes cidades acham-se saturadas de cursos de Direito, como há uma verdadeira proliferação desses até mesmo em cidades pequenas ou de população inferior a dez mil habitantes. Os Municípios deveriam preocupar-se em ampliar a rede de ensino médio ou em contar com um bom colégio, preferem lutar pela criação de um curso jurídico…  E a situação é tão grave que não seria difícil apontar várias cidades de menor nível populacional que já possuem dois ou mais cursos de Direito!

Os pareceres governamentais conclusivos sobre autorização de novos cursos, não levam em conta o fator necessidade social. A necessidade social pode ser avaliada em função de vários critérios de ordem sócio-geográfica (população do município, rede de ensino médio e superior com que conte, outros cursos jurídicos eventualmente já existentes e vagas que oferecem) e jurídico-cultural (livrarias e bibliotecas especializadas, categoria da comarca, número de advogados militantes, perspectivas de campo de estágio).  Se, no município em que se pretende instalar novo curso, a demanda ou necessidade social já se acha atendida, então a criação desse curso somente se justificará se o seu projeto pedagógico trouxer um traço diferenciado e, pelo nível de seu corpo docente, se puder estimar que se trate de um curso de excelência.

Na XVIII Conferência Nacional dos Advogados, realizada em Salvador, de 11 a 15 de novembro de 2002, tivemos oportunidade de dissertar sobre o tema, quando mostramos que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, por sua Comissão de Ensino Jurídico, leva em conta o referido fator, tendo-o como fundamental, nos pareceres que emite sobre criação de cursos jurídicos.  Mas o pronunciamento da OAB não é vinculativo, razão por que a discrepância entre as conclusões do órgão especializado da entidade e os pareceres finais do Conselho Nacional de Educação tem aumentado, consideravelmente, nos últimos tempos.

Tem-se a impressão de que caímos, nesse particular, numa espécie de laisser faire, laisser passer, em que tudo é permitido. As normas precisam estabelecer critérios racionais para a criação de novos cursos.  Não se pode admitir que a Nação se guie, nesse campo, unicamente pela preocupação em demonstrar que estatísticamente o ensino Superior está crescendo.  Crescer desordenadamente, na área do ensino é um grave risco – o risco de praticar um mau ensino.

A OAB jamais esmorecerá na sua luta contra esse estado de coisas, embora consciente de que os seus poderes para tanto são muito limitados.  A autoridade da OAB reside, exatamente, na sua credibilidade, como instituição, perante a Nação.  A Ordem tornou-se, no Brasil, tal como a American Bar Association, nos Estados Unidos, uma referência, no campo de ensino jurídico.  Por isso, o Conselho Federal da OAB lançou, em janeiro de 2001, o programa OAB RECOMENDA, que atribuiu, na ocasião, selo de qualidade, expresso num certificado especial, a diversas instituições de ensino jurídico, que se destacavam pela qualidade do ensino oferecido.  Até o final da atual gestão, em dezembro deste ano ou em janeiro de 2004, a Comissão de Ensino Jurídico do Conselho Federal da OAB divulgará a 2a. edição do programa, em que já está trabalhando.  Não será um ranking de escolas, mas a indicação daqueles cursos que, segundo critérios objetivos, aferidos mediante o desempenho de seus alunos no “provão” e no Exame de Ordem, são merecedores de destaque.

Finalmente, do ponto de vista técnico, o professor Aurélio Wander Bastos, presidente do Instituto Brasileiro de Pesquisas Jurídicas em conferências e pronunciamentos públicos  tem insistido que o currículo vigente dos cursos jurídicos foi uma grande conquista daqueles que lutarem pelo restabelecimento da ordem democrático no Brasil. As disciplinas profissionalizantes aliadas no processo  formotico as disciplinas teóricas, de preocupação essencialmente humanista, tem contribuído para se fortalecer uma nova hermenêutica mais aberta e comprometida, não propriamente com aplicação imediata e ortodoxa das leis, mas com aplicação das leis no contexto de uma sociedade e mudança.

Para tanto, o professor Aurélio Wander Bastos também conselheiro da OAB tem afirmado que tornou-se imprescindível à dinamização  pela sua natureza histórica, a resolver ou decidir questões de natureza interindividual mais facilmente discutível nos tradicionais fluxos  regulados pelo Código de Processo Civil.

Por estas especiais razões, o colega  Aurélio Wander Bastos, os políticos de governo não podem querer vencer as fragilidades estatísticas da educação superior no Brasil aumentando o número do curso Direito sem qualquer planejamento, fazendo dos estudantes de Direito numerosos para encobrir o fracasso dos políticos de educação superior que não investem nos cursos de necessidades  básicas  do Brasil, como medicina, educação, engenharia e tantos outras áreas. Por outro, tornou-se essencial que o governo brasileiro e as próprias faculdades de Direito invistam em programas sérios de formação de professores de direito para superar o índice ridículo de 1 mestre/doutor para seiscentos alunos. Geralmente, este fato não ocorre em qualquer lugar do mundo. Finalmente,, fragilizar a formação jurídica é fragilizar as instituições democratas. Os professores brasileiros de Direito e advogados estão comprometidos com o Estado democrático de Direito e pugnam por uma formação jurídica qualificada que contribua para romper o atraso institucional e construir uma sólida democracia.