Em nome do pai – Paternidade reconhecida, passo importante na conquista da cidadania

30 de setembro de 2010

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Este mês, a revista “Justiça e Cidadania” apresenta três entrevistas, todas com magistrados ligados a iniciativas que visam facilitar o reconhecimento legal de paternidade. O desembargador Manoel Ornellas de Almeida, corregedor-geral do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), fala do “Projeto Pequeno Cidadão”, implantado em 2007. Outro entrevistado é o juiz-corregedor Luís Francisco Franco, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), responsável pelo projeto “Paternidade Legal”, criado em 2008. E o juiz Reinaldo Portanova, coordenador do “Projeto Pai Presente”, lançado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) em 2009, completa o panorama de uma situação que envolve centenas de jovens brasileiros.

Projeto “Pequeno Cidadão”
Implantado em setembro de 2007, o projeto “Pequeno Cidadão” foi desenvolvido pela Corregedoria-Geral da Justiça do TJMT por intermédio da Comissão Estadual Judiciária de Adoção (Ceja), e visa identificar a paternidade de crianças e adolescentes de até 18 anos que não possuam o nome do pai em seu registro de nascimento. Desde a implantação do projeto, foram beneficiados 3.467 jovens, por meio de reconhecimento espontâneo da paternidade, e mais de 1.500 exames de DNA foram realizados. Em julho de 2010, aconteceu a 3ª Mobilização Estadual do Pequeno Cidadão. Os resultados em Cuiabá e Várzea Grande somaram 451 audiências realizadas, com 279 reconhecimentos espontâneos de paternidade e 122 exames de DNA.

Revista Justiça e Cidadania – Como tem sido a repercussão da iniciativa junto à sociedade?
Manoel Ornellas – O reconhecimento da paternidade pelo Poder Judiciário tem surtido efeito em todos os quadrantes sociais. Basta analisar a estatística resultante das reuniões em colégios entre diretores de escolas e diretores de foros, para sopesar o quanto se faz aproximar os pais dos filhos pelo registro, que muitas vezes não poderia se efetivar por uma questão de somenos importância.

JC – O projeto valoriza bastante a figura da conciliação. Por quê?
MO – O instituto da conciliação faz parte da cultura jurídica brasileira e teve início na Justiça do Trabalho. Hoje, com o incentivo trazido pelos Juizados Especiais e o próprio CNJ, não resta dúvida que é uma das molas propulsoras na seara jurídica para pôr fim ao litígio. Não foge daí a possibilidade de se obter a paternidade por meio desse valoroso instituto como mostra a prática nos meios forenses.

JC – Na opinião do senhor, qual a importância do reconhecimento da paternidade para o desenvolvimento dos futuros cidadãos?
MO – É indispensável, sem a menor dúvida, que o homem, para viver em sociedade, deve reunir todos os pressupostos de cidadania, iniciada pelo seu nascimento com vida. O registro de sua qualificação com todos os elementos o transforma em um ser humano respeitado e portador de boas qualidades. A qualificação completa lhe abre as portas para o futuro, fazendo com que a paternidade seja elemento de primeira grandeza. Portanto, o seu reconhecimento, por qualquer forma, é importante para o bem-estar de qualquer ser humano.

Projeto “Paternidade Legal”
O projeto “Paternidade Legal” foi implementado em setembro de 2008, nas Comarcas de Porto Alegre, Santa Maria, Caxias do Sul, Passo Fundo, Rio Grande e Pelotas. O atendimento consiste em coleta de material genético para a realização do exame de DNA em audiência designada exclusivamente para conciliação, nas ações investigatórias de paternidade/maternidade em que as partes sejam beneficiárias da assistência judiciária gratuita.

Revista Justiça e Cidadania – Que mudanças foram trazidas pelo projeto “Paternidade Legal”?
Luís Franco – O projeto “Paternidade Legal” inovou no procedimento probatório das demandas em que se busca o reconhecimento de filiação. Isso porque a coleta de material necessário para realização de exame de DNA é feita na audiência de conciliação, o que elimina uma etapa, já que suprime o agendamento do exame e as necessárias intimações das partes. Com isso, atinge-se o principal objetivo do projeto, que é a busca da celeridade processual.

JC – Por que a agilidade no resultado é tão importante em casos de reconhecimento de paternidade?
LF – A agilidade no resultado é importante nos casos de reconhecimento de paternidade porque se está tratando de ação de estado, que reconhece vínculo biológico entre pessoas. A partir de tal reconhecimento, existem repercussões de cunho material (prestação de alimentos, direitos sucessórios, por exemplo) e psicológico (reconforto do filho que toma ciência de sua história genética, não se olvidando que, em muitos casos, é o primeiro passo para a criação de vínculo de afetividade efetivo).

JC – Na opinião do senhor, qual a importância do reconhecimento da paternidade para o desenvolvimento dos futuros cidadãos?
LF – A estruturação psicológica do reconhecido faz com que se sinta fortalecido, permitindo que tenha potencializada sua capacidade como pessoa. Demais disso, há o reconhecimento social pelo fato de haver identificação do pai, diminuindo eventuais discriminações advindas da ausência formal da figura paterna no registro de nascimento do indivíduo.

Projeto “Pai Presente”
Lançado em abril de 2009, o projeto “Pai Presente” funciona em parceria com a Secretaria de Saúde e a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Os juízes remetem para a Coordenação do DNA-Fórum Lafayette, em Belo Horizonte, um ofício de requisição para agendamento da coleta de amostras. A UFMG comunica ao magistrado o mês em que poderá agendar a coleta no laboratório credenciado, e este intima as partes para comparecimento no dia da coleta. As amostras são remetidas à UFMG, que realiza o exame e remete o laudo ao juiz. Até julho de 2010, foram realizados 4.993 exames.

Revista Justiça e Cidadania – Quais os principais objetivos do projeto “Pai Presente”?
Reinaldo Portanova – A realização de exame de DNA gratuito às partes que litigam com amparo da Justiça Gratuita em ações de investigação de paternidade/maternidade. A realização do teste e sua conclusão contribuem para celeridade da prestação jurisdicional. Fornece ao juízo e às partes resultado próximo da certeza absoluta da paternidade/maternidade. Tem poder de convencimento por ser um resultado científico. Minas Gerais possui 296 Comarcas, e existem cerca de 283 laboratórios credenciados pela UFMG para coleta de amostras em local mais próximo do domicílio das partes.

JC – Qual a importância da parceria institucional com a Secretaria de Saúde?
RP – A Secretaria de Estado da Saúde de MG dá total apoio à iniciativa. Ademais, a Secretaria de Saúde, ao regulamentar a lei, no Decreto nº 41.420, de 6 de dezembro de 2000, estabeleceu convênio com a UFMG para realização do teste de DNA pelo alto grau de confiabilidade dos resultados e a experiência de quase 100 anos da Faculdade de Medicina da UFMG, além do baixo custo do exame. Sua organização e a constante comunicação que mantém com as comarcas, com juízes e laboratórios objetivam a excelência na prestação jurisdicional.

JC – Na opinião do senhor, qual a importância do reconhecimento da paternidade para o desenvolvimento dos futuros cidadãos?
RP – Dá a conhecer ao filho a identidade do pai. E ao pai a existência do filho. Desperta o sentimento de segurança aos menores, melhor ainda se acompanhado de afetividade recíproca. Promove a paternidade responsável, a convivência do filho com o pai e com a família paterna. Compromete o pai com as necessidades sociais do filho: alimentos, participação na vida escolar do filho, convívio. Na medida em que viver é conviver. Enfim, há ainda o direito à sucessão, que tem também sua importância.