Efeitos Positivos da Cláusula de Desempenho

5 de setembro de 2019

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A Emenda Constitucional 97/2017 instituiu cláusula de barreira – também denominada cláusula de desempenho partidária –, que passou a ser aplicada já a partir das Eleições de 2018 e se consolidará até o pleito geral de 2030. Dispõe sobre a demonstração gradativa do desempenho eleitoral, preconizando que somente terão direito de antena e a recursos do Fundo Partidário os partidos que alcançarem os percentuais definidos, considerados os votos válidos na respectiva eleição, ou lograrem eleger um número mínimo de deputados federais, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da federação, com, pelo menos, 1% dos vowtos válidos em cada uma delas, nas duas primeiras Eleições gerais.

Em reforço à previsão, a citada emenda também vedou, a partir do pleito municipal de 2020, a celebração de coligações proporcionais de que trata o § 1º do art. 17 da Constituição Federal, essencialmente para obrigar os partidos a alcançarem, por suas próprias forças, a contar da Eleição geral de 2022, os votos mínimos exigidos ou a eleição do número previsto de parlamentares.

Ainda que tímida em sua primeira etapa, a edição da cláusula de desempenho na reforma político-eleitoral de 2017, de natureza progressiva, tem significado e se consubstancia em alvissareiro entendimento, resultante de consenso raro dos partidos no Brasil, com vistas à revisão do sistema partidário vigente, em face do nítido crescimento exponencial de legendas nos últimos anos, fato que tem comprometido o financiamento público dos partidos (oriundo do Fundo Partidário, custeado afinal pelo próprio contribuinte). Ademais, é consenso, a exemplo de outras democracias, que o ambiente multipartidário é fator de colapso da representatividade, além de contribuir para episódios de instabilidade política em face da hiper-representação no parlamento.

Se é certo que o sistema proporcional é aquele em que a representação se dá na proporção da preferência do eleitorado pelos partidos políticos (ainda que se evidenciem distorções sob esse aspecto), em que é necessário prestigiar as minorias, com maior razão os partidos devem ostentar certo grau de representatividade – atualmente preconizado pelo legislador –, por meio dos votos dados pelos eleitores nos pleitos, mantendo essa coesão durante os mandatos e dando significação contínua à sua existência, reputados os filiados eleitos à condição de parlamentares.

Em suma, o modelo multipartidário até então em vigor – sem limites à criação de legendas – está sendo substituído por um novo padrão, orientado a combater a fragmentação e fortalecer as legendas com representatividade, alinhando-as à exigência constitucional de seu caráter nacional, além de consolidar suas identidades e seus posicionamentos ideológicos e programáticos. Trata-se, portanto, de medida promissora e dirigida ao fortalecimento da própria democracia, que teve sua origem na Alemanha pós-guerra e atualmente é utilizada em dezenas de países, usualmente motivada pelo crescimento desordenado e danoso do número de greis partidárias.

Por oportuno, observe-se que essa autêntica cláusula de exclusão não se confunde com a de desempenho eleitoral, trazida com a Lei 13.165/2015, que passou a prever a exigência de votação mínima para cada candidato, com vistas à obtenção de uma vaga proporcional, medida que teve a intenção de inibir a vitória daqueles com votação inexpressiva, que se beneficiavam dos conhecidos puxadores de votos de cada partido ou coligação.

Na prática, a cláusula de desempenho (ou de barreira) partidária não obsta a existência dos partidos já constituídos, mas os orienta a buscar outros meios naturalmente lícitos de subsistência, facultando-lhes, ainda, partir para os processos de fusão e incorporação previstos em lei.

Nesse contexto e realizadas as Eleições gerais de 2018, o Tribunal Superior Eleitoral definiu, com base na votação da Câmara dos Deputados e tendo em vista o início da legislatura em 1º.2.2019, que apenas 21 partidos – do total de 35 legendas atualmente registradas – permanecerão tendo acesso ao Fundo Partidário.

Assim, 14 legendas ou 40% dos partidos no Brasil não alcançaram a cláusula de desempenho, ainda na primeira Eleição geral de que trata a regra de transição da Emenda Constitucional 97/2017, a qual também será aplicada, com maior rigor, em 2022 e 2026.

Nesse ponto, uma projeção hipotética a partir da votação válida do pleito de 2018 para a Câmara dos Deputados e reputados somente percentual dos votos válidos ou bancada mínimos indicados pela Emenda Constitucional 97/2017 para os pleitos 2022 (2% ou 11 deputados), 2026 (2,5% ou 13 deputados) e 2030 (3% ou 15 deputados), permite extrair que, em 2022, mais 4 legendas não alcançariam o novo incremento da cláusula de barreira, o que se aplicaria a mais 3 partidos em 2026 e, por fim, a 3 outras agremiações em 2030.

Esse prognóstico em tese permite concluir que, até a consolidação da regra da cláusula de desempenho em 2030, mais 10 partidos se somariam às 14 legendas que em 2018 já não a atingiram, totalizando 24 partidos, o que corresponde a 68,57% e representa mais de dois terços do atual quadro partidário. Desse modo e ao final, apenas 11 legendas teriam atingido os critérios da regra definitiva, para ter direito ao fundo partidário e, caso existente, acesso gratuito ao rádio e à televisão.

Pelo exposto, tais dados resultantes do início da implementação da cláusula de desempenho em 2019 confirmam a situação de distorção vivenciada no sistema partidário e representam, sem sombra de dúvida, a necessidade de correção dessa fragmentação e adoção de critérios razoáveis mínimos, com vistas à consecução de maior equilíbrio no multipartidarismo brasileiro, conferindo aos partidos melhor identidade para o aprimoramento do sistema de representação popular.