Discurso do ministro Luis Felipe Salomão na cerimonia de entrega do XXXI Troféu Dom Quixote e nos 25 anos da Revista Justiça e Cidadania

28 de outubro de 2024

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Orpheu Santos Salles deve estar orgulhoso, onde quer que esteja.

Corria o ano de 1999 quando foi instaurada a primeira CPI do Judiciário, com ataques genéricos à magistratura e uma forte tentativa de criar-se um tribunal de exceção para julgamento (“punição?”) de integrantes do Poder.

A sociedade reagiu. Saindo recentemente de um período autoritário, o Brasil sabia bem o valor da democracia. Enfraquecer o Judiciário como Instituição era enfraquecer nossa recente retomada do estado de direito e do regime democrático.

Foi neste contexto que o visionário Orpheu idealizou, em 1999, a celebração e a entrega do Troféu Dom Quixote e Sancho Pança.

O Troféu, em 25 anos de existência, tornou-se um símbolo de reconhecimento da integridade, da bravura e da justiça, valores que estão intrinsecamente ligados à imagem do Quixote, o cavaleiro idealista, e a Sancho Pança, o fiel escudeiro.

Na história do romance moderno, Dom Quixote exerce um papel reconhecido como seminal, tanto que foi traduzido em filmes e reproduzido em livros por vários autores renomados, como Dickens, Flaubert, Galdós, Dostoiévski, e também por outros mais modernos, como Joyce e Borges. Dom Quixote provou ser uma notável fonte de inspiração, inclusive na pintura e na arte em geral.

Essa premiação é uma verdadeira ode àqueles que se destacam no meio jurídico, não apenas pela capacidade técnica, mas principalmente pela dedicação à justiça e à sociedade.

Ao longo dessas duas décadas e meia, o Troféu foi concedido a diversas personalidades do mundo jurídico e da sociedade civil, reconhecendo em cada uma delas a coragem para enfrentar desafios com princípios éticos e a sabedoria para conduzir os processos com responsabilidade.

Entre os laureados, destacam-se ministros e presidentes de Tribunais Superiores, desembargadores, advogados renomados, além de líderes que transformaram o cenário jurídico, social e político no Brasil.

No discurso de agradecimento na entrega do primeiro prêmio, o ministro Carlos Mário Velloso confessou que Dom Quixote sempre tinha sido um herói para ele e que o juiz brasileiro representava o personagem criado por Miguel de Cervantes, por ter de enfrentar muitos moinhos para proporcionar justiça aos mais necessitados.

É uma lista imponente, contando mais de 500 agraciados, em 31 edições.

Por certo, então, muito difícil destacar alguns dentre tão importantes agraciados.

Como o Quixote, acima de tudo, é um símbolo, resolvi homenagear a todos e todas laureados e laureadas, com dois emblemas.

Hoje temos a honra de contar com a presença do ministro Alexandre de Moraes. Sua atuação firme, resiliente e marcada pela seriedade foi crucial para garantir a lisura das eleições no Brasil, demonstrando a força da nossa democracia em tempos de turbulência. Sua dedicação ao Estado de Direito é um exemplo vivo dos valores representados por este troféu.

Também não posso deixar de mencionar a bravura e atuação decisiva e firme da ministra Rosa Weber, presidente do Supremo Tribunal Federal à época em que enfrentamos um dos maiores ataques à democracia e ao Poder Judiciário: os ataques de 8 de janeiro de 2023. A ministra condenou energicamente os atos antidemocráticos e trabalhou para garantir uma resposta rápida e rigorosa do Judiciário. Rosa Weber, assim como Dom Quixote, foi uma líder inspiradora e sua atuação foi fundamental para manter a estabilidade e a credibilidade das nossas instituições durante esse período difícil.

Assim é o Troféu Dom Quixote e Sancho Pança. A honraria que hoje é concedida e relembrada reforça a importância do compromisso com a defesa da justiça e da ordem social.

Em relação ao meio jurídico, representa um marco de prestígio e seriedade, incentivando a atuação ética e comprometida, algo essencial para a manutenção da confiança nas instituições democráticas.
Não posso deixar de destacar a visão de futuro de Orpheu Santos Salles, meu saudoso amigo, ao criar essa honraria com reconhecimento do valor da integridade e da coragem no exercício da profissão jurídica.

Em tempos de incertezas e desafios, a simbologia de Dom Quixote e Sancho Pança se faz mais presente do que nunca, lembrando-nos da importância de perseverar na luta pelo que é justo, mesmo diante das adversidades.

Orpheu não apenas instituiu um prêmio, mas consolidou uma tradição de valorizar aqueles que, como Dom Quixote, não desistem de seus ideais, e, como Sancho Pança, permanecem firmes ao lado da justiça.

Que este legado, Tiago e Erica, deixado por ele, continue impulsionando a Revista e o Instituto Justiça e Cidadania, no mesmo propósito e que inspire futuras gerações de juristas e defensores do direito.

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