
A reunião do Observatório Nacional da Saúde contou com a presença do desembargador Mozart Valadares (TJPE); do presidente do TJPE, desembargador Ricardo Paes Barreto; do juiz Renzo Giaccomo (TJMG); do vice-presidente do STJ, ministro Luis Felipe Salomão; da conselheira Daiane de Lira; do deputado Pedro Westphalen; do senador Hiran Gonçalves; do presidente do TJRJ, desembargador Ricardo Couto; do ministro Saldanha Palheiro (STJ); da diretora de Redação da Revista JC, Erika Siebler Branco; da juíza Adriana Marques (TJRJ); do desembargador Mário Albiani (TJBA); e do presidente da Revista JC, Tiago Santos Salles
Evento teve a participação de presidentes de tribunais estaduais, ministros do STJ e representantes do Poder Legislativo
Realizada em 9 de junho, na Casa JC, em Brasília, a 21a Reunião do Observatório Nacional de Saúde (ONS) teve como tema “Justiça e saúde – desafios dos tribunais”, reunindo juízes e desembargadores de tribunais estaduais, membros do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e parlamentares. Na abertura, Tiago Santos Salles, presidente da Revista Justiça & Cidadania, destacou a proximidade do aniversário de três anos desses encontros, realizados mensalmente e que visam analisar e colocar em debate a judicialização da saúde a partir de visão estruturante, considerando aspectos econômicos e sociais. “O ONS está consolidado como referência nacional na discussão de soluções plurais nos desafios do sistema de saúde público e suplementar. Nossa missão é promover o diálogo colaborativo entre todos os interessados, consumidores, operadoras, profissionais de saúde, magistrados e gestores públicos”, declarou.
O ministro Luís Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), um dos coordenadores do ONS, destacou que este é um laboratório em que são realizadas pesquisas, escuta ativa e troca de experiências. “Quero agradecer a organização deste encontro. É uma satisfação fomentar esse debate dentro do Observatório, que representa sempre oportunidade para reunirmos todos esses profissionais”, disse o ministro.
Daiane de Lira, conselheira do CNJ e supervisora do Fórum Nacional do Poder Judiciário para a Saúde (Fonajus), destacou o êxito obtido com o Fonajus Itinerante, que vem levando a pauta do direito à saúde para diversos tribunais, ao promover a discussão sobre os desafios impostos pela judicialização com desembargadores, presidentes de Tribunais de Justiça, Tribunais Regionais Federais e a magistratura como um todo. A conselheira, que também é coordenadora do ONS, falou sobre os principais problemas de cada unidade da Federação em relação ao direito à saúde, pontos nos quais o Fonajus vem trabalhando para buscar soluções. “Tem muitos aspectos que são uniformes, mas há questões que cada estado tem nos mostrado. Estamos descobrindo as complexidades da saúde em cada um desses locais”, disse.
Daiane também destacou a instalação, na mesma data da reunião do ONS, do primeiro Núcleo de Justiça 4.0 – Pedido de Medicamentos/SUS, pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP). “Este é um momento representativo, porque é um resultado do primeiro Fonajus Itinerante, que realizamos em agosto de 2020”, e acrescentou que “não dá mais para tratar de direito à saúde sem unidades especializadas, porque precisamos capacitar nossos magistrados e desembargadores”, enfatizou, mencionando, ainda, o crescimento no volume de notas técnicas emitidas pelos Núcleos de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NatJus) em todo o Brasil. Em 2024, o crescimento foi de 40% em relação ao ano anterior. “Em 2025, já ultrapassamos em 50% do número de notas técnicas do ano passado e o semestre ainda não finalizou. Antes, o nosso desafio era fazer com que os magistrados conhecessem o trabalho do NatJus. Agora, o nosso desafio está em ampliar os NatJus para ampliar esse atendimento.”
O desembargador Ricardo Paes Barreto, presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco (TJPE), destacou o ponto crítico na área da saúde em seu estado, que é o atendimento aos casos de Transtorno do Espectro Autista (TEA). “Recentemente fizemos nota técnica que tem repercutido em todo o país, sobre o tratamento do TEA, que hoje é o grande problema pelo qual a saúde passa. São vários níveis do autismo, desde os mais simples, com baixo custo de tratamento, até os níveis cujo tratamento tem alto custo”, disse. O magistrado mencionou também a abertura de duas câmaras “sensíveis” em seu estado, focadas, primordialmente, na saúde da criança e do adolescente, e também das mulheres. “Em pouco tempo, teremos a formação de uma jurisprudência solidificada em relação a essas matérias que realmente afligem os tribunais.”
Também do TJPE, o desembargador Mozart Valadares contou suas experiências quando ainda era juiz integrante da 8a Vara da Fazenda Pública e durante a presidência no Comitê Estadual de Saúde, quando presenciou diversos casos de discrepâncias entre os valores gastos para cumprir decisões judiciais na área da saúde, a fim de atender uma pequena parcela da população, enquanto metade desses gastos correspondia ao orçamento da saúde pública para atender milhões de usuários. Ele também fez questionamentos em relação ao modo como são organizadas as filas para atendimento prioritário na saúde pública. Finalizou com alerta sobre fraudes e outros desequilíbrios no âmbito do direito à saúde: “Temos de ter muito cuidado. A sociedade espera que nós, magistrados, façamos justiça. E algumas vezes eu questiono se realmente estou distribuindo justiça, se foi uma decisão correta”, declarou, o que enfatiza ainda mais a necessidade de buscar apoio dos NatJus, como mencionado pela conselheira Daiane de Lira.
No Rio de Janeiro também observamos o custo altíssimo da justiça. Muitas vezes, o Executivo gasta até seis vezes mais do que gastaria caso procurasse resolver diretamente a questão. Temos, no Rio de Janeiro, uma judicialização muito voltada à entrega de medicamentos, próteses e órteses”, disse o desembargador Ricardo Couto, presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ). Ele também abordou a questão dos ilícitos: “Começamos a constatar situações de fraude também em escritórios de advocacia, que se colocam ao lado de clínicas e ao lado daqueles que seriam os usuários do serviço não prestado tanto pelo poder público quanto pelas empresas privadas, o que faz que se levante uma luz vermelha sobre a necessidade de observarmos com muita cautela a prestação jurisdicional.”
A juíza Adriana Marques trouxe informações em relação ao Comitê de Saúde do TJRJ do qual é integrante, declarando como uma das principais metas a ampliação dos NatJus. “Iniciaremos um [núcleo na área] de saúde privada e outro em saúde pública, que passará a atender todo o estado. Já temos dois NatJus de saúde privada em funcionamento, sendo um deles para os processos de competência dos juizados especiais cíveis e um outro daqueles de competência das varas cíveis.”
A busca de equilíbrio no direito à saúde foi o principal ponto do desembargador Mário Augusto Albiani Alves Júnior, do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA) e coordenador Comitê Estadual da Saúde da Bahia do Fonajus. “Equilíbrio entre a sustentabilidade do sistema público e suplementar de saúde, para a garantia do direito fundamental à saúde. Sem esse foco, nós não conseguiremos alcançar o que tanto se busca.” Segundo ele, essa equação se resolve a partir dos eixos da desjudicialização e da qualificação das decisões judiciais por meio do Comitê Executivo Estadual, que busca diálogo permanente com as demais instituições, “sobretudo criando arranjos institucionais e interinstitucionais capazes de reduzir a judicialização” e que “o contato com o Executivo e o Legislativo é fundamental para mitigar a judicialização da saúde”, concluiu, citando o Pacto em Defesa da Saúde Pública, que foi lançado pelo governo do estado da Bahia, com participação do Judiciário e de outras instituições do poder público. “Estamos em constante diálogo, sobretudo para que haja maior investimento na saúde.”
Pronunciando-se em nome do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG), o juiz Renzzo Giaccomo Ronchi declarou que, há muito tempo, a corte entendeu que não adiantaria apenas discutir as consequências da judicialização, passando a investir nas causas. “O TJMG compreendeu que isso significava investir na qualificação dos magistrados, de maneira a mudar um pouco esse cenário. A primeira coisa que o tribunal fez, em 2019, ainda antes da pandemia, foi criar um grupo de estudos permanente, que já produziu alguns artigos acadêmicos, relatórios técnicos e um manual de atuação do magistrado, tanto na saúde pública quanto na saúde suplementar”, esclareceu. Ele também citou a segunda Vara Cível, em Belo Horizonte, que é exclusiva em saúde suplementar. “Acreditamos que, com essa unidade e o Núcleo de Justiça 4.0, teremos condições de verificar redução sensível nos números da judicialização.”
A 21a reunião do ONS também contou com a presença de integrantes do Legislativo, na pessoa do deputado federal Pedro Westphalen, que disse ver “com alegria a preocupação do Judiciário em buscar caminhos para desjudicializar a saúde, assim como essa aproximação com o parlamento”, disse ele, que foi um dos fundadores da Confederação Nacional de Saúde. Outro representante da política foi o senador Hiran Gonçalves, que apontou uma “assimetria do sistema de saúde público, que é extremamente complexo e muito organizado em alguns lugares e absolutamente incipiente em outros lugares”.
Encerrando o evento, um dos coordenadores do ONS, ministro Antonio Saldanha Palheiro, do STJ, enfatizou a importância de tornar a saúde acessível por todos: “Não adianta você ter comida na mesa, não adianta ter escola, educação e emprego, se não tem saúde. E esse é o problema que vamos ter de enfrentar, porque as necessidades são ilimitadas, mas os recursos são limitados”. O ministro declarou sua admiração pelo trabalho que vem sendo feito pelo Observatório, um projeto inovador, criado em 2022 pela Revista Justiça & Cidadania, sob a coordenação do ministro do STJ Luis Felipe Salomão e do próprio Saldanha Palheiro, contando com a participação da Conselheira Daiane Nogueira de Lira.
A reunião contou ainda com a presença de outros desembargadores de tribunais estaduais e ministros do STJ, além de representantes do Legislativo.
Conteúdo relacionado: