Acessibilidade digital é um compromisso que precisa sair do papel

10 de abril de 2025

Mario Esper Presidente da Associação Brasileira de Normas Técnicas

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A inclusão é uma escolha diária. Imagine precisar pagar uma conta pelo site do banco, mas o botão de confirmação simplesmente não pode ser clicado. Ou tentar comprar um ingresso para um show, mas o formulário não pode ser preenchido usando apenas o teclado. Para milhões de brasileiros com deficiência, esses obstáculos são uma realidade diária no ambiente digital.

A acessibilidade na web não é um luxo: é um direito. No entanto, menos de 3% dos sites brasileiros seguem padrões de acessibilidade, segundo o Movimento Web para Todos. Isso significa que a grande maioria dos portais, dos aplicativos e dos serviços digitais ainda impõe barreiras para pessoas com deficiência, idosos, usuários com baixa alfabetização digital ou até mesmo aqueles que enfrentam limitações temporárias.

Buscando mudar esse cenário, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) lançou nova norma técnica que estabelece diretrizes para tornar websites e aplicações digitais acessíveis a todos. O documento, desenvolvido no Comitê Brasileiro de Acessibilidade (ABNT/CB-040), teve a coordenação técnica do Centro de Estudos sobre Tecnologias Web (Ceweb.br), do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br) e contou com o apoio de entidades como Movimento Web para Todos, Fundação Dorina Nowill para Cegos, Google e Ministério Público do Trabalho (MPT).

A nova norma foi construída ao longo de quase dois anos e envolveu 178 especialistas. São 146 diretrizes que abrangem desde a estrutura do código até o design da interface, garantindo que elementos como imagens, cores, formulários e captchas sejam utilizados de forma acessível.

Ela também inclui checklist prático para que empresas avaliem o nível de acessibilidade de seus sites e façam ajustes necessários. Afinal, “a acessibilidade a torna verdadeiramente inclusiva” — não basta falarmos sobre diversidade se não garantirmos que todas as pessoas tenham condições reais de acessar e interagir com o mundo digital.

A Lei Brasileira de Inclusão (LBI) exige que empresas e órgãos públicos garantam acessibilidade em suas plataformas digitais. Mas, na prática, essa obrigação tem sido amplamente ignorada. A falta de fiscalização contribui para o problema, mas há também desconhecimento generalizado sobre a importância da acessibilidade digital. Muitos desenvolvedores sequer aprendem sobre o tema durante a formação. Um site acessível atende melhor a todos os usuários, não apenas aqueles com deficiência.

Para que a norma realmente transforme o ambiente digital no Brasil, é preciso esforço coletivo. Empresas devem enxergar a acessibilidade não como uma obrigação burocrática, mas como fator essencial de inclusão e inovação. Desenvolvedores precisam ser capacitados para aplicar essas diretrizes na prática. A sociedade civil pode e deve cobrar mudanças.

A ABNT e seus parceiros já deram esse passo ao estruturar padrão sólido e acessível. Agora, cabe a todos transformar essa iniciativa em algo real, garantindo que a acessibilidade digital deixe de ser um desafio e se torne um compromisso efetivo. Porque, no final das contas, a inclusão acontece quando se aprende com as diferenças, e não com as igualdades. Criar ambiente digital acessível não é um favor, mas uma forma de garantir que todas as pessoas possam viver com autonomia, sem barreiras invisíveis que as excluam da sociedade conectada.

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