Um dos maiores objetivos do Tribunal de Contas da União, “ser reconhecido pelo país como instituição de excelência no controle e no aperfeiçoamento da administração pública”, sem dúvida será atingido em menos tempo do que se imagina. E com uma economia de bilhões de reais para os cofres públicos do país.
Nos últimos dez anos, ao investir em tecnologia e competência técnica, na especialização do seu corpo técnico e no trabalho integrado com as diversas instituições de controle dos gastos públicos, como tribunais estaduais e municipais, Ministério Público e Controladoria-Geral da União, o TCU construiu uma reputação de alto nível para a população brasileira.
Foram cerca de 2.000 fiscalizações em um total estimado de 2.500 obras públicas. E mais de 12 bilhões de reais foram economizados pelo país graças ao trabalho dos especialistas e ministros do TCU, hoje presidido pelo Ministro Augusto Nardes.
“Nos últimos dez anos foi possível construir uma jurisprudência sólida, capaz de servir de farol sobre o que pode ou não pode ser feito, e o TCU tem se especializado para orientar os gestores em como bem gastar o dinheiro público”, revela um de seus maiores expoentes, o Ministro Valmir Campelo, ex-presidente do Tribunal e hoje relator de um tema de grande interesse nacional, os gastos e custos da Copa do Mundo de Futebol no Brasil.
Uma apresentação elaborada por ele sobre os gastos da Copa no Brasil e o trabalho intenso e contínuo de fiscalização do TCU sobre as obras públicas constantes da Matriz de Responsabilidades do evento – 74 relacionadas à mobilidade urbana e 12 arenas/estádios – fez grande sucesso no recente Congresso Brasileiro dos Tribunais de Contas realizado no início de dezembro, em Vitória, no Espírito Santo.
Nesta entrevista exclusiva à revista Justiça & Cidadania, o ministro faz diversas revelações inéditas sobre o assunto e outros temas ligados à atuação do Tribunal. Revela números e dados, inclusive a intervenção da fiscalização do TCU para a paralisação de 466 obras públicas que cometeram “irregularidades gravíssimas”.
O Ministro Valmir Campelo revelou que o trabalho do TCU proporcionou, “somente em 2013 e sobre um total de 34,717 bilhões fiscalizados”, uma economia superior a 1,2 bilhão de reais aos cofres públicos e 700 milhões de reais de economia nos gastos das obras para a Copa do Mundo, um dinheiro que seria desperdiçado não fosse a atuação intempestiva da Corte Federal de Contas. Enfatizou, ainda, o slogan básico do trabalho do TCU, “antes de punir, educar”, afirmando que o índice de obras fiscalizadas com “irregularidades gravíssimas tem diminuído ano a ano, ao mesmo tempo em que o índice das que possuem irregularidades de menor gravidade aumentam”.
Leia a íntegra da entrevista:
Revista Justiça & Cidadania – Em termos de benefícios financeiros, qual o resultado das fiscalizações feitas pelo TCU com relação às obras da Copa do Mundo
Valmir Campelo – As ações de fiscalização empreendidas pelo TCU já renderem benefícios próximos a R$ 700 milhões. Isso somente nas auditorias em obras de infraestrutura (portos, aeroportos, mobilidade urbana e arenas). É um estádio de futebol inteiro. Um dinheiro que seria desperdiçado, não fosse a atuação tempestiva da Corte Federal de Contas. Isso sem paralisar nenhuma obra.
JC – Como é feita, na prática, essa fiscalização? Como o Tribunal procede?
VC – O TCU tem buscado realizar as suas auditorias ainda no embrião das contratações. Realizam-se análises dos editais de licitação – para evitar práticas de direcionamento de concorrências – como também nos projetos de
engenharia dos empreendimentos, eminentemente em seus orçamentos. Desse modo, faz-se possível realizar correções em impropriedades identificadas antes mesmo de sua consumação.
JC – O Tribunal já detectou problemas? Quais? E, em função de eventuais problemas existentes, quais as providências tomadas?
VC – Eventualmente nossa equipe técnica questiona alguns critérios de dimensionamento de quantidades para os serviços, como também indaga sobre as referências mercadológicas adotadas para as estimativas de preços. Quando isso ocorre, por meio de reuniões técnicas e muita discussão processual, determinam-se as correções necessárias.
Na maioria dos casos, porém, os próprios gestores reconhecem a necessidade de mudança e, por eles mesmos, reduzem os valores dos contratos ou sobre as estimativas de preços das licitações.
Foi o que ocorreu no Maracanã (com R$ 97 milhões de reduções), na Arena da Amazônia (com R$ 84 milhões), no Aeroporto de Confins (com R$ 70 milhões), nos portos de Natal, Fortaleza, Manaus, Santos e Rio de Janeiro (com R$ 80 milhões), no aeroporto do Galeão (com R$ 30 milhões) e no aeroporto de Fortaleza (com R$ 15 milhões). Existem outros casos…
JC – Consta, oficialmente, que, a menos de sete meses do início da Copa, 75,6% das obras de mobilidade urbana previstas estão atrasadas, incluindo as obras que não mais serão realizadas e/ou entregues para a competição. Parte considerável (38 obras) teve seus prazos prorrogados, o que implicará em maiores custos e ajustes orçamentários. Como o Tribunal vê isso? Como o TCU procede nesses casos?
VC – No que se refere ao transcorrer dos jogos em face dos chamados “canteiros de obra a céu aberto”, de fato, pode ocorrer alguma influência negativa durante a competição; é óbvio.
Todavia, com relação ao que considero ser mais importante – o legado positivo para a sociedade –, depois que o Senado Federal aprovou a Resolução no 10/2013, mesmo que os empreendimentos não fiquem prontos para a Copa, o fluxo financeiro dos empréstimos que irrigam as obras (provindos da Caixa Econômica Federal) estará garantido. Significa que, cedo ou tarde, a população será beneficiada por esses investimentos.
Em verdade, há muito tempo as grandes cidades brasileiras carecem de investimentos de vulto na área de mobilidade urbana. O grande mérito dos megaeventos esportivos, em minha opinião, foi colocar uma lupa sobre essas necessidades. Os governantes estão mais atentos para a questão, porque o povo também está.
JC – A previsão atual de gastos oficiais com as obras da Copa é de 25,6 bilhões, e apenas 3,8 bilhões são de recursos privados. Isso amplia as responsabilidades do TCU considerando-se ainda que boa parte das obras custe mais caro do que o previsto originalmente. Quando isso acontece, como é feita a análise do Tribunal para liberar uma obra com orçamento maior?
VC – Inicialmente, faz-se necessário esclarecer que boa fatia desses investimentos públicos faz-se na forma de empréstimos bancários dos bancos federais. Praticamente todo investimento público para os estádios e para as obras de mobilidade urbana provieram de empréstimos ou da Caixa Econômica Federal ou do BNDES.
Nessas situações, uma vez repassados os recursos, o numerário incorpora-se ao tesouro dos estados e municípios, e a competência originária de fiscalizar as licitações e os contratos decorrentes é dos respectivos Tribunais de Contas estaduais e municipais. O TCU, por sua vez, é responsável pela avaliação da regularidade das operações financeiras, como também de suas garantias. Também avaliamos o custo das obras para evitar algum desvio de finalidade daqueles investimentos dos bancos públicos federais.
Isso entendido, no que se refere ao eventual “estouro” dos orçamentos, avaliamos tudo dentro do que prescreve a lei. Nos termos da Lei de Licitações, as obras podem abrigar um aumento de custos de até 25%; no caso de reformas, o limite é de 50%. Quando existe a extrapolação desses limites, são tomadas as medidas legais pertinentes. E independentemente do montante de acréscimo – é importante esclarecer –, avaliamos sempre se os aditivos também respeitam os preços de mercado.
JC – Em que situações o TCU aceita atrasos e aumento de custos?
VC – A questão dos atrasos e dos aumentos de custos perpassa pela qualidade do projeto; pelos gastos realizados anteriormente à realização da obra propriamente dita.
O TCU vem apontando, de longa data, que a insuficiência no planejamento e as falhas na elaboração de projetos são as primeiras causas das mazelas identificadas em obras públicas pelo país. Essa é uma realidade que o Tribunal vem tentando mudar no decorrer dos anos. Muito já foi feito. Começamos as fiscalizações, como disse, cada vez mais cedo. Mas é claro que também existe longo caminho a ser percorrido; e sem dúvida que isso tangencia as obras e os projetos para a Copa do Mundo. Não se muda toda uma cultura do dia para a noite.
JC – Em muitos casos houve recorrentes pedidos de aditivos orçamentários, logo no início das obras, como no caso de obras portuárias. Isso acontece por quê?
VC – No caso específico das obras portuárias, temos observado que a fonte de maior número de aditivos concentra-se nas falhas nos estudos de sondagem e batimetria. Caso o subsolo “real” seja diferente do “projetado”, inevitavelmente haverá soluções técnicas distintas, o que interferirá no valor do empreendimento.
Outra situação é que muitas intervenções em áreas portuárias serão realizadas em terrenos onde já existem outras edificações, o que, mais uma vez, dificulta um estudo mais perfeito do subsolo.
Tendo em vista esse recorrência, estamos trabalhando para verificar a conformidade dos normativos técnicos minimamente suficientes para embasar um projeto básico de engenharia para se licitar em obras portuárias. Creio ser essa uma grande oportunidade do controle, porque terá o condão de melhorar a gestão e a governança do setor público em todos os futuros investimentos nos portos pós-Copa.
JC – O TCU, com as fiscalizações empreendidas, já conseguiu substancial economia de recursos públicos? Podem-se precisar os valores dessa diminuição de custos?
Somente no ano de 2013, as fiscalizações de obras no Tribunal renderem benefícios superiores a R$ 1,2 bilhão.
JC – O que são benefício potencial e benefício efetivo nesses processos de execução das obras?
VC – “Benefícios potenciais” são os benefícios correspondentes às deliberações do Tribunal, provenientes das auditorias, cujo cumprimento ainda não foi verificado pelas equipes de fiscalização.
“Benefícios efetivos” são os decorrentes do cumprimento já confirmado de deliberações do TCU; ou, ainda, irregularidades já corrigidas pelos gestores antes mesmo de o Tribunal julgar a questão.
JC – O que, para o TCU, significa Fiscobras?
VC – O Fiscobras é o programa de fiscalização anual de obras do TCU, em cumprimento ao comando da Lei de Diretrizes Orçamentárias, que empreende determinações à Corte Federal de Contas para informar ao Congresso Nacional a situação das obras em que o Orçamento da União alocou recursos. Desse modo, os parlamentares têm subsídios para deliberar ou não pela continuidade dos recursos para aquela obra no ano seguinte.
JC – Consta que, nos últimos dez anos, a atuação do TCU tem sido tão relevante que as chamadas “irregularidades gravíssimas” têm diminuído ano a ano, embora tenha havido aumento das chamadas “irregularidades de menor gravidade”. Como se explica isso?
VC – De fato, acredito que esse “fenômeno” indique que, realmente, as auditorias, nesses últimos dez anos, têm dado resultado. Primeiro porque aumenta a “expectativa do controle” por parte dos jurisdicionados, que sempre têm em mente que a qualquer momento podem ser fiscalizados. Segundo porque, no decorrer desses anos, foi possível construir uma jurisprudência sólida, capaz de servir de “farol” sobre o que pode ou não pode ser feito.
Por último, porque o Tribunal tem também trabalhado para orientar os gestores em como bem-gastar o dinheiro público. Antes de punir, educar. Ações como o “Diálogo Público”, adotada por esta Corte à época de minha presidência na Casa, têm sido ampliadas na atual gestão pelo eminente Presidente Augusto Nardes.
JC – Quantas obras públicas o TCU fiscalizou nos últimos dez anos? Quantas tiveram que ser paralisadas por irregularidades gravíssimas e quais a principais irregularidades? E como o Tribunal procede nesses casos em que há paralisações de obras?
VC – Não tenho números redondos, mas foram, certamente, 2.500 obras e mais de 2.000 fiscalizações. Um histórico do número de obras com indício de irregularidade que, por sua gravidade, ensejaram a recomendação de paralisação pelo TCU pode ser observado a seguir.
JC – Quais são as chamadas “irregularidades de menor gravidade”? Há alguma explicação do porquê de elas aumentarem? Qual o procedimento do TCU?
VC – Irregularidades de menor gravidade são as chamadas impropriedades meramente formais. São falhas que, embora indiquem uma desarmonia na aplicação da legislação específica, não repercutiram, no caso concreto, em prejuízos para o erário. Nesses casos, o Tribunal notifica o órgão e o gestor faltoso para que, em próximas oportunidades, observem a correta aplicação da lei. Na reincidência, aí sim, parte-se eventualmente para a apenação.
JC – Como tem sido a reação do Congresso Nacional e do Poder Executivo? Eles têm ratificado as recomendações do Tribunal de Contas?
VC – No decorrer dos anos, o Congresso tem anuído aos encaminhamentos do TCU. Nos últimos anos, porém, em face de medidas saneadoras adotadas pelos gestores após o julgamento de mérito do processo do Tribunal, ou mesmo do compromisso formal dos órgãos contratantes, o Congresso tem deliberado pela continuidade das obras.
Mesmo nesses casos, tendo em vista a efetiva correção das irregularidades, acredito que o fato reafirma o potencial de benefícios para a sociedade decorrente dessas fiscalizações.
JC – Quais são as principais razões para o aumento da eficiência e da eficácia das fiscalizações das obras da Copa e das auditorias de obras públicas em geral?
VC – Acredito que o intenso investimento na especialização do corpo técnico seja a principal razão para o aumento dessa efetividade. Sem auditores capacitados e formados em um vasto leque multidisciplinar, de forma a atuar em uma gama de áreas diferentes, não teríamos chegado a esse ponto. Atuamos em obras, tecnologia da informação, mercado financeiro, saúde, educação, esporte, concessões, renúncias creditícias e tributárias, publicidade, enfim, em toda ação pública que exista a aplicação do dinheiro da sociedade.
JC – O TCU trabalha com especialistas em várias áreas, desde planejamento até a finalização de uma obra pública? Quais são as principais especialidades para a eficácia de uma fiscalização pelo TCU?
VC – Em uma obra pública, atuamos desde a concepção dos empreendimentos, avaliando os estudos comparativos de viabilidades técnica, econômica, financeira e ambiental, até os projetos, os orçamentos, as licitações, a execução contratual, a entrega da obra e o pós-obra. Como disse, investimos maciçamente em treinamentos e, nos últimos dez anos, em recrutamentos específicos nessa área.
Contamos com quatro secretarias de fiscalização de obras, divididas em dez diretorias, com mais de cem engenheiros. Cada diretoria, por sua vez, tem uma especialidade de tipologia de obra a fiscalizar (uma para portos, outra para aeroportos, outra para ferrovias, outra para edificações, outra para saneamento, outra para infraestrutura energética, e assim por diante).
JC – Em que nível o TCU pode punir os responsáveis por irregularidades em obras públicas? Recentemente, o TCU paralisou diversas obras do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), e a Presidente Dilma Rousseff se manifestou publicamente contra as paralisações alegando que isso prejudicava o povo. Como analisa esse tipo de conflito?
VC – As punições vão desde a multa aos gestores faltosos até a inabilitação para a ocupação de cargo ou função pública. Também declaramos a inidoneidade de empresas que praticam faltas gravíssimas no procedimento licitatório.
Além disso, todo aquele que dê causa a prejuízo ao erário em face de recurso federal sob sua guarda pode ser condenado em débito para devolução daqueles valores corrigidos; mais multa. Tal sentença é um título executivo que pode imediatamente ser executada pela Advocacia-Geral da União.
No que se refere às paralisações de obras, por vezes atribuem ao Tribunal de Contas da União responsabilidade pela inexecução de empreendimentos fundamentais para o país com a alegação de rigor excessivo em suas decisões, colocando em dúvida os resultados das ações a cargo do Tribunal, sob o argumento de que “obra cara é obra parada”.
A acusação é inteiramente injusta e infundada. Creio ser possível creditá-la à falta de conhecimento sobre a maneira técnica e cuidadosa com que atua o Tribunal nesse campo. O TCU jamais deixa de medir as consequências de suas deliberações, sabendo que uma obra inacabada configura situação indesejada sob vários aspectos e desperta a indignação de toda a coletividade.
Para desmistificar a errônea ideia de que o TCU é o grande culpado por eventuais paralisações, esclareço que, na verdade, historicamente, a principal causa de paralisação de obra pública refere-se a problemas no fluxo orçamentário/financeiro, com mais de 50% dos casos. Em menos de 1% das situações, o motivo determinante tem a ver com alguma deliberação da Corte de Contas.
É que a atuação do TCU nesse tipo de acompanhamento pauta-se pela tentativa de preservar ao máximo a continuidade do empreendimento mediante atuações preponderantemente corretivas.
Somente quando se depara com fatos extremamente graves, em que a continuidade da obra pode representar risco de prejuízo de difícil reparação, é que o Tribunal adota a providência extrema no sentido de exigir medidas como a anulação ou a rescisão de contratos.
JC – “Dê-me o fato. Dar-te-ei o direito”. O que essa máxima significa na essência do trabalho do TCU?
VC – Significa que, para empreender a subsunção jurídica de um fato, ou seja, aplicar a lei para o caso concreto, urge primeiro que se conheça o fato em julgamento. Se vai se aplicar a lei para um contrato de execução de obra, faz-se necessário ter o domínio desse fato. Por isso, grifei que a especialização do corpo técnico do TCU foi preponderante para o aumento da efetividade de nossas ações.
E o poder público também precisa investir nessa especialização de seus agentes. Não somente na área de engenharia, mas também em TI, telecomunicações, etc. Viabilizar uma carreira de estado para essas especialidades. É o primeiro passo para se bem planejar e contratar. Em verdade, para se bem gerirem os recursos públicos.
JC – Sabe-se que, de uma maneira geral, 60% das verbas destinadas à propaganda e à publicidade pelos governos, estatais e empresas em geral, são uma espécie de “dinheiro desperdiçado”. Isso quer dizer que os mesmos objetivos de propaganda e marketing seriam atingidos com custos muito menores, e isso vale tanto para a iniciativa privada como para o poder público. É assim no Brasil e em diversos outros países. Como o TCU analisa isso? Quais são os mecanismos existentes no TCU para fiscalizar isso com relação ao poder público federal?
VC – Como em outras áreas, repito que o caminho seja a especialização. Faz-se necessário conhecer as nuanças desse mercado (publicidade), suas práticas, suas idiossincrasias, suas particularidades. E é isso que temos feito, com a construção, também, de uma jurisprudência fundamentada sobre boas práticas do setor.
JC – Como é a relação entre o TCU e os Tribunais de Contas dos estados e municípios? No caso da Copa, os chamados “Comitês Gestores Locais” estão também subordinados ao TCU principalmente nos gastos relativos aos eventos – como agora, por exemplo, dos gastos com o evento de sorteio dos grupos realizado na Costa do Sauípe, estimado em alguns milhões de reais pagos pelo poder público? Cabe ao TCU fiscalizar isso?
VC – Sobre o relacionamento com as demais Cortes de Contas, acredito que um legado positivo desses megaeventos esportivos seja o know-how adquirido para o trabalho integrado entre as diversas instituições de controle envolvidas com os gastos da Copa. Trabalhamos de forma integrada, tanto com o Ministério Público, como com os demais Tribunais de Contas dos estados e municípios.
Em razão das diversas fontes de recursos envolvidas na Copa (federais, estaduais, municipais e privadas), diversos eram os órgãos incumbidos de avaliar a regular aplicação dos recursos. Para evitar duplicidades de esforços e aumentar a eficácia de nossas ações, em face da limitação de recursos, tivemos que aprender não somente a integrar nossas forças, mas a compartilhar nossas experiências – o que foi crucial, tendo em vista o viés multidisciplinar que contorna as ações necessárias para a realização de uma Copa do Mundo bem-sucedida.
Posso acrescentar que, no caso da União, o governo federal participou com recursos do Tesouro e também com empréstimos de seus bancos públicos (eminentemente do BNDES e da Caixa Econômica Federal). Essas particularidades levaram a novas formas de pensar as competências e os limites do controle externo.
É que, para as obras em que os recursos federais limitam-se aos empréstimos do BNDES e da Caixa (e isso inclui os estádios de futebol e as obras de mobilidade urbana), a competência do TCU limita-se à avaliação de regularidade da transferência dos recursos do financiamento. Uma vez repassado o dinheiro, o recurso incorpora-se ao tesouro dos estados e municípios, e a competência constitucional de avaliar a regularidade das licitações e dos contratos é dos respectivos Tribunais de Contas estaduais e municipais. O TCU, dessa forma, não atua diretamente na fiscalização dos entes federativos, mas em auditorias nas instituições de crédito, evitando que elas transfiram dinheiro para obras com preço acima do preço do mercado. Os bancos púbicos, afinal, não podem financiar empreendimentos “superfaturados”. É, portanto, um trabalho conjunto dos diversos órgãos de controle: um atuando nos bancos; outro, diretamente nos contratos e nas licitações.
JC – Em termos gerais, a atuação do TCU é fator determinante para o sucesso da Copa no Brasil, significando MENOS custos para MAIS OBRAS e EVENTOS? Ou seja: a população brasileira pode ficar tranquila com a atuação do TCU como instrumento fiscalizador de excessos e irregularidades?
VC – Creio que o resultado de nosso trabalho diga por si: R$ 700 milhões de benefícios à sociedade. É mais de meio bilhão que agora pode ser empregado em prol da coletividade. Essa atuação na Copa do Mundo contribui para engrandecer a missão do TCU: “Ser reconhecido como instituição de excelência no controle e no aperfeiçoamento da administração pública.”