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V Seminário Luso-Brasileiro de Direito: as várias perspectivas da governança

30 de maio de 2017

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Evento reuniu especialistas do Brasil e de Portugal para um intenso debate que colocou em pauta diversos aspectos da governança, do ponto de vista da política, da economia e da cidadania.

Com o tema “Constituição e Governança”, o V Seminário Luso-Brasileiro de Direito foi realizado no Auditório da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL), em Portugal, de 18 a 20 de abril. O evento é realizado anualmente pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP).

Apresentada por Jairo Schäfer, professor de Direito Constitucional da Escola de Direito de Brasília (EDB/IDP), o evento teve sua mesa de abertura composta por José Duarte Arché Nogueira, presidente do Conselho Científico da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL); Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente da República do Brasil; Gilmar Ferreira Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e coordenador do Mestrado Acadêmico da EDB/IDP; Carlos Blanco de Moraes catedrático da FDUL e consultor principal da Presidência do Conselho de Ministros; João Otávio Noronha, ministro do STF; Cesar Correia Campos, diretor da FGV Projetos; e Luís Alberto Figueiredo Machado, embaixador do Brasil em Portugal.

Convidado a palestrar como conferencista principal, o sociólogoFernando Henrique Cardoso, destacou a questão da representatividade política no País. “Hoje, temos no Brasil 28 partidos e outros 70 estão na fila de registro. É muito difícil governar um país quando a fragmentação chega a este nível”. Para ele, o sistema tradicional, que era a ligação entre a estrutura social, a organização política e a ideologia, quebrou. “Não foram só os partidos que se fragmentaram. A sociedade mudou, a forma de organizar a vida é outra. A crise que vivemos é uma mutação da civilização e que tem consequências políticas. Teremos que adaptar nossas instituições ao modo de viver contemporâneo. Hoje, as pessoas se conectam de outra maneira e os partidos deverão atuar de um modo a que não estavam habituados, já que não existe democracia sem partido”, declarou o ex-presidente, em torno da questão da força que têm as redes sociais, hoje, na fiscalização dos poderes políticos.

Democracia representativa

Dando continuidade à abordagem de Fernando Henrique Cardoso, o primeiro painel do Seminário tratou do tema “Crise da Democracia Representativa e Governança do Sistema Político”, com moderação deMauro Campbell Marques, corregedor-Geral da Justiça Federal e ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Para o palestrante Manoel Gonçalves Ferreira Filho, professor emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), a crise da democracia representativa é, hoje, lugar comum entre os estudiosos da políticas. “Em concorrência com este sistema, outros não democráticos têm conquistado espaço, como o regime político da China. “Há uma crescente descrença na democracia que coloca o sistema em risco. A decepção com a governança e o desencanto com os eleitos estariam entre os principais fatores para este quadro, mas uma série de outros elementos está em jogo”, afirmou.

O advogado António Vitorino, ex-comissário Europeu para os Assuntos de Justiça, ex-ministro da presidência e ex-docente da FDUL, falou sobre a crise da democracia representativa na Europa, dando um vislumbre da atualidade, com breve retrospectiva do século XX, décadas subsequentes que foram, em sua opinião, uma sucessão de crises até os dias de hoje. “Nós, na Europa, sempre defendemos a crença de que a liberdade e a democracia eram pressupostos inquestionáveis do crescimento econômico e do bem-estar social. Quando olhamos para o mundo, assistimos a deslocação do centro de crescimento econômico para a região Ásia-Pacífico. Em 2030, dois terços das classes médias estarão nessa região”, declarou. Isso serve de base para explicar que o protesto da democracia representativa não é o dos descamisados, mas a insatisfação das classes médias, fruto do crescimento irrisório que vêm assistindo”, pontuou.

Por sua vez, Carlos Blanco de Morais abordou o tema da insatisfação democrática sob a perspectiva de diversos autores que analisam a democracia representativa. “As crises, sob diferentes aspectos, e em face de distintos setores, são o reflexo da crise da democracia representativa”, declarou. Ele apontou, como principais causas, a dominação econômica sobre os legítimos interesses da democracia, e o pluralismo partidário, dando margem a cartéis políticos, o que diminuiu as opções para os eleitores.

Fechando o painel, o ministro Gilmar Ferreira Mendes, fez um apanhado geral de tudo que foi exposto. Segundo ele, há muitas coincidências nas análises e críticas que se fazem ao sistema brasileiro, que tem sua democracia representativa baseada no modelo europeu. “No Brasil, a rigor, não temos partidos políticos. Na verdade, temos um falseamento da democracia partidária. O nosso esforço é de fazer uma reforma política que pelo menos estruture os partidos. Temos hoje 35 legendas registradas e outras 58 candidatas a registro. Isso conta uma história muito breve de uma distorção. Temos que discutir o processo de reforma. Eu sou cético em relação a ideias como esta de um processo constituinte novo para tratar de reforma política. A articulação é complexa e tem que envolver a sociedade, no sentido de avançar as reformas, e não podemos deixar isso para outro momento”, defendeu o presidente do TSE.

Sistema Eleitoral

Moderado por Nuno Piçarra, professor da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa (UNL), o segundo painel do Seminário teve como tema “Sistema Eleitoral e Governabilidade”.

O primeiro a se apresentar foi José Antonio Dias Toffoli, ministro e vice-presidente do STF. O foco de seu pronunciamento foi a cláusula de desempenho, mencionando a decisão do STF que declarou inconstitucional este instrumento. “Há a cláusula de barreira, que é o número mínimo de votos que uma legislação nacional estabelece para que um partido tenha acesso às cadeiras, pelo número de representantes, independentemente do sistema. A cláusula estabelecida e declarada inconstitucional não era de barreira e sim a de desempenho. Porque não impedia que o partido que não tivesse alcançado o número de votos pré-estabelecido na legislação fizesse a cadeira”, esclareceu.

Em seguida, Eros Roberto Grau, ministro do Supremo Tribunal Federal de 2004 a 2010, fez sua apresentação. “Eu diria que, quando falamos de sistema eleitoral e governabilidade no Brasil, estamos falando de um só tema. O sistema eleitoral que melhor assegure a governabilidade no Brasil”, comentou. Ele também tocou no tema do voto em lista fechada. “Como funciona efetivamente? Se eu olhar o Brasil de depois de amanhã, eu diria que tem sentido imaginar só um sistema eleitoral nos dois ‘brasis’? Quem sabe fosse prudente imaginarmos mais de dois sistemas eleitorais no Brasil. Voto unipessoal lá ‘em cima’, voto em lista fechada no Sul, ou o inverso. Eu estou simplesmente propondo que sejamos abertos. Que precisamos refletir sobre isso”, concluiu.

Sergio Victor, professor de mestrado do IDP, assessor chefe da presidência do STF, defendeu que o sistema eleitoral não é um fim em si mesmo, mas a governabilidade pode ser ou não. “Os dois temas do painel estão interligados. No caso do Brasil, parece ser um país que requer governabilidade. Percebemos que os partidos em campanhas falam em planos, reformas etc.. A Constituição brasileira é pródiga em seu elenco de direitos, e o Brasil me parece um país que requer estado, para o fito de facilitar a governabilidade. É preciso permitir que o estado atue, mas que seja dentro de limites, de regras”, defendeu.

Serviços públicos

O terceiro painel foi aberto com o tema “Governança dos Serviços Públicos da Administração Central” e moderado porJosé Levi do Amaral, secretário executivo do Ministério da Justiça do Brasil. Para a palestrante Maria Manuel Leitão Marques, ministra da Presidência e professora da FEUC, os tempos atuais constituem um enorme desafio na política, na economia, na ciência, na tecnologia e na sociedade. “Hoje, o que cidadãos esperam de nós é o mesmo o que esperam dos fornecedores de serviços privados. Para podermos alcançar essa meta, são necessárias cinco orientações essenciais: a colaboração, a reutilização/partilha, a proximidade, a participação e a inovação”, apontou.

Osmar Terra, ministro do Desenvolvimento Social e Agrário do Brasil, deu um vislumbre no trabalho da pasta e comentou sobre a reorganização dos programas sociais, que vem sendo feita no sentido de aumentar a base de controle, dentro do conceito de governança pública. “A governança eficiente dos benefícios sociais tem papel central da redução do déficit da previdência, por exemplo”, elencou.

Benjamin Zymler, ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), fez uma apresentação focada na ideia de governança e na atuação do Tribunal. “Não há nada de revolucionário no conceito de governança pública. A própria Constituição tem muitos termos relacionados a isso, à eficiência e à eficácia. A governança deve respeitar os espaços da política, mas o que vemos no Brasil e no mundo é que há uma realocação. O controle administrativo de governança passa a invadir os espaços políticos e vemos coisas que jamais ocorriam em tempos passados”.

Para Domingos Farinho, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL), hoje convivemos com serviços públicos que refletem quatro camadas de dificuldades para os governos. Um deles seria o efeito de verticalização do governo e dos serviços públicos, o que compromete a gestão de serviços que tenham caráter de compartilhamento. “Um segundo problema tem a ver com a revolução na administração pública no começo do século XX, com a criação das autarquias. O terceiro foi o surgimento das administrações autônomas e independentes, enquanto que o quarto tem a ver com a influência de novas teorias de governança de serviços públicos”, afirmou.

Mobilidade urbana

O segundo dia de evento começou com o painel “Governança das Zonas Metropolitanas e Mobilidade Urbana”, moderado porCesar Cunha Campos, diretor da FGV Projetos. Para sua palestra, Bruno Araújo, então ministro das Cidades do Brasil, optou por conversar sobre duas problemáticas: as questões urbanas aliadas à governança, mostrando um retrato da evolução demográfica do País no contexto da mobilidade. “Os desafios são imensos. Dentro do plano estabelecido pelo Estatuto da Metrópole só 5% dos municípios brasileiros prepararam seus planos de mobilidade o que levou o congresso à prorrogação deste prazo”, declarou.

Em sua palestra Fernando Medina, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, destacou como primeiro ponto, o fato de que mobilidade não é “transporte”, e sim um conceito muito mais vasto. “A questão central da mobilidade é onde estão as habitações, os empregos, o lazer, as escolas, etc., no espaço territorial e como ligar estes pontos. Para discutir a mobilidade, é preciso antes descobrir os motivos que levam as pessoas a morarem, trabalharem ou estudarem em determinados locais”, disse.

Roberto Cláudio, prefeito de Fortaleza (CE), começou dizendo que o Brasil está sempre ansioso por transformações e desenlaces de seus dilemas, mas a solução para esses desafios passa pela gestão municipal. “É muito importante que estejamos atentos para as mudanças que ocorrem no dia a dia dos municípios brasileiros. Olhando para as experiências de cidade que têm dado certo no mundo, como Medellín ou Bogotá, a gente irá entender melhor. Não há mágica, mas sim o binômio do planejamento e da maturidade política”.

“É muito claro que, há algumas décadas, em todo o mundo, se assiste a um fenômeno de interrupção da urbanização de pequenas e médias cidades para a expansão da urbanização de regiões metropolitanas”, declarou em sua palestra Leitão Amaro, assistente da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL) e deputado. “Em Portugal, as duas áreas metropolitanas representam 45% da população e mais de 50% da economia. Muitas das pessoas que vivem na área metropolitana de Lisboa ou de São Paulo circulam por vários municípios, mas, por um lado, o poder político está no governo central. É necessário articular, também, as governanças dos diferentes modais de transporte”, disse ele.

Crimes financeiros

O painel número 5 do Seminário trouxe o tema da “Governança do Sistema de Prevenção e Investigação de Crimes Financeiros”, moderado por Ricardo Villas Bôas Cueva, ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ele comentou que este é um tema de largo alcance e impacto imediato. “Não só no sistema financeiro, mas também no político e, também, na economia popular. Temos notado uma enorme inadequação desses sistemas de prevenção e compliance”, declarou.

O palestrante Rui Pereira, ex-ministro da Administração Interna e professor convidado do ISCSP e do ISCPS, fez uma apresentação das origens, influências, trajetória e configuração atual do direito penal econômico português. Para Gebran Neto, desembargador Federal e relator da Operação Lava Jato no âmbito do Tribunal Regional Federal da 4a Região, o tema é sensível e delicado, em particular num momento em que Brasil vive algum desencantamento. Para contrapor, ele apontou as grandes melhoras ocorridas no Brasil desde a Constituição de 1988. “Dentro das supressas felizes, temos a Operação Lava Jato, que começou de um fato muito pontual onde, como se diz, puxou-se uma pena e veio uma galinha”.

Paulo Saragoça da Matta, advogado penalista, ex-docente da FDUL, falou sobre o tema da corrupção e função política. “Há uma confusão enorme sobre o que são crimes financeiros e econômicos. Eles não são a mesma coisa. Para começar, são de ramos diferentes do Direito. Embora, em última análise, os crimes desta área sejam todos do âmbito do Direito Econômico”, apontou. Marcus Vinicius Furtado Coêlho, presidente da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais do Conselho Federal da OAB, começou sua apresentação afirmando que a história da humanidade tem sido acompanhada por crimes econômicos. “A criminalidade e o colarinho branco nos negócios manifesta-se da deturpação de relatórios financeiros, na corrupção na bolsa de valores, na corrupção direta ou indireta de servidores públicos, a fim de obter leis favoráveis, na venda de publicidade enganosa, na apropriação indébita e muitos outros diferentes aspectos”, afirmou.

Sistema de Saúde Pública

O Painel número 6 tratou da “Governança do Sistema de Saúde Pública”, com moderação de João Otávio de Noronha, ministro do STJ e Corregedor Nacional do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Para Pedro Pita de Barros, vice-reitor da Universidade Nova de Lisboa (UNL) e professor da Faculdade de Economia da UNL, o primeiro aspecto que importa, do ponto de vista da governança, é a complexidade que o sistema de saúde têm, o que afeta, do ponto de vista das relações econômicas, o modelo de governança. Ricardo Barros, ministro da Saúde do Brasil trouxe um panorama abrangente do Sistema Único de Saúde (SUS). Apresentou, também, as legislações voltadas ao atendimento em saúde pública que aguardam decisão do Supremo, como a questão da liberação de remédios e outros benefícios à população.

Fernando Leal da Costa, consultor para assuntos da Política da Saúde na Casa Civil do Presidente da Republica Portuguesa e ministro da Saúde de Portugal (outubro a novembro 2015), abordou as normas constitucionais que regem e regulamentam o acesso à saúde pública em Portugal. “É claro que não há saúde sem que ela se exerça em todas as políticas, mas obviamente há demasiada política na saúde”

Luis Felipe Salomão, ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), apresentou sua visão jurídica do tema, focado na figura dos profissionais que fazem a saúde pública, no Brasil e no mundo, e como o Direito enxerga esses profissionais. A partir daí, abordou dois casos que o STJ para exemplificar a judicialização que hoje assistimos na área de saúde.

O painel foi encerrado por João Dória Junior, prefeito de São Paulo, que trouxe a experiência do programa Corujão da Saúde. “Quando assumimos, em janeiro deste ano, havia 486 mil pessoas aguardando por exames na rede pública municipal de saúde, com fila de espera de até 18 meses. Uma situação absolutamente inaceitável. Estabelecemos. parcerias com a rede privada de saúde e, em três meses, zeramos a fila, com a realização de 342 mil exames”, revelou.

Regulação e desenvolvimento

O último dia de Seminário começou com o painel “Governança das Autoridades Reguladoras da Economia e Desenvolvimento”, com moderação de Paulo Gustavo Gonet Branco, subprocurador-geral da República e coordenador científico do IDP. Quem se apresentou primeiro foi Paulo de Tarso Sanseverino, ministro do STJ. Seu painel foi segmentado em três partes: análise da regulação do mercado no Brasil; o princípio da segurança jurídica; e jurisprudência da atividade regulatória nos tribunais brasileiros. “O ponto em comum entre a orientação da jurisprudência, tanto da seção de direito público como na seção de direito privado, é de prestigiar a atividade das agências reguladoras”, esclareceu.

Luis Morais, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL), concentrou a apresentação na atuação das autoridades reguladoras da econômica, começando por considerações sobre regulação e supervisão da economia, de acordo com os modelos constitucionais de Portugal, União Europeia e Brasil. Murilo Portugal, presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) tratou basicamente em três pontos: por que regular?; os problemas do excesso de regulação; e a questão da governança dos reguladores. “No caso do setor bancário, esta é uma experiência de sucesso. Temos uma boa regulação e uma boa supervisão bancária. A regulação prudencial sempre foi mais exigente que a requerida pelos padrões internacionais”, informou. Encerrando o painel, Manuel Cabugueira, consultor-principal do Centro Jurídico da Presidência do Conselho de Ministros (CEJUR) de Lisboa, fez uma reflexão sobre o conjunto das ideias apresentadas, principalmente do ponto de visa dos conceitos econômicos mais empregados na atualidade, como os de Adam Smith.

Presidencialismo de coalizão

A última atividade do programa do V Seminário Luso-Brasileiro foi a mesa-redonda “O Presidencialismo de Coalizão é Reformável?”, com moderação de Gilmar Ferreira Mendes e Carlos Blanco de Morais, e palestras de Antonio Anastasia, senador da República; Arlindo Chinaglia, deputado e presidente do Parlamento do Mercosul; Jorge Reis Novais, professor da FDUL; e Pedro Romano Martinez, diretor da FDUL. “Chegamos ao fim do evento com o sentimento de dever cumprido diante da qualidade das exposições que tivemos aqui, mas a pergunta que deixamos para este debate é se o chamado presidencialismo de coalizão é reformável ou que outra proposta teríamos? Eu até colocaria uma pergunta se este modelo seria suscetível de ser substituído por um modelo de semi-presidencialismo brasileiro ou uma versão brasileira de parlamentarismo”, afirmou Gilmar Mendes.

O discurso de encerramento foi realizado pelo presidente da República Portuguesa, Marcelo Rebelo de Souza. Ele parabenizou o ministro do STF pela iniciativa e por toda a sua trajetória no Brasil e realizações. “Este encontro traduz a comunhão entre Portugal e Brasil. As várias comissões organizativas, o envolvimento de especialistas dos dois países, os ricos painéis a que puderam assistir nos últimos dois dias confirmam”. Para o presidente o português, os desafios enfrentados por Brasil e Portugal também são parecidos, principalmente no campo social: “O combate a exclusão social deve ser prioridade para todos que trabalham pelo país. Em última análise e uma questão crucial de humanidade”, disse.

Arbitragem e transação em matéria tributária

Em paralelo ao V Seminário Luso-Brasileiro de Direito foi realizada, em 19 de abril, uma mesa-redonda sobre Arbitragem e Transação em Matéria Tributária. O evento, patrocinado pela Itaipu Binacional, ocorreu na Faculdade de Direito da Universidade, reunindo acadêmicos, juristas, advogados, árbitros, magistrados, dirigentes fazendários, agentes públicos e outros profissionais com conhecimento teórico ou experiência prática relacionada à arbitragem e transação tributárias.

O debate qualificado foi realizado sob quatro pontos de vista: dos profissionais acadêmicos; da advocacia; dos árbitros e magistrados; e do institucional. Nesse contexto, o debate promoveu intensa troca de conhecimentos entre portugueses e brasileiros sobre o tema, permitindo analisar a experiência portuguesa e a europeia quanto à utilização da arbitragem e da transação em matéria tributária.

Também oportunizou analisar os principais desafios de nosso país em relação ao tema, bem como colher subsídios para o aprofundamento das questões debatidas, por meio de um Grupo de Trabalho a ser constituído. O volume de créditos tributários inscritos na dívida ativa da União alcançou um patamar tão elevado que exige profunda reflexão, tensionando uma reforma estrutural no modelo de cobrança vigente. Essa situação ainda mais se agrava se adicionarmos o volume da dívida ativa dos estados e municípios brasileiros.

Os participantes da mesa redonda concordaram que o atual modelo encontra-se esgotado e que deve ser revisto e aperfeiçoado , incorporando formas consensuais de resolução de conflitos. Verificou-se, também, que o aspecto institucional é tão importante quanto a dimensão legal e normativa, devendo integrar o conjunto das soluções que venham a ser implantadas. Muitos países têm alcançado resultados excelentes de arrecadação, em decorrência da recuperação de créditos tributários, com a adoção de formas consensuais de resolução de conflitos, como a arbitragem e a mediação.

Houve um intenso debate no que se refere à viabilidade de se implementarem essas soluções alternativas, no sistema jurídico-tributário brasileiro. Nesse sentido, concluiu-se que, sendo a indisponibilidade do interesse público um conceito dogmático, a adoção de mecanismos autocompositivos, em matéria tributária, é juridicamente viável, devendo ser incentivada a regulamentação, em âmbito federal, do art. 156, III, do CTN. Esta é, inclusive, a tônica da nova processualidade brasileira, como deixa claro o art. 3o do Novo Código de Processo Civil.