Edição

Passagem garantida para uma nova realidade social

23 de novembro de 2012

Compartilhe:

Composta de 20 municípios, a Região Metropo­litana do Rio de Janeiro é a segunda maior em densidade demográfica no Brasil, concentrando perto de 75% da população de todo o Estado, ou cerca de 11 milhões de habitantes. Diariamente, quase um milhão de pessoas se deslocam para outros municípios, como mostra o estudo “Observatório das Metrópoles”, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Em muitos casos, os usuários são obrigados a utilizar duas ou mais linhas diferentes de ônibus – ou mesmo outros modais, como metrô, trem e barcas – para chegar ao local de trabalho ou à escola. De acordo com o Plano Diretor de Transporte Urbano da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (PDTU/RMRJ), elaborado pela Secretaria de Transportes do Governo do Rio de Janeiro, são realizadas cerca de 19,9 milhões de viagens diárias, sendo 12,5 milhões delas motorizadas – neste total, a participação do transporte coletivo é de 74%. Ainda de acordo com o órgão, apenas nos municípios da RMRJ são transportados em média mais de 821,8 mil passageiros por dia.

Desde 2010, este contingente de pessoas pode contar com uma solução para reduzir os gastos diários com o transporte: o Bilhete Único Intermunicipal, lançado pela Secretaria de Transportes do Governo do Estado do Rio de Janeiro. O sistema permite o embarque em até dois meios de transportes ao custo máximo de R$ 4,95, em um intervalo máximo de duas horas e meia, desde que um deles seja, obrigatoriamente, intermunicipal. O sucesso da iniciativa pode ser conferido agora, pouco mais de dois anos depois de implantada. Em outubro deste ano, o sistema havia atingido mais de 850 milhões de viagens, somando uma economia direta de R$ 929 milhões para os mais de 2,2 milhões de usuários dos transportes públicos do Grande Rio, ou seja, uma média diária de R$ 2,90 por pessoa.

Antes disso, conforme mostra o estudo “Impactos sociais do Bilhete Único Intermunicipal no Grande Rio”, elaborado pelo Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas, a cidade do Rio de Janeiro tinha as passagens intermunicipais mais caras do País. Era a primeira colocada em um ranking comparativo entre sete capitais cobertas pelo Índice de Preços ao Consumidor (IPC), do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas, atingindo o valor de R$ 17,04 (julho de 2009), enquanto que em Belo Horizonte, segunda colocada, o valor era de R$ 15,89.

De acordo com dados da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor), as 74 tarifas intermunicipais da Região Metropolitana foram reduzidas para 12, numa complexa equação que agrega subsídios do Estado. Em 57% das 516 linhas do Grande Rio os preços diminuíram; em 34% ficaram iguais; e em 9% foram reajustados. A tarifa mais alta, de R$ 17,30, passou a R$ 7,10 e a mais barata ficou em R$ 2,35.

Mudança social

Os benefícios trazidos pelo Bilhete Único Inter­municipal não se extinguem na economia que os passageiros percebem no bolso. O subsídio estadual vem permitindo ampliar as oportunidades de trabalho para quem mora longe do Centro do Rio. É o que também revela o citado estudo da FGV, ao revelar que, desde o seu lançamento, o primeiro cartão de uso metropolitano do País alavancou os índices de empregabilidade.

A pesquisa da FGV mostra o alto custo do transporte público, que alimentava a informalidade trabalhista e diminuía a empregabilidade da população. A equação é simples: para os empregadores, tornava-se muito caro contratar o trabalhador que mora longe; para este último seria inviável pagar a passagem com o seu salário. Com isso, a solução era apelar para a informalidade, redutora do custo de contratação. Em outros casos, o salário oferecido simplesmente não compensa, e a oferta de emprego para os moradores da periferia fica limitada às localidades próximas ao seu domicílio, ou força as pessoas a migrarem para favelas próximas aos locais onde há trabalho.

A redução de custos com transporte proporcionado pelo Bilhete Único trouxe como primeiro impacto a prática de os empregadores passarem a incluir na seleção os candidatos que moram em locais distantes. Isso, consequentemente, gerou um equilíbrio na distribuição de vagas entre moradores de diferentes regiões. A pesquisa da FGV aponta o crescimento de 1,3% em oportunidades de emprego em 2010. No mesmo período, o Ministério do Trabalho registrou que o Estado do Rio criou 149 mil novos postos de trabalho formais nos primeiros nove meses do ano de 2010. Na análise de efeito-emprego no Bilhete Único, a pesquisa da FGV mostra, com base no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), um dos melhores índices já alcançados: o aumento da proporção de empregos formais gerados na Região Metropolitana em 2010, em relação ao total do Estado, foi de 72,15%, enquanto que no ano anterior foi de 71,06%.

Seguindo essa lógica dos custos, os trabalhadores obtiveram grande vitória com a implantação do Bilhete Único, pois agora disputam cargos de maneira mais competitiva com os moradores de localidades próximas às empresas. Um funcionário que mora em Alcântara e trabalhe no Centro, por exemplo, passou a custar à empresa R$ 8,80 (antes eram R$ 16 por dia), enquanto que um morador de Copacabana que trabalha no Centro e utiliza o metrô diariamente custa R$ 5,60.

Além de buscar oferecer mais eficiência quanto ao desempenho dos transportes públicos, o Bilhete trouxe para o Grande Rio um instrumento capaz de baratear o transporte de cada dia e torná-lo mais racional, valorizando o transporte coletivo e garantindo mais segurança aos usuários, até porque a iniciativa também visa conter o avanço dos transportes alternativos.  A pesquisa da FGV mostra, ainda, outra realidade que existia antes do Bilhete Único. Devido ao custo da passagem e outras dificuldades na utilização dos meios oficiais, muitos usuários de transporte público acabavam optando pelo uso de modais de transporte não oficiais, como vans e “lotadas”, colocando em risco sua própria segurança: em 2008, sessenta e oito por cento dos envolvidos em acidentes de trânsito eram condutores ou passageiros de carros ou vans.

Cartão inteligente

O Bilhete Único pode ser utilizado em ônibus, barcas, trens, metrô e vans regularizadas, desde que haja integração intermunicipal entre eles. O passageiro paga o valor de R$ 4,95 por uma viagem intermunicipal, com direito a dois deslocamentos, em intervalo de até duas horas e meia entre o primeiro e o segundo embarque. Nas viagens que não contemplam integração intermunicipal, o cartão pode ser utilizado sem restrições de uso e tempo, podendo ainda pagar várias passagens no mesmo veículo, descontando-se a tarifa normal do modal. Pode ser usado em todas as empresas de ônibus do Estado do Rio de Janeiro, independentemente do valor da tarifa.

Não apenas o Bilhete Único Municipal, mas todo o sistema, que abrange diferentes tipos de cartões (veja quadro), é gerenciado pela RioCard, empresa criada com esta finalidade pela Fetranspor, que congrega dez sindicatos, entre eles o Rio Ônibus, Sindicato das Empresas de Ônibus da Cidade do Rio de Janeiro.

Assim como em Paris, Londres e Nova York, metrópoles mundiais que também contam com seus sistemas próprios de bilhetagem, a RioCard implantou a tecnologia dos smart card sem contato, os cartões inteligentes que funcionam por rádio frequência, permitindo estabelecer uma comunicação com o validador (equipamento que faz a leitura) para débito da tarifa e liberação da roleta ou efetivação da recarga. Além de eliminar o problema do troco e reduzir o tempo de embarque, o sistema apresenta outras vantagens e pode ser usado em qualquer meio de transporte – ônibus, metrô, trem e barca – independentemente do valor da tarifa.

O Relatório de Atividades 2010 da Fetranspor demonstra a consolidação da RioCard que, somadas todas as modalidades em que opera, registrou crescimento de 14,5% no volume de transações eletrônicas em relação ao ano anterior. Ou seja, saltou de R$ 925,8 milhões, em 2009, para R$ 1,1 bilhão. Nesse resultado, foi decisivo o desempenho do Bilhete Único e Bilhete Expresso, que tiveram suas transações eletrônicas elevadas em 225% na comparação 2009-2010. O número de usuários desses cartões saltou de 25 mil para 186 mil, correspondente à elevação de 635% – percentual obtido devido ao início do funcionamento, em fevereiro de 2010, do Bilhete Único Intermunicipal, abrangendo toda a Região Metropolitana, e, em novembro, do Bilhete Único Carioca.

Particularmente no caso do Vale-Transporte, vale o registro do aumento da adesão ao sistema pelas pequenas empresas. No total, foi elevado de 27% para 30% o número de empregadores que fornecem cartões a seus trabalhadores. Toda esta evolução demonstra que a bilhetagem eletrônica é um dos pilares de sustentação das políticas governamentais de melhoria da mobilidade urbana no Rio de Janeiro.

Investimentos e prêmio

O Bilhete Único no Grande Rio, instituído por Lei Estadual no 5.628/09, em dezembro de 2009, foi implantado com apoio tecnológico da RioCard e da Fetranspor, como parte da parceria com o governo estadual na busca permanente de melhoria das condições de mobilidade. A participação de técnicos da empresa e da federação contribuiu para a modelagem do cenário operacional da integração tarifária, que exigiu a identificação das linhas de ônibus, a adequação das tarifas e a montagem do suporte tecnológico para a operação segura e transparente do Bilhete Único em todos os meios de transporte.

Porém, desde 2006, a RioCard vem investindo em modernização. Parceira tecnológica e gerencial do governo do Estado na implantação e gestão da integração tarifária proporcionada pelo Bilhete Único, assim como da Prefeitura do Rio, a empresa adaptou e ampliou sua estrutura para incorporar a inovação.

Na aquisição de equipamentos e programas especia­lizados, a operacionalização do Bilhete Único demandou investimentos de R$ 12 milhões da RioCard, que se somaram aos R$ 22 milhões aplicados desde 2008 na bilhetagem eletrônica. O centro da base tecnológica do sistema são dois computadores IBM de grande porte (mainframes). Juntos, os equipamentos processam até 60 milhões de instruções por segundo – e elevaram a capacidade de processamento da RioCard para 3,8 bilhões de informações por segundo. Atualizado permanentemente, o banco de dados é acessado online, a qualquer momento, pelo Centro de Tecnologia da Informação e Comunicação do Estado do Rio de Janeiro (Proderj), que também recebe relatórios diários, repassados à Secretaria Estadual de Transportes.

Como parte da estratégia de expansão da bilhetagem eletrônica no transporte público, o RioCard passou a ser utilizado também, desde o início de 2010, nas vans legalizadas pelo Departamento de Transportes Rodoviários (Detro) para percursos intermunicipais. Além de equipar os veículos com aparelhos validadores dos cartões, a RioCard ministrou treinamento para os motoristas, familiarizando-os com os procedimentos relacionados à descarga dos dados, arrecadação e ressarcimentos.

Nos primeiros meses da chegada dos cartões ao serviço de vans legalizadas, mais de 690 veículos passaram a dispor de validadores. Com o uso do RioCard, a gratuidade para idosos e portadores de necessidades especiais também passou a ser oferecida nesse meio de transporte, restrita a um assento por van, mediante a apresentação do cartão correspondente. A Fetranspor informa que a estratégia de adoção do Bilhete Único Intermunicipal incluiu campanhas de esclarecimento à população, por meio de cartilhas veiculadas nos jornais, e a abertura de 19 postos de cadastramento em locais de grande movimento.

Em 2011, a Fetranspor e a RioCard, receberam o prêmio da campanha “PTx2Awards” (Prêmio Transporte Público vezes 2), lançada pela União Internacional de Transportes Públicos (UITP), para estimular e reconhecer as melhores práticas de incentivo que estejam contribuindo para dobrar a utilização do transporte público até o ano de 2025. O Bilhete Único Intermunicipal foi eleito como o Melhor Programa de Transporte da América Latina, na categoria “Introdução a Novas Políticas de Transportes”. Já a experiência “Vale-Transporte – O desafio da universalização do benefício que garante a mobilidade dos trabalhadores” ganhou a premiação regional da América Latina, na categoria “Service Improvement Award”.

Os diferentes tipos de subsídios

Bilhete Único Intermunicipal

Utilizado no deslocamento entre dois ou mais municípios da Região Metropolitana do Estado do Rio de Janeiro, em ônibus convencionais, vans legalizadas, metrô, trem e barcas. É aceito em toda Região Metropolitana do Rio de Janeiro, que inclui, além da capital, os municípios de Belford Roxo, Duque de Caxias, Guapimirim, Itaboraí, Itaguaí, Japeri, Magé, Mangaratiba, Maricá, Mesquita, Nilópolis, Niterói, Nova Iguaçu, Paracambi, Queimados, São Gonçalo, São João de Meriti, Seropédica e Tanguá.

Vale-Transporte

Criado em 1985, é um direito dos trabalhadores formados, que estipula, na forma da lei, que os trabalhadores só podem comprometer até 6% de seu salário líquido com despesas de transporte. O percentual excedente deve ser repassado ao empregador. No Rio do Janeiro, a RioCard implantou dois modelos

Vale-Transporte Convencional: tem as mesmas normas de comercialização existentes para o vale em papel. Permanente e recarregável, pode ser emitido ao portador, empresa, empresa/usuário ou apenas usuário.

Vale-Transporte Rápido: produzido com um crédito de valor fixo e tem como característica principal a disponibilidade para uso imediato. O cartão pode ser utilizado em qualquer meio de transporte, independente do valor da tarifa. Funciona como um moedeiro eletrônico, com carga de créditos nos valores de R$ 40,00 ou R$ 80,00.

Bilhete Único Carioca

Criado pela Lei no 5.211/2010, é o benefício tarifário da integração nas linhas de ônibus municipais da cidade do Rio de Janeiro. Permite embarcar em até dois ônibus municipais, dentro do intervalo de duas horas, pagando o valor de R$ 2,75, ou um ônibus e um trem, em estações dentro do município do Rio, pagando o valor de R$3,95.

Bilhete Único Niterói

Criado pela Lei no 2.851/2011, é o benefício tarifário da integração nas linhas de ônibus municipais da cidade de Niterói. Permite embarcar em até dois ônibus municipais, dentro do intervalo de uma hora, pagando o valor de R$ 2,75. O embarque para a volta deverá ser feito em, no mínimo, três horas após a última utilização do cartão, caso contrário será debitado o valor integral da tarifa.

RioCard Expresso

Sem restrições de uso e tempo, o cartão pode ser utilizado para pagar várias passagens no mesmo veículo (exceto se estiver sob as regras do Bilhete Único). Pode ser usado em todos os transportes públicos (exceto o metrô) do Estado do Rio de Janeiro, independentemente do valor da tarifa.

RioCard Jovem

É um cartão pré-pago de passagens, concebido para atingir o público jovem. Possui formato diferenciado (similar a um chaveiro) e é aceito em ônibus, barcas, trens, vans legalizadas e metrô (somente quando cadastrado como Bilhete Único).