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Os profissionais jurídicos no litígio de família

5 de novembro de 2004

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Sempre aprendendo e sentindo, faço esta reflexão, e, de modo geral parabenizo a todos os profissionais que tenham a missão de solucionar os litígios de família.

Quando são formados os núcleos familiares, os fundadores agem com votos de perenidade.

É o amor, in perpetuam, jurado no altar; no murmúrio dos afagos, na criação de um novo ser. É a promessa assumida sem a pecha do pecado, na certeza de que “para que o amor produza todo bem de que é capaz, deve ser, generoso, irrestrito e integral”.

Em “O casamento e a moral”, Betrand Russel, já sublimava: – “A essência do bom casamento é o respeito recíproco pela personalidade combinado com aquela profunda intimidade, física, mental, e espiritual, que faz do amor sério entre o homem e a mulher a mais frutífera de todas as aventuras humanas. Esse amor, como tudo que é grande e precioso, exige sua própria moral, e freqüentemente acarreta um sacrifício do menor ao maior; porém esse sacrifício deve ser voluntário porque, quando não é, destrói a própria base do amor pelo que é feito”.

A ficção jurídica, celestial, tem perante a eternidade os seus minutos de espaço. Há eternidade que dura toda vida. Outras, nem tanto.

Os percalços da existência atingem por infinitas razões, pessoas até preparadas para vida, e, a outras nem tanto.

O escoadouro, o ma das desavenças familiares são Varas Especializadas, que se superlotam. Nelas são procurados pais, mães, alimentos, separações, interdições, divórcios e uma infindável gama de interesses.

O material com que se lida nas Varas de Família é o desajuste das afinidades; desencontros de vontades fomentando o mútuo desrespeito. São episódios que poderiam ser abortados até por pais, amigos, pelos conselhos mais amadurecidos dos mais vividos.

O ajuste ou reajuste nem sempre acontecem, e quando implodem, chegam aos escritórios advocatícios, onde e quando duas vertentes despontam. Uma procura na parte adversa a reconciliação, ou, no mínimo a conciliação para que não sejam acirradas as disputas. A outra, faz do ex adverso, um inimigo, cuja vitória sobre ele, trará vantagens e renome, alcançando, por vezes, a mídia.

Dentre tantos, tais são os motivos pelos quais, como Juiz de Vara de Família, sempre pugnei para que os operadores do direito nesta área (Advogados, Juizes, Promotores, Defensores, Assistentes Sociais, Psicólogos, Oficiais de Justiça, Serventuário), para nelas atuarem, deveriam fazer especialização, se na certeza desta vocação. Lidam com os mais profundos sentimentos humanos, e, as partes, serão sempre marido, mulher e filhos que, por vezes passam por meros e passageiros desgastes por uma infinita gama de causas, que um bom profissional pode superá-lo, ao invés de alastrar conflitos, criá-los onde não existam.

Em matéria de família, a sensibilidade jurídica (art. 5º LICC) pode ser mais preciosa do que a letra fria e o rigorismo do texto legal.

A literatura concernente informa, que os filhos municiam as armas dos pais, sendo explosivos usados com freqüência para vender a resistência do “adversário” já me deparei com uma dezena de processos ajuizados para uma só separação; vi maridos despejados do lar, despojados até de seus pertences pessoais, de bens e salários, reduzidos, portanto, à miséria jurídica, serem impiedosamente, acionados por alimentos; lamentei o rancor no coração de certas mães, assacando contra pais o abuso sexual à filhas, quando por eles lavadas nas visitações; encontrei pais poderosos sonegando alimentos preferindo a possibilidade de prisão; a pecha de adultério e conduta desonrosa, são vigorosamente disputadas, para imputação a um e outro cônjuge, desnecessariamente, gravando a ferro e fogo, marcos indeléveis para leitura dos filhos no futuro. Idosos na barra dos Tribunais se separando final já está próxima. Detectei erro de cônjuges complacentes um com o outro, terem acesa a fogueira da desavença atiçada por estranhos; conjugues doentes abandonados, no permissivo legal ou não, restando-lhes as casas de caridade e asilos como novo lar; interdições e pais, parentes, por motivos nem sempre justificáveis.

Vi abandono material, isto e muito mais, que um profissional especializado não pudesse minorar as causas e seus efeitos.

Tudo pode ficar mais complicado, quando a parte procura pelo advogado, que, se especializado, através da lógica e da razoabilidade, sentirá a possibilidade de êxito ou não da demanda, e o compromisso de levar ao judiciário somente a verdade.

Saibam todos que o êxito em Varas de Família, o fundamento do melhor sucesso, é diretamente proporcional à transigência, prudência, paciência e equilíbrio.

Lapidar a lembrança do eminente Desembargador Ellis Hermydio Figueira:

“O ADVOGADO É O PRIMEIRO JUIZ DA CAUSA”.

O profissional especializado ouvirá a parte, constará a veracidade dos fatos, e não conseguindo aparar arestas, reconciliar, ou conciliar as exigências, desapaixonadamente, sem agressividade, sem macular o caráter e a honra, moderadamente, impulsionará o Judiciário e, sem trair os seus objetivos, restringirá o odioso e ampliará o favorável, preferindo, sempre, as soluções mais benignas.

Até porque, “EXALTAR, ENALTECER COM ENTUSIASMO, OU MALDIZER, DETRATAR COM VEEMÊNCIA NÃO É ARGUMENTAR; SERÁ UMA ILUSÃO DE APAIXONADO, OU INDÍCIO DE INÓPIA DE VERDADEIRAS RAZÕES”.

Cumpre evitar, nas Varas de Família qualquer inclinação simpática ou antipática, a solidariedade ou a ojeriza por qualquer das partes, eis que a paixão se sobrepõe, sem se perceber, à boa fé.

Como Defensor Público cargo que exerci por dez anos, ou Juiz de Direito, já tive reflexos negativos e muito desgaste emocional, para me pautar no limite do razoável.

Não há paradoxo algum, a advogado ainda que veemente, deve evitar extrapolar-se do limite que lhe impõe a ética na sua profissão quase sacerdotal, sob pena de provocar a odiosa LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ, por todos os ângulos censurável, levando ele patrocinador e a parte patrocinador e a parte patrocinada a responderem civil e criminalmente.

Somente o inábil, ínfima minoria, e o não especializado, impregnados pela possível paixão das partes, se permitem a atos atentatórios à dignidade da Justiça, jogando para a galeria ou resistindo injustificadamente aos trâmites da lide, retardando indevidamente o cumprimento da obrigação, viciando atos processuais, deduzindo pretensão sabidamente desonesta e improcedente, que desvirtua a seriedade processual, altera a verdade dos fatos, provoca incidentes desnecessários, ilauqueando a boa-fé da Justiça.

Em audiência, já vi mais razão naquele que ficou silente, do que naquele que pretendeu falar continuadamente.

Em todas as Varas, mas, principalmente nas de família, o profissional especializado faz uso da dialética jurídica, da linguagem formal, educada, sóbria e técnica, emprestando luzes de sua experiência para trabalhar serenamente, fazendo séria e madura reflexão sobre o conflito de interesses familiaridades, que não foram abortados e se concretizaram como inevitáveis. Substitui a bravata pelo alto nível e responsabilidade das discussões jurídicas.

É importante que use a linguagem da diplomacia, não arrede da realidade, não se deixe enganar nem pelo próprio cliente e jamais , substitui a  razão pela emoção, pois, sabe que em litígio de Família, NÃO EXISTEM VENCEDORES. TODOS SÃO VENCIDOS.