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OAB se mobiliza em defesa de honorários

4 de janeiro de 2021

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OAB Nacional e seccionais começarão 2021 com campanha pelo cumprimento dos parâmetros fixados no CPC

O Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) iniciou uma mobilização nacional pela valorização dos honorários advocatícios e pelo cumprimento do Código de Processo Civil (CPC), com a participação das 27 seccionais nos estados. As regras para a aplicação dos honorários, incluídas na lei que ficou conhecida por Código Fux, voltaram ao debate em julgamento de recurso especial (1644077/PR) na Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O julgamento, suspenso por pedido de vista, envolve a controvérsia jurídica em torno da aplicação do art. 85, parágrafos 3º, 5º e 8º, do CPC, e discute o princípio da isonomia e igualdade. A decisão servirá de parâmetro para o pagamento de honorários e poderá resultar, na prática, na diminuição do valor. Contrariando o que defende a OAB, dois ministros, Herman Benjamin e Nancy Andrighi, votaram pela possibilidade de arbitramento de valor, sem a aplicação do percentual definido em dispositivos do CPC.

“Enfrentaremos toda e qualquer tentativa de aviltamento dos honorários da advocacia, como tem sido tentado. A advocacia não permitirá que seja reescrito o Código Fux, que estabeleceu, de forma equilibrada, os parâmetros para nossos honorários”, afirmou o Presidente da OAB Nacional, Felipe Santa Cruz.

A defesa da valorização da advocacia é pilar da atuação da OAB. “Se chegamos em 2020 com uma vitória excepcional – a criminalização da violação das prerrogativas – entraremos em 2021 com a disposição renovada para efetivação dessa grande conquista e para impedir qualquer tentativa de desvalorizar a advocacia e aviltar honorários”, afirmou o Presidente.

Em reunião no início do mês presidida por Santa Cruz, o Colégio de Presidentes, que reúne os presidentes das 27 seccionais da OAB, aprovou a proposta de campanha nacional pela valorização dos honorários e cumprimento do CPC. A proposta foi apresentada pelo presidente da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais, Marcus Vinícius Furtado Coêlho.

“É muito importante registrar que o que nós queremos é o cumprimento da lei. E, portanto, o que queremos é que o Judiciário aplique o Código de Processo Civil. É uma campanha centrada no cumprimento da lei processual, no cumprimento do CPC e na valorização dos honorários de advogados”, explicou Marcus Vinícius.

“Essa tem que ser a nossa maior luta para 2021. E essa luta, efetivamente, para os próximos meses, tem que ser a mobilização de todos nós”, reafirmou Felipe Santa Cruz. “Não adianta fazermos essa luta de forma isolada, precisamos das seccionais, precisamos dos presidentes, precisamos daqueles que têm capacidade de convencimento, para que se crie um clima de garantia da lei”, destacou.

Entre as medidas decididas pelo colegiado está o envio de memorial com assinaturas de todos os presidentes de seccionais aos tribunais superiores requerendo a completa adequação dos valores de honorários advocatícios ao disposto no Código de Processo Civil. As seccionais também desenvolverão uma campanha em cada estado pela defesa dos honorários.

Na carta de Brasília, documento final do encontro, o colegiado apontou suas conclusões: “Reafirmar a vigência plena do art. 85 do CPC, pugnando pelo respeito aos honorários advocatícios dignos, devendo ser intensificadas as iniciativas no âmbito judicial e legislativo, de forma sistemática e organizada, para a valorização da justa remuneração da advocacia brasileira, bem como devendo ser lançada uma campanha específica para tanto”.

O documento também afirma: “Combater toda e qualquer tentativa de construção jurisprudencial que venha no sentido de modificar o texto claro da lei sobre os honorários de sucumbência, que devem ser fixados entre 10 e 20% do valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa”.

Na reunião do colegiado, a OAB também reforçou seu apoio institucional ao Projeto de Lei nº 2365/2019 da Câmara dos Deputados, que veda expressamente – no texto do CPC – a redução equitativa de honorários sucumbenciais quando a causa possuir valor líquido ou liquidáveis e, quando for o caso de fixação equitativa, que se utilize os parâmetros da tabela de honorários da Ordem.

Interlocutor da OAB nas discussões da reforma do Código de Processo Civil, sancionado em 2015, Marcus Vinícius Coêlho, membro honorário vitalício da OAB, lembra que a definição das regras no CPC aprovada pelo Congresso foi resultado de um entendimento que envolveu a participação do governo, por intermédio da Advocacia Geral da União, na época, sob o comando de Luís Inácio Adams. O acordo foi favorável aos cofres públicos, porque limitou os honorários ao percentual de 1% a 3% para as grandes causas, quando, anteriormente, o código permitia de 10% a 20%.

“Em relação aos casos da Fazenda Pública havia expressa disposição dando conta de que nas causas em que ela fosse vencida, a fixação dos honorários se daria por aquilo que se chamava equidade, o que resultava em um aviltamento dos honorários. Foi preciso uma enorme campanha para valorização da advocacia, para uma disposição diferente no novo CPC. Depois de muita luta, veio o parágrafo terceiro do art. 85, trazendo o escalonamento dos honorários em percentuais distintos, de acordo com o valor da demanda em discussão. Quando se fala em equidade, a própria lei já o fez”, afirmou.

O parágrafo terceiro fixa o pagamento de honorários nas causas em que a Fazenda Pública for parte, em percentuais que variam de acordo com o valor da condenação. Quanto maior o valor, menor o percentual dos honorários. Nas maiores causas, o percentual vai de 1% a 3%, e nas de pequeno valor, esse percentual pode chegar ao máximo de 20%.

“Somente pode haver o não respeito aos índices e percentuais do CPC nas causas em que os valores forem muito baixos, para evitar o aviltamento dos honorários. O CPC foi feito, nesse item, para valorizar os honorários dos advogados privados e dos advogados públicos e não para fazer uma interpretação que crie um fosso entre os dois, com os advogados públicos recebendo de 10% a 20% pelo ajuizamento da demanda e o advogado privado não tendo direito a receber nem a tabela que consta no parágrafo terceiro”, lembrou.

Como a controvérsia envolve a questão da igualdade, a OAB Nacional já ingressou no Supremo Tribunal Federal (STF) com ação em que pede que seja declarada a constitucionalidade da norma do CPC que estabelece as normas de fixação e a metodologia de aplicação dos honorários de sucumbência nas causas judiciais que envolvem a Fazenda Pública (ADC nº 71). A ação, distribuída no ano passado ao Ministro Celso de Melo, está agora sob a relatoria do Ministro Nunes Marques. Antes de deixar o Supremo, o Ministro Celso de Melo deu prioridade legal de apreciação à ação da OAB, reconhecendo a sua relevância.

Sucumbência e litigância – A instituição de honorários tem reflexo na prestação de serviço jurisdicional, explica o professor e doutor em Direito Luciano Benetti Timm. Em parecer sobre os potenciais impactos econômicos ao sistema do Poder Judiciário, o professor constata que os honorários de sucumbência constituem uma das grandes barreiras à litigância predatória no sistema processual brasileiro.

Segundo Timm, os honorários sucumbenciais operam como um amplificador do risco associado à litigância, desincentivando fortemente o ingresso de demandas. Dessa forma, diz o parecer, “se o sistema brasileiro não possuísse o instituto dos honorários sucumbenciais, ou o tivesse de forma mitigada, fora da baliza estabelecida no novo CPC, veríamos, seguramente, uma tendência de aumento de litígios de natureza frívola ou predatória. Nesse caso, perderíamos forte mecanismo contra a excessiva judicialização de demandas que já assola o sistema jurisdicional brasileiro, que voltaria a se acentuar”.

Timm explica que, se a chance de derrota na disputa do caso for elevada e o autor tiver que arcar com as despesas envolvidas pela sistemática estabelecida pelo CPC, ele provavelmente irá optar por não ingressar com a ação. Inversamente, se a perspectiva de derrota for mínima, ou se os custos associados ao risco que se pretende correr forem baixos, provavelmente esse indivíduo optará por ingressar com a ação e iniciar um novo litígio.

“Veja-se, portanto, que a ponderação realizada pelos agentes é bastante direta: se os custos esperados forem menores do que o benefício provável, na maior parte das vezes, a decisão racional será litigar”, afirma. No parecer, Timm conclui que a atual regra de aplicação dos honorários sucumbenciais, contida no art. 85, § 2º, do novo CPC, é instrumento sistêmico fundamental para racionalização da prestação jurisdicional, em um País notoriamente assolado pelo problema da litigância excessiva, ao exigir responsabilidade e ponderação dos que buscam a prestação jurisdicional.