Edição 297
O novo agravo interno do processo do trabalho
2 de maio de 2025
Luciana Pereira de Souza Conselheira e Diretora da AASP

O ano de 2025 iniciou-se com profundas mudanças no processo do trabalho, haja vista o empenho do Tribunal Superior do Trabalho (TST) em aprovar teses com efeitos vinculantes, afetando diversos temas com vistas à uniformização da jurisprudência. A finalidade declarada dessa iniciativa é otimizar a atividade jurisdicional exercida naquela instância extraordinária e atender a meta do Judiciário, fixada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na Resolução no 235/2020, de promover a Consolidação do Sistema de Precedentes Obrigatórios.
Neste contexto, foi publicada, em 27/11/2024, pelo TST, a Resolução no 223, que editou a Instrução Normativa (IN) no 41-A, dispondo sobre os recursos em Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) ou Incidente de Assunção de Competência (IAC) julgados nos Tribunais Regionais do Trabalho, estabelecendo a previsão procedimental a ser observada. Também publicou, na mesma data, a Resolução no 224, alterando a IN no 40/2016 para instituir nova sistemática de impugnação de decisões denegatórias de recursos de revista, prevendo a interposição de agravo interno perante o próprio Tribunal Regional quando os acórdãos estiverem em conformidade com precedentes vinculantes, aprovados pelo Tribunal Pleno em IRDR, Incidentes de Julgamento de Recursos Repetitivos (IRR) e IAC.
Por meio desses atos normativos, além de adaptar o trâmite dos recursos trabalhistas às disposições do CPC, o TST pretende reduzir a quantidade de recursos que atingem aquela Corte, privilegiando o sistema de precedentes vinculantes.
Portanto, desde o dia 24/2/2025 (quando entrou em vigor a Resolução no 224), vem sendo mantida a possibilidade de interposição de agravo de instrumento para destrancar recurso de revista denegado e, simultaneamente, a depender dos temas enfrentados no acórdão regional impugnado, deverá a parte recorrente interpor agravo interno para atacar a decisão denegatória quanto aos tópicos sobre os quais o Tribunal Regional reputou estar a decisão recorrida em conformidade com os precedentes fixados em IRDRs, IRRs e IACs.
Com efeito, caberá à cada Tribunal Regional estabelecer, em Regimento Interno, qual será o órgão fracionário competente para conhecer o agravo interno, considerando suas peculiaridades e organização judiciária.
Consigne-se ser salutar que nossa mais alta Corte em matéria trabalhista passe a privilegiar o sistema de precedentes, evitando que a atividade jurisdicional se destine à reanálise de milhares de processos volvendo temas já pacificados, concentrando-se no conhecimento de temas novos e/ou transcendentes que ainda demandam análise e solução.
Nesta seara, contudo, espera-se a racionalidade na escolha dos temas a serem afetados, justamente para que os precedentes envolvam números significativos de casos e, sobretudo, que efetivamente elucidem as questões jurídicas neles enfrentadas. Vale dizer, ao fixar pauta de conduta impositiva aos jurisdicionados e de cumprimento obrigatório órgãos judicantes inferiores, o sistema de precedentes obrigatórios deve atentar para as disposições do artigo 926, do CPC, estabelecendo a jurisprudência estável, íntegra e coerente.
Além disso, considerando-se a aplicação imediata dos precedentes, tão logo aprovados pelo Pleno do TST, seria recomendável a modulação dos efeitos das teses aprovadas, evitando-se a tão indesejada insegurança jurídica advinda da mudança brusca de entendimentos jurisprudenciais.
Ademais, se a observância das teses aprovadas em sistema de precedentes obrigatórios impede, inclusive, a possibilidade de acesso à Corte Superior, encerrando-se a discussão sobre o acerto e adequação do acórdão regional no julgamento do agravo interno interposto perante o próprio Tribunal, a subsunção do comando advindo dos precedentes aos fatos subjacentes exigirá redobrada atenção às peculiaridades do caso concreto.
Portanto, advém da nova sistemática de agravo interno, inicialmente, a necessidade de acompanhamento dos temas afetados e conhecimento das teses firmadas por todos os operadores do direito, devendo as matérias em questão serem suscitadas em atenção à jurisprudência em formação, com menção nas peças processuais para análise futura, até que advenha a uniformização da jurisprudência e a aprovação de tese de cumprimento obrigatório. Também deverão ter ciência da imperatividade advinda das teses, indicadoras da pauta de condutas passíveis de serem aplicadas quando do julgamento dos conflitos apresentados pelos jurisdicionados.
E, justamente porque a interpretação e a aplicação dos precedentes pode impedir o acesso à Corte Superior trabalhista, o agravo interno, interposto com o objetivo de destrancar recurso de revista denegado pelo Regional, também pode se fazer necessário para realizar o cotejo do fático-probatório delineado com a ratio decidendi do precedente, mediante aplicação da técnica de distinguishing.
Logo, extrai-se da hipótese de cabimento do agravo interno que a matéria desse recurso será, justamente, o acerto ou não, da aplicação das teses firmadas em IRDRs, IRRs e IACs. Outrossim, os recursos de revista terão como óbice não apenas a existência de matéria sumulada ou pelo TST, STF ou por iterativa e notória jurisprudência do TST (artigo 896, § 7o, da CLT), mas também as teses vinculantes que vieram a ser aprovadas no sistema de precedentes.
O manejo do recurso adequado – agravo de instrumento ou agravo interno, exigirá dos advogados atenção redobrada das matérias analisadas pelo Tribunal Regional, sob pena de preclusão de impugnações dirigidas ao TST que poderiam, mas não foram veiculadas na forma e no tempo adequados.
Remanescerá, ao agravo de instrumento interposto para destrancar o recurso de revista, as hipóteses de nulidades processuais, como a negativa de prestação jurisdicional, a violação direta de lei federal ou dispositivo constitucional, ou por suposto erro de interpretação de leis, normas coletivas de trabalho ou contrariedade à jurisprudência uniforme.
Por fim, o dispositivo da Resolução no 224 que fixa a irrecorribilidade do acórdão do agravo interno (§ 3o, do artigo 1o) inova consequência sem similar no processo civil (artigo 1.021, do CPC), podendo ser questionada a usurpação de competência legislativa para tal previsão normativa. Veja-se que, embora haja previsão de aplicação de multa entre um e cinco por cento do valor atualizado da causa na hipótese de agravo manifestamente inadmissível ou improcedente, condiciona a interposição de novos recursos ao depósito prévio da multa em questão, pressupondo a possibilidade de impugnação da decisão proferida em sede de agravo interno.
Ademais, a aplicação inadequada ou descabida de determinado precedente pelos Tribunais Regionais ou mesmo sanção injusta podem exigir a insurgência da parte recorrente, em atenção aos princípios do contraditório e da ampla defesa, valendo-se de outros remédios processuais, como a apresentação de reclamações ao TST em casos de má aplicação ou não aplicação dos precedentes, antes do trânsito em julgado (artigos. 988, do CPC, 111-A, da CF e 210, do Regimento Interno do TST).
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