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Nova Lei de Recuperação terá prioridade no Senado

5 de outubro de 2020

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Confirmou o Presidente do Senado, David Alcolumbre, durante webinar do Instituto Justiça & Cidadania e da Editora O Globo

“É prioridade da nossa agenda no Senado Federal votar essa matéria. Estamos construindo o entendimento com os líderes partidários para que possamos levá-la diretamente ao Plenário, designando o relator, construindo o debate e, dentro do possível, votar essa matéria com o consenso geral do Senado, pelo significado e pela importância”, disse o Presidente do Senado, David Alcolumbre, sobre o projeto de reforma da Lei de Recuperação Judicial e Falência (Lei nº 11.101/2005).

Aprovado recentemente na Câmara dos Deputados como PL nº 6.229/2005, o projeto de lei foi renumerado ao chegar ao Senado Federal, onde passou a ser chamado PL nº 4458/2020.

“Falamos com o Ministro (do Superior Tribunal de Justiça, Luis Felipe Salomão) da importância dessa legislação e da possibilidade de termos amparo jurídico para enfrentar a pandemia, garantir a solvência das empresa e, naturalmente, os empregos dos brasileiros”, acrescentou Alcolumbre, em vídeo destinado aos participantes do webinar “Impacto Legislativo na Recuperação e na Falência”, promovido em 8 de setembro pelo Instituto Justiça & Cidadania e pela Editora Globo. 

“Agora ele vai conversar com os líderes sobre a escolha do relator para encaminhar dessa forma o Projeto, o que encurtaria bastante a tramitação no Senado”, confirmou, durante sua participação no evento, o Ministro Luis Felipe Salomão.

Além do magistrado, que é Presidente do Conselho Editorial da Revista JC, participaram do webinar outros três respeitados especialistas em recuperação judicial: o Deputado Federal Hugo Leal, que relatou o PL nº 6.229/2005 na Câmara; o administrador judicial Bruno Rezende, membro do Grupo de Trabalho do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para a modernização dos processos de recuperação judicial e de falência; e o professor de Direito Processual da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Flávio Galdino – um dos advogados brasileiros com maior atuação no segmento. A mediação ficou sob a responsabilidade do Presidente do Instituto JC, Tiago Salles, e da colunista do jornal O Globo Flávia Oliveira. 

O Senador David Alcolumbre, que iria participar ao vivo, teve que cancelar por ter sido convocado de última hora para reunião no Palácio do Planalto com o Presidente da República, Jair Bolsonaro.

Caixa de ferramentas – O Projeto pode vir a facilitar o acesso ao crédito e agilizar os processos de recuperação e/ou liquidação das empresas em dificuldade. Segundo os especialistas, a reforma moderniza a legislação e traz, dentre outros avanços: a ampliação das garantias para os investidores que colocarem “dinheiro novo” em empresas em dificuldades (financiamento DIP); diretrizes para as falências transnacionais; e dispositivo de negociação prévia que possibilita às empresas suspender a execução de dívidas por 60 dias, antes mesmo de pedir recuperação.

O texto aprovado na Câmara também reforça os mecanismos de solução consensual entre as partes, como a recuperação extrajudicial e a mediação; prevê o parcelamento em até sete anos das dívidas com a Fazenda Pública; amplia a permissão para que produtores rurais possam entrar em recuperação; e cria mecanismo para que o empresário que decretar falência possa voltar ao mercado com mais rapidez após liquidar sua empresa (fresh start).

“É preciso colocar na caixa de ferramentas dos operadores, empresários e magistrados uma série de instrumentos. Embora a Lei nº 11.101/2005 seja boa, ela ainda carece de aperfeiçoamentos. Atravessar um período conturbado com uma lei que não conta, por exemplo, com instrumentos para agilizar o processo falimentar (…) nos atrasaria”, pontuou o Professor Flávio Galdino.  

Impacto legislativo – O webinar foi um desdobramento do grupo de trabalho, coordenado pelo Ministro Luis Felipe Salomão e pelo Professor Flávio Galdino, que reuniu as maiores autoridades do País no assunto, incluindo magistrados, advogados, acadêmicos e administradores judiciais. O debate foi condensado no livro “Análise de Impacto Legislativo na Recuperação e na Falência”, produzido pela Editora Justiça & Cidadania (PDF disponível para download em www.editorajc.com.br). 

“Obrigatória em muitos países para a aprovação de novas leis, a AIL é ainda pouco usual no Brasil. No caso específico, o estudo procurou consolidar uma série de sugestões de aperfeiçoamento ao Projeto e possibilitar que os deputados e senadores tivessem condições de melhor avaliar seus diversos impactos”, explicou o editor Tiago Salles.

“O Estudo veio em muito boa hora. Esse tipo de análise é de extrema importância, porque uma vírgula errada na legislação pode causar um impacto dramático. O momento econômico que o País e o mundo atravessam já é extremamente delicado, de modo que ter uma legislação eficiente, especialmente para a reestruturação de negócios, de dívidas e de falências, se for o caso, é de extrema importância”, comentou o Professor Galdino.

Papel do administrador judicial – Segundo Bruno Rezende, que prestou consultoria especializada ao relator da matéria na Câmara, Deputado Hugo Leal,  fortalece o papel do  administrador judicial (AJ) como agente potencializador da negociação entre credores e devedores: “O AJ, como longa manus do Judiciário, tem que ajudar essas negociações a alcançar os maiores proveitos sociais e econômicos, para evitar exatamente a quebradeira geral”.

“Não cabe ao administrador judicial ou ao Poder Judiciário se imiscuir na viabilidade econômica e financeira dos planos de recuperação. Mas cabe fazer o controle de legalidade, para evitar a fraude e o abuso de direito, na formação daquela vontade, dentro daquela negociação. (…) Pelo projeto de lei, o AJ torna-se o fiscalizador do decurso das tratativas para a regularidade das negociações entre o credor e o devedor, para assegurar que devedores e credores não adotem expedientes dilatórios, inúteis ou, em geral, prejudiciais ao andamento do processo”, completou Bruno Rezende.

Chão de fábrica – Por fim, o Deputado Hugo Leal explicou como foi a trajetória do PL nº 6.229/2005, desde a sua apresentação apenas sete meses após a aprovação da Lei, originalmente para resolver um “defeito” relacionado à penhora feita pelo Fisco nas recuperações judiciais. Ao longo dos últimos 15 anos, foram apresentados outros 32 projetos de modificações na Lei de Recuperação, propostas que foram apensadas ao PL nº 6.299/2005 e que em grande parte, segundo o deputado, foram incorporadas.

Outras contribuições vieram a partir do grupo de trabalho criado pelo Ministério da Fazenda, em 2016, cujas recomendações se consolidaram no PL no 10.220/2018, apresentado pelo Poder Executivo. Contudo, segundo o Deputado, a permanência desse PL durante muito tempo na Casa Civil fez com ele sofresse muitas alterações, influenciadas, sobretudo, por uma visão apenas fiscal da recuperação. A matéria também não prosperou porque “não havia clima” quando chegou à Câmara, em 2018, em pleno processo eleitoral.

Com as contribuições do PL 11.220/2018, a tramitação do PL nº 6.229/2005 foi retomada no ano passado. Segundo o parlamentar, foi um processo legislativo participativo, no qual foram ouvidas mais de 40 entidades, em várias audiências públicas e seminários. “Buscamos coletar o ‘chão de fábrica’, o que efetivamente acontece na recuperação judicial, para trazer uma modificação da legislação que seja exequível”, contou ele.

A medida estava pronta para a votação em março de 2020, porém veio a pandemia de covid-19 e a suspensão parcial dos trabalhos legislativos. O que, segundo Hugo Leal, tornou a aprovação do projeto ainda mais urgente. “Naquele momento, entendemos de apresentar um projeto em separado, uma matéria emergencial, o PL no 1.397/2020, no qual vieram alguns conceitos novos. Apesar de termos aprovado com grande esforço na Câmara, não passou pelo Senado, mas foi um grande ensinamento. No debate do processo emergencial da pandemia, recebemos várias contribuições”, explicou o deputado.

O parlamentar acrescentou que as derradeiras, porém não menos valiosas, propostas de aperfeiçoamento do PL no 6.229/2005 vieram da Análise de Impacto Legislativo organizada pelo Ministro Luis Felipe Salomão e pelo Professor Flávio Galdino. Trabalho que embasou a apreciação pelos deputados na Câmara e que agora vai nortear a votação no Senado.

“O Senado vai ter um papel muito relevante nesse Projeto, que é trazer a contribuição da experiência. Tenho conversado muito com o Senador Alcolumbre, fizemos duas rodadas de conversas com ele, especialistas e diversos outros senadores, que já conseguem perceber a relevância desse tema para a economia e para fornecer ferramentas ao Judiciário para o enfrentamento da crise”, finalizou o Ministro Luiz Felipe Salomão.