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Não reconhecimento ao transporte gratuito: ausência de dano moral

31 de julho de 2009

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10ª Câmara Cível

APELAÇÃO CÍVEL No 2008.001.44337

APTE:                TRANSPORTADORA MACABU LTDA

APDO:              HELENA MARIA DOS SANTOS REIS P/SI E
REP/S/FILHO THIAGO DOS SANTOS REIS

RELATOR:      DES. JOSÉ CARLOS VARANDA

 

Ementa

Responsabilidade Civil. Dano moral. Transporte coletivo de passageiros. Incidente ocorrido entre autores e preposto da ré, acerca do transporte gratuito deles, em ônibus desta.

Autores que teriam direito ao transporte gratuito, negado pelo motorista. Fatos narrados na inicial e em depoimentos, que não violaram qualquer dos direitos da personalidade. O simples impedimento ao embarque ou o não reconhecimento ao transporte gratuito, por si só, não são aptos à causar dano moral, se a conduta não ofende a integridade física ou a honra da pessoa. Sentença que se reforma. Recurso provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Cível entre as partes acima mencionadas.

ACORDAM os Desembargadores componentes da E. 10a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro em dar provimento ao recurso.

Decisão Unânime.

1. Adota-se o relatório já lançado aos autos.

2. Cogitam os presentes autos, de ação indenizatória, decorrente de incidente ocorrido em ônibus da apelante, no qual em certa ocasião, os apelados teriam sido impedidos de viajar gratuitamente naquele veículo.

3. Os fatos ensejadores da pretensão se acham suscitamente narrados na inicial, e deles não se pode extrair violação a qualquer dos direitos da personalidade dos apelados.

4. Há danos morais que se presumem de modo que ao autor, basta a mera alegação, ficando a cargo da outra parte a produção da prova em contrário.

5. Assim é que, sofre um efetivo dano moral o cônjuge que perde o outro em decorrência de acidente, ou os pais que experimentam intensa dor pela morte do filho querido e amado. Há também aqueles danos sofridos pelo próprio ofendido em certas circunstâncias especiais (uma grande ofensa à honra, uma grande dor decorrente de grave acidente com lesões físicas, etc), reveladora da existência da dor para o comum dos homens.

6. Há outros porém que devem ser comprovados, não bastando a mera alegação, como o que consta da petição inicial, redigida data venia a moda de roteiro de telenovela mexicana, e lembrando as narrativas das sagas da literatura nórdica medieval, usando e abusando da linguagem exagerada, tentando transformar gotas d’água em verdadeira tempestade.

7. Sua intenção, sem dúvida, é tentar induzir o Julgador a pensar em termos igualmente exagerados, numa inútil tentativa de afastar o comedimento e a contemporização necessários a qualquer integrante do Poder Judiciário.

8. Desde há muito se sabe que:

in cognoscendo neque excandescere adversus eos, quosmalos putat, neque precibus calamitosorum inlacrymari oportet: id enim nos est constantis et recti iudicis, cuiusanimi motum vultus detegit” (CALISTRATO, L. 19, § 1o. Dig. de Officio Preasidis).

 9. A chamada “jurisprudência sentimental” já foi devidamente repudiada pela doutrina e pelo próprio Poder Judiciário, pois trouxe mais males que benefícios. Na lição de CARLOS MAXIMILIANO:

“Uma forma original do Direito Livre, anterior, aliás, ao primeiro surto desta doutrina, encontra-se nos julgamentos do Tribunal de primeira instância, de Châteu-Thierry, presidido e dominado pelo bom juiz Magnaud (1889-1904). Imbuído de idéias humanitárias avançadas, o magistrado francês redigiu sentenças em estilo escorreito, lapidar, porém afastadas dos moldes comuns, mostrava-se clemente e atencioso para com os fracos e humildes, enérgico e severo com os opulentos e poderosos. Nas suas mãos a lei variava segundo a classe, mentalidade religiosa ou inclinações políticas das pessoas submetidas à sua jurisdição.

Na esfera criminal e correicional, e em parte na civil, sobressaiu o Bom Juiz, como exculpar os pequenos furtos, amparar a mulher e os menores, profligar erros administrativos, atacar privilégios, proteger o plebeu contra o potentado. Não jogava com a hermenêutica, em que nem falava sequer. Tomava atitudes de tribuno; usava de linguagem de orador ou panfletário; empregava apenas argumentos humanos, sociais, e concluía do alto, dando razão a este ou àquele sem se preocupar com os textos.

Era um vidente, apóstolo, evangelizador temerário, deslocado no pretório. Achou depois o seu lugar — a Câmara dos Deputados; teve a natural coorte de admiradores incondicionais — os teóricos da anarquia. Os socialistas não iam tão longe; seguiam-no a distância, com as necessárias reservas expressas.

O fenômeno Magnaud foi apenas “retumbante manifestação de ideologia pessoal” atravessou o firmamento jurídico da Europa como um meteoro; da sua trajetória curta e brilhante não ficaram vestígios. Quando o magistrado se deixa guiar pelo sentimento, a lide degenera em loteria, ninguém sabe como cumprir a lei a coberto de condenações forenses.

Ao invés do movimento subjetivo, deve prevalecer o instinto social: o primeiro levaria a absolver o pequeno, roubador de milionário; o segundo, a puni-lo como indivíduo perigoso para a comunidade. O papel da judicatura não é guiar-se pelo sentimentalismo; e, sim, manter o equilíbrio dos interesses, e dentre estes distinguir os legítimos dos ilegítimos. Longe de atender só ao lado material, ou só ao moral, funde os dados econômicos e os eminentemente sociais, a fim de assegurar o progresso dentro da ordem, a marcha evolutiva da coletividade, mantidas as condições jurídicas da coexistência humana. Jamais poderá o juiz transpor os limites estabelecidos pelo Código — ultra quos citraque nequit consistere rectum (“além e aquém dos quais não pode o justo exigir”). Não considera a lei como rígida, completa o texto; porém não lhe corrige a essência, nem a substitui jamais.”

10. E do alto de sua cátedra na Universidade de Roma, assim ensinava GIORGIO DEL VECCHIO:

“Se qualquer opinião ou sentimento individuais fossem motivo bastante para legitimar o desrespeito ao direito estabelecido, a consequência não seria o advento de uma mais alta justiça, mas sim de subversão de toda a justiça pelo aluimento das suas bases de certeza e segurança. Com efeito, sabe-se que os mais diversos motivos podem concorrer para atacar uma ordem jurídica positiva: não apenas uma aspiração puríssima por uma justiça melhor, mas também o instinto egoísta e o interesse em se furtar ao cumprimento do próprio dever. Sem dúvida, um certo espírito crítico, e principalmente auto-crítico, é sempre necessário nesta matéria; mas não deve esquecer-se que o espírito revolucionário não poucas vezes também tem abusado do nome sagrado da justiça para encobrir as mais impuras paixões e os mais inconfessáveis interesses.”

11. Diariamente todos os cidadãos são expostos a uma miríade de acontecimentos que geram aborrecimentos, indignação e constrangimento: engarrafamentos de trânsito, menores abandonados e lixo espalhado pelas ruas, são apenas alguns exemplos.

12. Mas isso não é fundamento de pedido de indenização por danos morais! E por qual razão? Simples: porque não é qualquer fato ou acontecimento diário que causa dano moral indenizável.

13. A ausência de efetiva repercussão negativa nos sentimentos subjetivos de honra, imagem e autoestima não autoriza o pleito indenizatório. Isso porque não se pode, e nem se deve banalizar o conceito de dano moral, como veremos a seguir.

14. O pleito Autoral não tem qualquer fundamento que enseje uma pretensão indenizatória a título de dano moral. Nada de dano efetivo real se identifica, pois os fatos narrados não têm potencialidade ofensiva à integridade moral do autor, até porque, nada se comprovou!

15. A inicial não cogita de perda que gerasse angústia profunda, como, por exemplo, na morte de um parente. Não houve qualquer repercussão física na pessoa do autor, que continuou como sempre foi. Não houve qualquer repercussão nos meios sociais em que o mesmo circula. Não houve divulgação ou ciência de seus familiares, seus amigos e/ou no meio profissional em que atua. Não houve, em suma, qualquer situação traumática, no plano moral, assim como qualquer demonstração de prejuízo de negócio, diminuição ou perda de relações afetivas, afastamento de parentes ou qualquer outra afetação perante quem quer que seja.

16. Ocorre que a reparação do dano moral, em boa hora consagrada pela Constituição de 1988 mas infelizmente deturpada, não se presta a contemplar situações desse jaez. O dano moral indenizável é aquele expressivo, que causa dor ou abalo de tal forma significativos ou duradouros que não possa ficar impune, não se confundindo com os pequenos incidentes e aborrecimentos registrados no cotidiano dos relacionamentos comerciais e pessoais.

17. O dano moral está intimamente ligado aos direitos da personalidade, como enfatiza Paulo Luiz Netto Lobo, in Danos Morais e Direitos da Personalidade, in RTDC, vol. 6, abr/jun-2001, págs.79/97, e pelo que consta, nenhum deles teria sido violado.

18. No comum dos casos, esses pequenos dissabores ou microtraumas acabam por naturalmente ser superados e acomodados sem que gerem sequelas psicológicas relevantes no normal das pessoas. Podem, outrossim, gerar providências diversas, como a própria quebra do relacionamento comercial ou a denúncia do fato perante órgãos de proteção do consumidor, sem que se chegue a cogitar da hipótese de reparação pecuniária. Não se pode enfim permitir que a louvável idéia da compensação indireta aos efetivamente afetados no âmbito psicológico, por fatos graves, possa levar ao efeito inverso da formação de uma sociedade histérica e preocupada com a monetarização dos transtornos, na qual o dano moral seja visto como fonte de receita e na qual cada incidente seja tanto mais bem-vindo quanto maior o poderio econômico do agente causador (grifamos).

19. Assim, se considera os autores suas vidas extremamente abaladas por fato de proporções como o ora verificado, não é perante o Judiciário que devem buscar auxílio.

20. Como salientam a doutrina e a jurisprudência, o mero transtorno, aborrecimento, desentendimento, desavença, contrariedade e frustração de expectativa não configuram, jamais, fundo e ponderável gravame à dignidade, honra, idoneidade ou outro aspecto moral com direito subjetivo e personalíssimo. Assim é a lição de WLADIMIR VALLER:

“Quando se alardeia danos morais, a incomprovação de seus efeitos no patrimônio da vítima, vale dizer, a inexistência de prova concludente quanto ao nexo causal que deve vincular o sentimento que se disse inquietado e o dano material consectário e direto, faz com que perca relevo jurídico pretensão indenizatória que se apóie em arguição daquele jaez. Não há indicações seguras de que o suplicante teve seu crédito abalado ou que, de algum modo, passou para um estágio de descrédito perante a sociedade ou, então, junto à comunidade comercial e ao mundo econômico financeiro. O dano, mesmo que possa advir de um comprometimento moral, deve traduzir-se em consequência necessária do ato de inexecução. Na verdade, sem a prova de um efetivo prejuízo, não se há de falar em dano indenizável, pois este só se dimensiona possível quando repercuta, de algum modo, no patrimônio do vitimado.”[1]

21. Nem todo mal-estar configura dano moral. Assim, di-lo o ilustre magistrado paulista Antonio Jeová Santos, em sua recente e útil obra jurídica Dano Moral Indenizável, Lejus, já em 3a ed. 2001.

22. Desenvolvendo o tema, assim discorre ele nas págs.119/122 de seu livro:

“Visto dessa forma, pode parecer que qualquer abespinhamento propicia o exsurgimento do dano moral. Qualquer modificação no espírito, ainda que fugaz, aquele momento passageiro de ira, pode causar indenização. Sem contar que existem pessoas de suscetibilidade extremada. Sob qualquer pretexto, ficam vermelhas, raivosas, enfurecidas. Não se pode dizer que não houve lesão a algum sentimento. Porém, seria reduzir o dano moral a mera sugestibilidade, ou proteger alguém que não suporta nenhum aborrecimento trivial, o entendimento que o dano moral atinge qualquer gesto que cause mal-estar.

Existe, para todos, uma obrigação genérica de não prejudicar, exposto no princípio alterum non laedere. De forma correlata e como se fosse o outro lado da moeda, existe um direito, também genérico, de ser ressarcido, que assiste toda pessoa que invoque e prove que foi afetada em seus sentimentos.

Esse princípio sofre mitigação quando se trata de ressarcimento de dano moral. Simples desconforto não justifica indenização.

Nota-se nos pretórios uma avalanche de demandas que pugnam pela indenização de dano moral, sem que exista aquele substrato necessário para ensejar o ressarcimento. Está-se vivendo uma experiência em que todo e qualquer abespinhamento dá ensanchas a pedidos de indenização.

Não é assim, porém. Conquanto existam pessoas cuja suscetibilidade aflore na epiderme, não se pode considerar que qualquer mal-estar seja apto para afetar o âmago, causando dor espiritual. Quando alguém diz ter sofrido prejuízo espiritual, mas este é conseqüência de uma sensibilidade exagerada ou de uma suscetibilidade extrema, não existe reparação. Para que exista dano moral é necessário que a ofensa tenha alguma grandeza e esteja revestida de certa importância e gravidade.

Nos grandes magazines, já se vulgarizou o uso de artefatos que detectam a saída de mercadorias que, à sorrelfa, possam ser subtraídas por algum cliente. Se alguém comprar e pagar o artigo mas, por mero esquecimento do funcionário, o artefato não for retirado do produto, fazendo com que o sensor com sinais de bip emita sons, obrigando funcionários a, de forma cavalheiresca e sutil, pedir ao comprador para verificar o pacote ou sacola contendo o bem comprado e, verificado sem estardalhaço que tudo não passou de esquecimento do funcionário, é óbvio que essa circunstância se coloca como mero aborrecimento, não suscetível de configurar o dano moral.

Diferentemente, se na hipótese acima ventilada, seguranças do magazine conduzirem o cliente a local reservado, sob os olhares de virtuais compradores que naquele momento estão na loja, e obrigarem o suposto ladrão a tirar as roupas, fizerem requintada busca pessoal sob impropérios, claro está que aquilo que poderia ser um mero aborrecimento indiferente ao direito de danos, transformou-se em impacto nos sentimentos do honesto comprador. Aí, o dano moral emerge em toda a sua plenitude.

O perfeito entendimento sobre a configuração do dano moral está, exatamente, no verificar a magnitude, a grandeza do ato ilícito.

Se um motorista xinga outro depois de uma manobra arriscada ao volante, não se vá inferir que adveio dano moral. A mulher que é assediada na rua, rapidamente, en passant, e até se o homem proferir algum adjetivo ofensivo, pensando que está sendo galante, também não haverá dano moral pela pequenez que a consequência desses atos pode resultar na esfera espiritual da ofendida.

A figura do homem médio, para ser joeirado daquele que tem uma suscetibilidade exacerbada da pessoa normal, que não se agasta facilmente, há de ser buscada nesse tema. Aquele mal, que infligido em decorrência da própria atividade que a pessoa exerce, não pode ser considerado dano moral apto a ingressar no mundo jurídico como a prática de um ilícito suscetível de dar azo à indenização.

Um funcionário que exerce as funções de caixa em supermercado, por exemplo, está sujeito a deparar-se com pessoas insatisfeitas com o preço ou com a qualidade do produto encontrado. E natural, embora reprovável, que essa pessoa procure desabafar o seu descontentamento com o funcionário mais próximo e que passe mais tempo ouvindo-a. Também não haverá dano moral. O motorista de ônibus coletivo que a todo instante é obrigado a suportar palavras ferinas, ora porque o passageiro está atrasado e quando chegar ao destino ouvirá uma descompostura do seu chefe, ou o árbitro de futebol que, no estádio ouve de torcedores enraivecidos adjetivos pouco recomendáveis, não poderão invocar, depois, o órgão jurisdicional para buscar reparação por dano moral. As atividades que ditas pessoas desenvolvem implicam no risco de ouvirem palavras menos airosas, o baldão. É um risco previamente assumido e decorre do cotidiano. Desde que os impropérios se circunscrevam ao mero e simples desabafo, sem nenhuma outra valoração do que poderia se converter em ilicitude, não há dano moral indenizável.

Agora, se o caixa, o motorista de ônibus ou o árbitro de futebol forem injuriados depois da jornada de trabalho, a situação se inverte. Não mais estarão no exercício da atividade na qual, portanto, estavam a correr o risco de alguma ofensa. Se, por exemplo, algum tempo depois de uma partida de futebol, o árbitro em seu local de trabalho escuta que é um ladrão e que sua mãe não é nenhum modelo de mulher virtuosa, evidente que o dano moral adveio e grande é a possibilidade de o ofensor ser condenado ao pagamento de indenização.

Como asseveram Gabriel Stiglitz e Carlos Echevesti (Responsabilidad Civil, p. 243), “diferente do que ocorre com o dano material, a alteração desvaliosa do bemestar psicofísico do indivíduo deve apresentar certa magnitude para ser reconhecida como prejuízo moral. Um malestar trivial, de escassa importância, próprio do risco cotidiano da convivência ou da atividade que o indivíduo desenvolva, nunca o configurarão”.

O que se quer afirmar é que existe um mínimo de incômodos, inconvenientes ou desgostos que, pelo dever de convivência social, sobretudo nas grandes cidades, em que os problemas fazem com que todos estejam mal-humorados, há um dever geral de suportá-los.

O mero incômodo, o desconforto, o enfado decorrentes de alguma circunstância, como exemplificados aqui, e que o homem médio tem de suportar em razão mesmo do viver em sociedade, não servem para que sejam concedidas indenizações.

O dano moral somente ingressará no mundo jurídico, com a subsequente obrigação de indenizar, em havendo alguma grandeza no ato considerado ofensivo a direito personalíssimo. Se o ato tido como gerador do dano extrapatrimonial não possui virtualidade para lesionar sentimentos ou causar dor e padecimento íntimo, não existiu o dano moral passível de ressarcimento. Para evitar a abundância de ações que tratam de danos morais presentes no foro, havendo uma autêntica confusão do que seja lesão que atinge a pessoa e do que é mero desconforto, convém repetir que não é qualquer sensação de desagrado, de molestamento ou de contrariedade que merecerá indenização. O reconhecimento do dano moral exige determinada envergadura. Necessário, também, que o dano se prolongue durante algum tempo e que seja a justa medida do ultraje às afeições sentimentais.

As sensações desagradáveis, por si sós, que não trazem em seu bojo lesividade a algum direito personalíssimo, não merecerão ser indenizadas. Existe um piso de inconvenientes que o ser humano tem de tolerar, sem que exista o autêntico dano moral”.

23. Em excelente trabalho publicado na Revista do Advogado, edição de dezembro de 1996, págs.7/14, sobre o Dano Moral e a sua Avaliação, o Magistrado e Professor José Ozório de Azevedo Junior, assim se manifesta:

“Convém lembrar que não é qualquer dano moral que é indenizável. Os aborrecimentos, percalços, pequenas ofensas não geram o dever de indenizar. O nobre instituto não tem por objetivo amparar as suscetibilidades exageradas e prestigiar os chatos. Já tive conhecimento de caso em que um juiz moveu ação contra o seu colega que reformou um seu despacho de forma que ele considerou ofensiva.. Também um perito moveu ação contra o advogado que criticou o laudo com energia… O Código Civil Português tem dispositivo de grande sabedoria e utilidade. É o artigo 496o “Danos não Patrimoniais. Na fixação da indenização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam tutela do direito”

Por outras palavras, somente o dano moral razoavelmente grave deve ser indenizado.”

24. Em acórdão publicado na RT 782/252, oriundo do TJSP, sobre o que se caracterize efetivamente como dano moral, assim se expressou o seu relator, o Des. Elliot Akel:

“Vivemos período marcado por aquilo que se poderia denominar banalização do dano moral. Notícias divulgadas pela mídia, muitas vezes com estardalhaço, a respeito de ressarcimentos milionários por alegado dano moral, concedidos por Juízes no país e no exterior, acabam por influenciar as pessoas, que acabam por crer na possibilidade de virem a receber polpudas indenizações por aquilo que, a rigor, menos que dano moral, não constitui mais que simples aborrecimento”

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“Os aborrecimentos e contrariedades fazem parte do quotidiano. A vida é composta por prazeres e desprazeres. Quem quer que viva em uma cidade como São Paulo está sujeito a dissabores, no trânsito caótico, nas filas para utilização dos equipamentos urbanos, no tempo de abertura dos semáforos frequentemente insuficiente para a travessia de pedestres, no tratamento nem sempre cortês dos atendentes e vendedores. E nem por isso se pensará em, a cada um desses pequenos aborrecimentos, movimentar a máquina judiciária para obtenção de ressarcimento”.

25. Em recente decisão de 21/6/01, o STJ por sua 4a T., em decisão unânime conduzida pelo Min. Cesar Asfor Rocha, no RE no215.666-RJ, assim sintetizou:

“Dano moral – não ocorrência. O mero dissabor não pode ser alçado ao patamar do dano moral, mas somente aquela agressão que exacerba a naturalidade dos fatos da vida, causando fundadas aflições ou angústias no espírito de quem a ela se dirige. Recurso parcialmente conhecido e nessa parte provido.” (in RSTJ no150/382)”.

26. Em sendo assim, a conta de tais fundamentos, é que se dá provimento ao recurso, para julgar improcedente a pretensão autoral, condenando-se os autores nas custas processuais e honorários advocatícios que se arbitram em R$500,00, ficando isento porém, nos termos do art.12 da Lei 1060/50.

 

R.J. 10 de junho de 2009.

DES. JOSÉ CARLOS VARANDA

RELATOR



[1] VALLER, Wladimir – A Reparação do Dano Moral no Direito Brasileiro, 1a ed., E.V. Editora SP, 1994, p.147/148.