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Em Foco: Segurança em Xeque

31 de outubro de 2011

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O assassinato da juíza carioca Patrícia Lourival Acioli, em agosto último, expôs um problema que há muito acomete a magistratura, mas que não vem recebendo a devida atenção: a falta de segurança. Levantamento divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão de fiscalização e planejamento estratégico do Poder Judiciário, aponta a existência de pelo menos 100 magistrados sob ameaça ou em situação de risco em todo o País. Esses juízes são responsáveis, em sua maioria, por conduzir e julgar causas relacionadas ao crime organizado.
Patrícia, 47 anos, foi executada com pelo menos 21 tiros, quando chegava em casa, em Niterói, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Ela havia sido a responsável pela prisão de vários milicianos e criminosos na cidade de São Gonçalo, onde ficava a comarca em que atuava. O assassinato da magistrada desencadeou uma série de protestos e promessas de autoridades dos três poderes de que a segurança dos juízes com atuação na área criminal ganharia a necessária e merecida atenção.
De acordo com levantamento do CNJ junto aos tribunais do País, haveria, atualmente, 69 juízes ameaçados, 13 sujeitos a situação de risco e 42 sob escolta. Muitos magistrados se enquadram em duas situações ao mesmo tempo – ameaçados com escolta, ou em situação de risco com escolta, por exemplo. Paraná seria o estado com mais juízes ameaçados: 30 no total, de acordo com as informações prestadas pelo Tribunal de Justiça daquela unidade federativa. A segunda posição seria ocupada pelo Rio, com 13 juízes nessa situação.
O assassinato de Patrícia mobilizou toda a cúpula do Poder Judiciário. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça, ministro Cezar Peluso, ao ser informado do ocorrido, telefonou para o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, pedindo intervenção urgente da Polícia Federal. Cardozo assegurou  que tomaria providências imediatas. Na sequência, o presidente do STF entrou em contato com o governador do Rio, Sérgio Cabral, que informou que todas as medidas necessárias estão sendo tomadas com o máximo de empenho para apuração da autoria do crime.
Em sessão plenária do CNJ, realizada após o assassinato, Peluso deixou claro aos magistrados que estes não serão abandonados pelo STF nem pelo CNJ “na garantia da segurança e da tranquilidade indispensáveis ao exercício da função essencial à efetividade dos direitos, da cidadania e da subsistência do Estado Democrático de Direito, e da independência inegociável do Poder Judiciário”.
“Assim como, no curso da história, não o lograram forças mais poderosas, as do chamado crime organizado não intimidarão, agora nem nunca, a magistratura, a sociedade brasileira, tampouco o Estado Democrático de Direito”, afirmou o ministro, na ocasião. Peluso designou uma comissão composta por três juízes auxiliares da presidência do CNJ para acompanhar de perto as investigações sobre a morte da juíza carioca.
A corregedora nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon, também cobrou explicações do TJRJ sobre a segurança para a juíza Patrícia. Em entrevista à imprensa, a ministra informou que foram registradas quatro ameaças contra Patrícia Acioli, mas todas haviam sido arquivadas por serem consideradas “imotivadas”. “Essas representações são comuns a todos os juízes que agem de uma forma mais rigorosa. Há meses, verificamos que o PCC (Primeiro Comando da Capital) havia formulado na Corregedoria nada menos do que 40 representações contra uma juíza. Os próprios bandidos fazem representação ao Conselho dos Magistrados”, disse.
“Todas as vezes que o magistrado em perigo se dirige à Corregedoria, nós fazemos o que está ao nosso alcance. Só posso lamentar, como magistrada, como cidadã brasileira, esse bárbaro ataque”, acrescentou Eliana Calmon.
A corregedora reafirmou o compromisso do CNJ e da Corregedoria Nacional de Justiça para com os magistrados brasileiros. “Os magistrados brasileiros podem estar certos de que não estão sozinhos. O Conselho está sempre alerta, não só para coisas erradas mas para apoiar os magistrados nos momentos de necessidade. Eu, como corregedora, estarei sempre ao lado da magistratura brasileira”, afirmou.
A maior segurança para os magistrados deverá ser uma das metas do Poder Judiciário para 2012. Os objetivos prioritários são estabelecidos pelo CNJ, em encontro que conta com a participação dos presidentes de todos os tribunais do país. A próxima edição está prevista para ocorrer em novembro. “A segurança não é só para a magistratura, mas para a população que vai ao fórum em busca de justiça”, explicou o juiz Fernando Florido Marcondes, secretário-geral do CNJ. De acordo com ele, a possibilidade de se instituir uma meta específica do Judiciário para a segurança começou a ser discutida no ano passado, e ganhou força com o assassinato de Patrícia, no dia 12 de agosto.
Polícia
A crise desencadeada pela execução da juíza chegou às esferas dos poderes Executivo e Legislativo. A Câmara dos Deputados, por exemplo, realizou audiências públicas para discutir a segurança dos magistrados e recebeu uma série de sugestões para resolver o problema. Deputados da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado também estiveram no Rio de Janeiro para acompanhar as investigações sobre o assassinato da juíza Patrícia Acioli.
Na ocasião, o presidente da Comissão de Segurança, deputado Mendonça Prado (DEM-SE), afirmou que é preciso aperfeiçoar o ordenamento jurídico para garantir mais segurança aos magistrados e aprimorar o controle de armas no País. “Devemos estabelecer uma parceria com todos os agentes públicos para que o Poder Judiciário possa atender às expectativas da sociedade com maior segurança”, disse Prado.
Na ocasião, ficou decidido que a Comissão de Segurança Pública criaria regras para assegurar mais proteção às autoridades no Brasil. O deputado Hugo Leal (PSC-RJ) explicou que a ideia do protocolo é dar mais segurança a determinados profissionais, como juízes e promotores. “Estabeleceremos um protocolo oficial, que pode surgir a partir de uma lei ou até mesmo pelas instituições já existentes, que caracterize a proteção dessas autoridades que atuam principalmente no combate ao crime organizado”, destacou.
Diante da pressão por maior segurança, vem ganhando força também o projeto que visa à criação da Polícia Judiciária. O diretor da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Luis Bezerra, defendeu, em audiência que aconteceu na Câmara dos Deputados, a criação da Polícia Judiciária. De acordo com ele, a nova instituição poderá dar agilidade à proteção dos juízes. “Um atraso de 15 dias para oferecer escolta pode levar à morte de um juiz”, disse. Parlamentares garantiram que vão negociar o apoio do governo ao projeto de lei (PLS 3/10), em tramitação no Senado, que cria a Polícia Judiciária.
O deputado Fernando Francischini (PSDB-PR) também chegou a anunciar a criação de um grupo de trabalho das comissões de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, e de Direitos Humanos e Minorias, para levar ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, sugestões de medidas com o objetivo de aumentar a segurança de juízes.