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AGU comemora 25 anos debatendo a Segurança Jurídica para o Brasil

20 de março de 2018

Lucas Carvalho

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Realizado nos dias 7, 8 e 9 de março, no teatro Pedro Calmon – Brasília/DF, o Seminário “AGU 25 anos: Segurança Jurídica para o Brasil” contou com a presença do presidente Michel Temer e a presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármem Lúcia, na abertura. Ambos ressaltaram a relevância da advocacia pública para a administração no âmbito da Justiça. “A advocacia pública é das mais nobres das instituições. O advogado público faz exatamente o que o advogado privado faz, só que numa missão bastante nobre, porque ele vai defender os interesses do poder público”, afirmou Temer, que também ressaltou a função adversativa do órgão para o governo federal. “A AGU também orienta a administração pública com os seus pareceres, sempre pautados pela ideia da legalidade e da constitucionalidade”, completou.

Para a presidente do STF, Ministra Cármem Lúcia, não existe direito sem a advocacia. “Não foi por acaso que a Constituição da República do Brasil fez expresso que o advogado é essencial para a prestação da justiça”, destacou. Na ocasião, a chefe do Supremo lembrou de seu início na carreira da advocacia pública, aos 25 anos de idade, como procuradora do Estado de Minas Gerais.

Estiveram presentes também na ocasião da abertura o ex-presidente da República, José Sarney; os ministros do STF Dias Toffoli e Alexandre de ­Moraes; o ministro-­chefe da Casa Civil, Eliseu ­Padilha; o ministro da Justiça, Torquato Jardim; o ministro da ­Segurança Pública, Raul Jungmman; o comandante do Exército brasileiro, general Eduardo Villas Boas; a presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministra Laurita Vaz; o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Luiz Fux; o presidente do Superior Tribunal Militar, ministro José Coêlho Ferreira; e o presidente do Tribunal Superior do Trabalho, ministro João Batista Brito Pereira. Além das autoridades mencionadas, a série de ­encontros foi presidida pela atual Advogada-Geral da União, Grace Mendonça, e também contou com a presença de ex-ocupantes do cargo de Advogado-­Geral da União e de outros ­representantes jurídicos brasileiros e estrangeiros.

Durante a cerimônia de abertura ouviu-se falar sobre quais foram os legados deixados durante os 25 anos do órgão. Luís Inácio Adams, que esteve a frente da AGU entre 2009 e 2016, acredita que os desafios na área jurídica são renovados à medida em que o Brasil avança. “Cada legado é uma plataforma para novos desafios, e hoje um dos grandes é o tema do seminário: a segurança jurídica para o Brasil. É o que vai permitir que o país cresça na segurança para o investidor e para todos aqueles que vivem nesse país tão grande e poderoso, mas ainda tão debilitado na sua necessidade de afirmar-se como uma democracia forte daqui em diante”, destacou Adams.

Para José Eduardo Cardozo, que teve a curta passagem na condição de Advogado-Geral da União entre março e maio/2016 – período quando se concretizou o processo de impeachment da então presidente Dilma Rousseff, foi um grande avanço para o país passar a ter advogados públicos em defesa do interesse da União. “Há ainda hoje quem entenda que a defesa do poder público tem que ser feita de forma privada. Cada vez mais eu acredito que a população se conscientiza de que o advogado público é indispensável, seja como um advogado índice das causas públicas, seja como um fiscal interno da legalidade”, comemora.

Apresentação de painéis
Ao longo dos dois dias de evento foram expostos oito painéis, apresentados por representantes jurídicos do Brasil e de países da América Latina e de acadêmicos e magistrados de direito. A ideia era discutir ali os ­temas que envolvem o assunto geral do seminário: a segurança jurídica para o Brasil.

Com exceção do primeiro painel, que foi apresentado pelas ministras Cármem Lúcia e Grace Mendonça, todas as demais tiveram a mediação de representantes da imprensa especializada em política.

Nesta primeira inserção, a ministra Cármem Lúcia ressaltou a função da advocacia, seja a pública ou a privada, para a sustentação do artigo 1o da Constituição Federal, que diz: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito”. Na oportunidade, a ministra destacou que o trabalho da advocacia pública é silencioso, pois uma das principais atividades é evitar que o Estado gaste indevidamente.

Como a apresentação desse primeiro painel foi no dia 8 de março, em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, a Ministra aproveitou a coincidência para fazer alusão ao período em que foi procuradora do Estado de Minas Gerais, aos 25 anos de idade, ­falando um pouco sobre a evolução do judiciário de lá para cá.

Cármem Lúcia falou também sobre os desafios da carreira pública jurídica. Ao longo de sua trajetória na área, a ministra passou por diversos cargos e atualmente preside não somente o STF, mas também o Conselho Nacional de Justiça. À frente da pasta, ela realiza visitas periódicas a penitenciárias pelo Brasil conhecendo histórias. “Se aumentou a minha dor, aumentou também a minha esperança. Se multiplicou a minha visão do sofrimento humano, multiplicou também a minha força para lutar para que cada vez mais a gente tenha uma república que seja justa, igualitária e solidária para todos”.

O painel Advocacia Pública e a Efetividade dos Direitos Fundamentais teve como convidados o desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, e também professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Ingo Wolfgang, e o corregedor-­geral da Advocacia da União, Altair Lima. Questionado sobre a forma de atuação de um advogado público diante de possíveis conflitos entre o interesse público e o Estado Wolfgang respondeu “é evidente que há uma diferença entre esses dois interesses, às vezes. Uma advocacia pública que atue com independência pode orientar de forma efetiva um governo no sentido de evitar violações aos direitos fundamentais”, explicou o magistrado.

Na sequência, no terceiro painel, com o tema “A Advocacia Pública na América Latina”, a ministra Grace Mendonça, juntamente com ­repre­sentantes das procuradorias e advocacias da ­Colômbia, Guatemala e Paraguai, debateu as características de advocacia pública nesses países e as formas de cooperação entre eles e o Brasil no setor.

O tráfico de drogas, por exemplo, figurou entre os temas debatidos, por se tratar de um problema que os países ali representados precisam cooperar na busca da resolução. “A corrupção é uma dificuldade permanente e também um fenômeno internacional. Seu combate deve ser tratado a nível igualmente internacional”, comenta o diretor da Agência Nacional de Defesa Jurídica do Estado da ­Colômbia, Luiz Guillermo Vélez.

A ministra Grace Mendonça mencionou, ­se­gun­do ela, nova perspectiva de combate à improbidade pela Lei Anticorrupção, como os acordos de leniência que preservam a institucionalidade dos processos.

Advocacia Pública, Segurança Jurídica e os Meios Alternativos de Resolução de Conflitos no Plano Global
Sobre essa temática o subprocurador de Defesa e Representação Legal do Estado da Bolívia, Ernesto Rossel, explicou que o país buscou alternativas para resolver os conflitos de diferentes escalas. “Agora, se aplica um sistema escalonado para se chegar a essas soluções de controvérsias por meio de mediação, conciliação, negociação e ­arbitragem”, explica.

Outros convidados foram o ex-presidente do ­Supremo Tribunal Federal, Carlos Velloso; e a ­pro­­­­­­­­­­­­­fessora da Universidade de Brasília, Inez Lopes. Velloso afirmou que o brasileiro tem a mente “judicialista”, ou seja, quer sempre esgotar todas as i­nstâncias da esfera judicial antes de finalizar-se um processo. “Isso não é bom! Mesmo tendo um lado positivo, que é o de acreditar que os meios judiciais são os melhores na busca das soluções, isso acarreta a tal ‘lentidão’ da Justiça”, comenta.

Para Inez é necessário que não haja decisões unilaterais por parte dos Estados, por exemplo. “Isso pode prejudicar os outros, e não deve se tratar de guerras ou disputas, mas de uma busca justa por um consenso que agrade ao país como um todo nas buscas por Justiça”, afirmou. Inez ressaltou a importância que há nas ­diretrizes do novo Código de Processo Civil, que abrangem as técnicas da solução alternativa, ­arbitragem, conciliação e mediação. Porém, para a professora, é necessário ter cuidados especiais quando os casos envolvem a Administração Pública.

No quinto painel foram discutidas questões como a garantia de direitos no âmbito do Estado para os cidadãos e o trabalho de implantar uma cultura judiciária mais voltada para a conciliação no Brasil e em países latino-americanos.

A diretora de Pesquisas Judiciárias do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Maria Tereza Sadek, abriu o evento abordando a disparidade entre a amplitude de direitos fundamentais incorporados na Constituição e o acesso das populações à Justiça. “Do ponto de vista legal, o Brasil pode ser visto como um paradigma no campo de reconhecimento de direitos. Mas não podemos pensar nos textos legais como se fossem descolados da realidade. Aí temos a distância entre o que é apresentado na legislação e a realidade do Brasil”, afirmou.

Sobre a segurança jurídica para o desenvolvimento econômico o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Eduardo Guardia, mencionou que a ­insegurança jurídica na aplicação de normas gera ­incerteza no ambiente de negócios e compromete o ­desenvolvimento econômico do país. Para ele, a ­recente crise econômica brasileira foi resultado da fragilização na aplicação de normas como a Lei de Responsabilidade Fiscal.

“Estamos superando a maior crise econômica, fruto de decisões equivocadas, com a maior deterioração fiscal que já tivemos, resultado de um brutal enfraquecimento institucional. Leis desrespeitadas fragilizam o marco legal, criam incerteza, insegurança e prejudicam o horizonte de investimento”, afirmou.

Eduardo Guardia lamentou que o descumprimento de leis gere sensação de impunidade e enfraqueça o marco jurídico, além de afetar decisões de investimento e o processo decisório dos setores privado e público.

No evento, foram discutidas questões como as ­raízes da corrupção no Brasil e as medidas adotadas pelos órgãos de controle do setor público para mitigar e prevenir a corrupção.

Durante sua palestra, Raimundo Carreira, presidente do Tribunal de Contas da União, delineou diversos momentos em que a questão da corrupção esteve em evidência no país nas últimas décadas, destacando o aspecto histórico da questão. “Não podemos nos ­esquecer, no entanto, dos avanços históricos do Brasil no contexto do combate à corrupção”, pontuou.

O representante da Procuradoria Geral do Estado da Bolívia, Ernesto Rossel Arteaga, assinando o termo de criação da Associação Latino-Americana de Advocacias e Procuradorias de Estado acompanhado pela Advogada Geral da União, Grace Mendonça

AGU: desafios do passado e perspectivas para o futuro
No último painel apresentado, os ex-advogados-­gerais da União Luís Inácio Adams, José Eduardo Cardozo, ministro Gilmar Mendes e ministro Dias Toffoli discutiram o legado dos 25 anos da AGU e o seu futuro, que, segundo eles, passa pela ampliação da sua atuação conciliatória na defesa dos interesses do Estado.

“A Advocacia-Geral da União teve sua gênese no plano contencioso. Só que o contencioso não é uma sinalização de segurança jurídica. E se a AGU se ­assume como uma agente dessa segurança, ela deve repensar seu papel no contencioso – tendo avançado nesse ­sentido com conquistas como o acordo dos planos econômicos. O órgão deve seguir nessa direção”, ­afirmou Luís Inácio Lucena Adams.

Durante o painel, os convidados também conversaram sobre características e conquistas em suas gestões. “Meu foco foi a organização da AGU em autarquias e fundações, para estabelecer os alicerces do órgão. Conseguimos também a redução da litigância ao desobrigar a União de sempre recorrer em todas as ações”, rememorou o ministro Gilmar Mendes.

Cardozo refletiu sobre a crise institucional do Brasil e os rumos dos modelos de Estado no Brasil e no mundo. “Penso se não estamos em um período de transição de modelos de Estado, e espero que não percamos vista das conquistas humanitárias que alcançamos desde o século XVIII”, disse. “Temos de ter muito comedimento para pensar os rumos do país. Não podemos chegar ao ponto de desgastar as instituições”, concluiu.

Nascem a Associação Latino Americana e a Cartilha Segurança Jurídica do Investidor Estrangeiro no Brasil
Durante os 3 dias de seminário foram anunciados dois lançamentos: a Associação Latino Americana de Advocacias e Procuradorias de Estado e a cartilha ­“Segurança Jurídica do Investidor Estrangeiro no Brasil”.

A cartilha apresenta noções do sistema jurídico ­brasileiro e as medidas adotadas pelas instituições públicas para atrair investimentos e fomentar o crescimento econômico, buscando esclarecer de forma ­objetiva e simples o sistema processual brasileiro ao investidor estrangeiro, facilitando seu acesso às opor­tunidades no país.

Já a nova entidade formada, que foi nomeada como ALAP (Associação Latino Americana de ­Advocacias e Procuradorias de Estado), reúne instituições responsáveis pela advocacia pública no Brasil, na Colômbia, no Chile, na Guatemala, no Equador, no Panamá, em Honduras, no Peru, no Paraguai e na Bolívia.

A ministra Grace Mendonça foi eleita para presidir a associação. Segundo ela, a criação da entidade concretiza um “sonho antigo” de fortalecer a advocacia pública no contexto da América Latina. “Sabemos que, como integrantes de instituições de Estado, ­enfrentamos problemas e adversidades comuns. E acabamos construindo soluções para esses problemas, daí a importância de compartilharmos com países irmãos todas essas experiências para que juntos possamos construir uma advocacia pública cada vez mais forte”, explicou Grace.