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A sociedade e seu compromisso com os eleitos

14 de junho de 2016

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Uma sociedade que cultiva o hábito do debate político percebe que não há qualquer motivo para comemorações em um processo de impeachment como o que estamos testemunhando, mesmo que necessário e constitucional. Uma autoanálise mostrará que todos têm parcela de culpa no caminho traçado até aqui.

 Penso que devemos deixar de usar como desculpa a ideia de que temos uma jovem democracia. Em pleno 2016, com todo o avanço tecnológico e acesso à informação que possuímos, é um equívoco achar que há algo de jovem em nosso sistema político. O que precisa amadurecer é o comportamento do eleitor.

 Quando a sociedade vai às ruas, protesta, clama por mudanças, estamos vivenciando uma situação absolutamente natural. A manifestação de descontentamento com os rumos tomados pelos agentes públicos deve ocorrer sempre que algo ultrapasse a barreira da boa gestão, da ética e da moralidade.

 No entanto, cabe aqui o uso do velho ditado: é melhor prevenir do que remediar. O voto é um direito que traz grandes responsabilidades. A maior delas é o controle permanente dos eleitos. Eles foram os escolhidos para representar a sociedade e devem guardar coerência com as ideias e discursos que renderam sua eleição. O papel do eleitorado é justamente exigir que isso ocorra. Esse controle deve ser feito diariamente e não apenas quando o quadro político esteja irreversivelmente deteriorado.

 A crise ética e moral que enfrentamos atualmente em nosso país nos trouxe a uma encruzilhada. O caminho que vamos seguir daqui para frente determinará se chegaremos, ou não, a um lugar melhor do que o que deixamos para trás.

Cada um de nós, não apenas os gestores públicos, precisa ter o compromisso com a gestão pública, de responsabilidade com o uso do dinheiro arrecadado com o suor dos contribuintes e com o fim da corrupção. Esse é sim também papel do eleitor. Fiscalizar e cobrar de maneira permanente os eleitos. 

E essa cobrança precisa ser feita de maneira dura. Precisamos exercitar a boa memória e não reeleger aqueles que no seu histórico tenham desrespeitado a confiança recebida do eleitorado. Faltam recursos para investir em saúde, segurança, educação e justiça. Estados atrasam o pagamento dos funcionários e pensionistas. A União cobra juros altíssimos da renegociação da dívida dos Estados, inviabilizando que cumpram suas obrigações.

 Ao mesmo tempo, não há escassez na hora de aumentar a verba partidária que sustenta os partidos políticos. Muitos deles, como bem sabemos, são legendas de fachada, destinadas ao jogo do toma lá dá cá, para o qual a sociedade é convidada, apenas, para bancar a conta.

 A mobilização da sociedade deveria ser também contra isso e pela aprovação da lei que criminaliza o caixa dois de campanhas. 

O eleitor aprendeu da pior maneira que por trás de cada campanha existe um interesse. Alguns são nobres, conectados ao que há de mais virtuoso na síntese da atividade política. Outros são inconfessáveis. Escondem-se atrás da compra de interesses, como vemos diariamente no noticiário. 

As “doações”, como se percebe, são descaracterizadas de qualquer alinhamento político, beneficiando legendas de todas as cores. A prática não se fixa em ideologias, mas no benefício próprio. É um mero investimento.

 A sociedade não tem o direito de esmorecer até que exista de fato uma sintonia verdadeira entre os anseios do eleitor e o comportamento dos eleitos. É preciso que todos aqueles que receberam a honra de representar a população ponham em prática o discurso que lhe fez merecer cada voto. E que deixem de lado o universo que os separa da realidade quando estão detrás dos vidros escurecidos dos carros oficiais e a bordo dos jatinhos pagos com o dinheiro público.