Edição 102
Varas Trabalhistas de Fazenda Pública: Mais um desafio para a “nova” Justiça do Trabalho
31 de janeiro de 2009
Rafael Rolim de Minto Procurador do Estado do Rio de Janeiro
Ultrapassados quatros anos das alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 45, de 08 de dezembro de 2004, também conhecida como “Reforma do Judiciário”, a Justiça do Trabalho ainda convive com inúmeros dilemas oriundos da expressiva ampliação da sua competência.
Embora exista considerável resistência à nova realidade vivida pela Justiça Trabalhista, não restam dúvidas que os avanços desejados pelo Poder Constituinte derivado vão se tornando realidade a cada dia que passa.
Tais avanços, contudo, devem estar acompanhados de medidas que contemplem uma maior eficiência operativa na administração da Justiça do Trabalho. Em outras palavras, a multiplicação da competência daquela Justiça Especializada impõe uma gestão cada vez mais eficiente em termos de plena satisfação dos jurisdicionados com os menores custos para a sociedade.
A especialização das varas trabalhistas, tal como ocorre na Justiça Comum Estadual ou na Justiça Federal, é um elemento indispensável no debate acerca de uma “nova” Justiça do Trabalho, comprometida com a eficiência da sua gestão.
Destaque-se, na presente reflexão, antiga reivindicação da Administração Pública quanto à necessidade de criação de varas do trabalho de Fazenda Pública. Em que pese a ausência de ineditismo na abordagem do tema, não pairam dúvidas que a ampliação da competência da Justiça do Trabalho impõe um reexame da questão, levando-se em conta não apenas os interesses da Administração, mas também a eficiência operativa que deve nortear a chamada “nova” Justiça do Trabalho.
Como se sabe, as relações de emprego (não utilizo, neste momento, a expressão relação de trabalho, por força da decisão proferida pelo STF, na ADI nº 3.395-DF) mantidas entre a Administração Pública direta, autárquica e fundacional e seus empregados públicos não são regidas tão somente pela CLT, na medida em que, por força de normas constitucionais, sofrem o influxo de diversas regras de direito público, dentre as quais podemos destacar: ingresso mediante concurso público, aumento de salários somente através de lei e limitações orçamentárias na celebração de acordos coletivos.
Não restam dúvidas, portanto, que a relação de emprego mantida pelo Poder Público reveste-se de alto grau de especialidade; ainda mais quando lembramos que em tal relação não existe o conflito entre o capital e o trabalho, pelo simples fato de uma das partes não se dedicar ao lucro ou a acumulação de riqueza pelo capital, mas sim em prover o interesse público.
No campo processual, por sua vez, as diversas prerrogativas processuais da Fazenda Pública (p.ex., o quádruplo do prazo previsto no art. 847, in fine, CLT, o prazo em dobro para recorrer, presunção relativa dos recibos de quitação, dispensa de depósito recursal para interposição de recursos, reexame necessário e execução através de precatório) impõem um procedimento altamente especializado em todas as fases do processo.
As consequências negativas do tratamento indiscriminado de matérias e ritos especializados são de conhecimento de todos e, infelizmente, também afetam a todos. Podemos citar três situações rotineiras na Justiça do Trabalho, que, por conta de uma falta de atuação especializada, são agravadas sensivelmente, a saber:
A ausência de desconsideração da personalidade jurídica das empresas que prestam serviços para a Administração Pública, nos casos em que o próprio Poder Público também é vítima de fraude, recorrendo-se para uma segura execução da Fazenda Pública como responsável subsidiária. A existência de varas especializadas traria maiores condições para a busca de patrimônio da empresa e subsídios para desconsideração da personalidade jurídica da mesma, sem contar com a possibilidade de uniformização de procedimentos diante de empresas reconhecidamente fraudadoras, diminuindo, dessa forma, o comprometimento de dinheiro público;
A quitação dos precatórios e das requisições de pequeno valor (RPV) também é afetada profundamente por uma ausência de atualização especializada. A existência de varas e procedimentos especializados certamente dinamizaria o pagamento, bem como facilitaria o controle por parte do Tribunal Regional do Trabalho;
As diversas nulidades processuais alegadas pela Fazenda Pública, diante do descumprimento de normas legais específicas do Poder Público, praticamente deixariam de existir, contribuindo, dessa forma, para a celeridade da Justiça.
É certo que alguns Tribunas Regionais do Trabalho já adotam medidas que primam pela sua eficiência operativa, com a especialização de varas de Fazenda Pública, como, por exemplo, o Tribunal da 4ª Região (Rio Grande do Sul). Ainda que se tratem de movimentos isolados, não há como negar o início de uma transformação necessária que a Justiça Trabalhista deverá passar.
A ampliação da competência da Justiça do Trabalho e o seu consequente fortalecimento institucional impõem sua remodelagem, de modo a assumir com o máximo de eficiência as novas responsabilidades consagradas pela Constituição da República.
O primeiro passo, e talvez o mais importante, pode ser dado com a especialização das varas do trabalho, como, por exemplo, as varas do trabalho de Fazenda Pública, que, sem sombra de dúvida, irá contribuir para a celeridade e eficiência da “nova” Justiça Trabalhista, comprometida com os novos desafios do Poder Judiciário brasileiro.