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Uma contribuição do Direito Administrativo para o aprimoramento do ambiente de negócios no Brasil

15 de junho de 2016

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Valter Shuenquener de AraujoA caminhada rumo a um Estado Gerencial. Um projeto apartidário de redução da intervenção estatal no domínio econômico.

Pouco tempo após a promulgação da Constituição da República de 1988, mais precisamente em 1995, foi publicado um documento divulgado pela Presidência da República denominado Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. O referido texto foi elaborado a pedido do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso pelo, então, Ministro Bresser Pereira titular da pasta da Administração Federal e da Reforma do Estado. Em linhas gerais, consta, na referida obra, uma reluzente preocupação com a transformação do Estado brasileiro, um Estado Patrimonialista e Burocrático, em um Estado Gerencial. Há um nítido reconhecimento de que as crises pelas quais o Brasil passou, também, decorrem de uma crise no modelo de Estado adotado.

O Estado brasileiro havia se desviado de seu papel fundamental e, ao se agigantar em um paternalismo inexcedível, assumiu funções no setor produtivo da economia que originaram resultados desastrosos: ineficiência, deficit orçamentário, crise fiscal, corrupção, piora dramática na qualidade dos serviços de saúde, segurança e educação, dentre outros efeitos.

Nosso país, consoante se extrai do referido texto, ainda, guarda resquícios de um modelo de Estado Patrimonialista, um Estado regalista em que o poder é exercido pro domo sua. A distribuição de cargos públicos é feita, por não raras vezes, de modo a permitir que o poder seja exercido em proveito próprio. Benefícios garantidos ao próprio nomeante ou a uma determinada agremiação partidária que se encontre no poder. Os amigos da “Corte” recebem as prerrogativas, os privilégios necessários para o seu prazer pessoal ou o do seu grupo político. Também temos características de um Estado Burocrático, um Estado que, por mais que decida de modo impessoal, não tem compromisso com a qualidade e a eficiência. Um Estado que despreza o fato de que a vida das pessoas, também, é medida pelo tempo e que age sem qualquer preocupação com os destinatários de seus atos.

E há, ainda, algo muito pior: as frequentes ocasiões em que se tem uma fusão dos modelos de Estado Patrimonialista e Burocrático. Nesses casos, utiliza-se a burocracia para, unicamente, esconder preferências e privilégios. É a burocracia irracional, o que deixaria sem palavras Max Weber, criador da teoria da burocracia na Administração. Sua doutrina foca na eficiência da burocracia estruturada por normas impessoais e racionalmente estabelecidas[1]. No Brasil, temos um fator agravante. As mazelas do Estado Burocrático e Patrimonialista na economia foram intensificadas pela aproximação excessiva entre a elite da Administração burocrática estatal e o empresariado, o que foi capaz de originar um ambiente incentivador da não competitividade. Sobre o tema, são preciosas as palavras de Eli Diniz, verbis:

O estreitamento dos vínculos entre elites estatais e empresariais em certos momentos no tempo e em determinadas agências burocráticas, sob os efeitos de um contexto não competitivo, gerou situações de intricado entrelaçamento de interesses e de subordinação do público ao privado.[2]

O Estado brasileiro é, frequentemente, lembrado por interferir demasiadamente nos mais distintos segmentos da economia, assumindo um papel muito mais amplo do que aquele que lhe seria comum na garantia da segurança, saúde, educação e na promoção da justiça. Sobre esta ingerência excessiva, são precisas as palavras de Alfredo Lamy, verbis:

O Estado insinuou-se em toda parte. De simples distribuidor normal de justiça e segurança, viu ampliar-se o domínio de suas atribuições e até a indústria e o comércio que, durante muito tempo, mantiveram sesse quase ‘direito divino’ de liberdade e independência, no espaço de alguns anos tiveram suas atividades controladas ou regulamentadas. Mais ainda, o Estado substitui-se aos seus súditos no desempenho das atividades produtivas.[3]

É nesse caótico cenário que exsurge a expressão Estado Gerencial, uma tradução da locução New Public Management. Na essência, ela revela um modelo de Estado que mira na atuação transparente, eficiente e com qualidade. Uma Administração voltada para o controle dos resultados com o apoio e a mais ampla participação da sociedade. Nas palavras de Cabral de Moncada, “o Estado não é uma essência platônica separada da sociedade civil (…) o Estado não se sobrepõe ao indivíduo nem à sociedade”.[4] Um Estado que inaugura uma atuação balizada não mais, exclusivamente, pela mera legalidade, mas, também, pela legitimidade. No dizer de André Saddy, o “Estado passou a depender, não somente da legalidade, mas, também, da legitimidade entendida esta como a conformidade de atuação do Estado à vontade popular, e da licitude, entendida como a submissão dos comportamentos aos valores morais prevalecentes no meio social”.[5] Nesse modelo de organização gerencial, não se está diante de um enfraquecimento do Estado. Ao revés, seu fortalecimento é fruto de uma eficaz atuação reguladora, bem como do crescimento do fomento à iniciativa privada. Chega-se à inexorável conclusão de que o Estado depende da colaboração dos particulares para o desempenho de atividades relevantes para a coletividade. Os particulares precisam do Estado como catalisador de suas ações, e não como um substituto ineficiente e descomprometido com a qualidade e eficiência. O súdito se torna cliente e a Administração promove um intenso diálogo com os destinatários de seus serviços.

As ideias contidas no citado Plano Diretor de 1995 implicou uma série de alterações normativas no nosso país, algumas de índole constitucional outras de nível legal. No âmbito constitucional, é de destaque a Emenda Constitucional nº 19 que, por exemplo, estimulou a celebração de contratos de gestão visando à ampliação da eficiência da Administração Pública, bem como a Emenda Constitucional nº 45, que inseriu como direito fundamental na Constituição a duração razoável do processo. A reconhecida deficiência estatal na prestação do serviço público da justiça só foi objeto de preocupação expressa pelo Constituinte em 2004, por meio da Emenda Constitucional nº 45, e em razão específica desse nítido movimento em direção ao incremento da qualidade nas atividades estatais. Uma mobilização para a evolução normativa que parte da premissa de que devemos esperar a prosperidade mais da sociedade do que do próprio Estado.[6]

As leis brasileiras também se adaptaram à nova realidade. Avançando na década de 1990 e entrando nos anos 2000, nos deparamos com o surgimento da Lei nacional de concessões (Lei nº 8.987/95), que viabiliza a prestação de serviços públicos por particulares, Lei das Parcerias Público-Privadas (Lei nº 11.079/04), que disciplina a execução de grandes empreendimentos e serviços por meio de um regime de cooperação entre o poder público e os particulares. As Leis que fomentam as OSs (Lei nº 9.637/98) e OSCIPs (Lei nº 9.790/99), também, remontam a este período de incremento do fomento público à inciativa privada que atua sem qualquer finalidade lucrativa. Leis de criação de agências de fomento, tais como a APEX-Brasil (Lei 10.668/03) e ABDI (Lei 11.080/04) corroboram o caminho das alterações legais com o escopo de se chegar à ampliação da eficiência estatal.

Nesse ambiente de transformação do Estado brasileiro em um Estado Gerencial, assistimos ao seu afastamento da execução direta de uma série de atividades. O Estado deixa de ser responsável pela produção e execução, assumindo uma “responsabilidade pela garantia” (Gewährleistungsverantwortung).[7] A título de ilustração, bancos estaduais foram vendidos, a Vale do Rio Doce teve seu controle acionário alienado, a Embratel foi desestatizada, rodovias foram transferidas à gestão privada, o monopólio na exploração e refino do petróleo deixou de existir. Em lugar de executar diretamente atividades econômicas em sentido estrito e de prestar serviços públicos, na maioria das vezes, de forma ineficiente, o Estado brasileiro passou a desempenhar uma função regulatória por intermédio de dezenas de agências reguladoras. Privatization brings regulation. E essa dinâmica teve como central base constitucional o princípio da subsidiariedade,[8] que tem sua raiz no princípio da livre iniciativa. O referido princípio está previsto na Constituição da República no art. 1º, IV, que o estatui como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, bem como no seu art. 170, que o entrevê como um dos fundamentos da ordem econômica. Na definição de Diogo de Figueiredo de Moreira Neto, o princípio da subsidiariedade consiste em:

Reconhecer a prioridade da atuação dos corpos sociais sobre os corpos políticos no atendimento de interesses gerais, só passando cometimentos a estes depois que a sociedade, em seus diversos níveis de organização, demandar sua atuação subsidiária. Este princípio aponta, assim, para a delegação social como forma de devolver à sociedade organizada todas as atividades que, não obstante serem de definido interesse público, não necessitem de tratamento político-burocrático nem exijam ordinariamente o emprego do aparelho coercitivo estatal.[9]

A intervenção estatal direta na economia por meio de empresas públicas e de sociedades de economia mista é pautada por um juízo discricionário do administrador, mas deve ser excepcional e entrincheirada pelos parâmetros estabelecidos pelo art. 173 caput da Constituição da República: imperativos da segurança nacional e relevante interesse coletivo. Segundo André Saddy, “a norma jurídica do art. 173 da Constituição brasileira de 1988 possui discricionariedade, mas também possui limites e uma série de técnicas de contenção”.[10]

Para uma apropriada exegese das expressões imperativos da segurança nacional e relevante interesse coletivo, o intérprete deve considerar as relevantes lições de Karl Engisch. É que, para ele, os conceitos vagos são dotados de uma zona de certeza (Begriffskern), que pode ser positiva ou negativa (negativen und positiven Anwendungsfälle), e uma zona intermédia ou de incerteza (Begriffshof), que configura o “halo do conceito”, revelando o espaço de dúvida quanto à identificação da hipótese descrita no texto normativo (zweifelhaften Anwendungsfälle).[11]

Por influência do Plano Diretor de 1995, o Estado mudou seu foco de atuação, mas não seria apropriado concluir que o Estado Gerencial é um Estado mínimo, um estado neoliberal. Nesse ambiente, mais relevante do que ser mínimo é ser eficiente. Somos contrários à equiparação do Estado Gerencial ao conceito de estado neoliberal ou de estado mínimo, especialmente porque a mudança de enfoque na atuação estatal, que cessa a execução direta de atividade para atuar como incentivador e regulador, não implica, necessariamente, a redução do tamanho e da força do estado.[12] Sob outro enfoque, o Estado contemporâneo assume funções adicionais que antes não integravam o seu catálogo de deveres. Sobre o tema, Diogo de Figueiredo Moreira Neto pontifica que:

os autores pós-modernos propõem como mais recente conceito de atividade estatal a realização dos direitos fundamentais. Com efeito, reconhece-se um triplo conteúdo técnico nos direitos fundamentais, correspondendo a uma tríplice missão a ser desempenhada pelo Estado para afirmá-los: a declaração, a garantia e a funcionalização desses direitos. (…) No que toca à terceira missão – a atividade de funcionalização – trata-se de um novo conteúdo das Constituições pós-modernas especificamente referido aos direitos fundamentais, que impõe ao Estado o dever jurídico de atuar no sentido de lograr a efetiva realização dos fins e dos valores constitucionais fundamentais.[13]

Em um ordenamento jurídico voltado para a preservação dos direitos fundamentais e da liberdade de iniciativa, os agentes econômicos devem ter a real possibilidade de criar, empreender e de, quando foro o caso, participar do processo de formação das regras que poderão interferir nas suas vidas. Há, assim, um nítido reconhecimento pela sociedade e pelo próprio Poder Público de que o Estado tem limites e que qualidade e eficiência são atributos mais comuns no âmbito da iniciativa privada do que no cenário público.

E essa incapacidade do Estado não é diferente em áreas de sua atuação primordial, tais como saúde e educação. Naquela, por exemplo, o índice de desenvolvimento do SUS (IDSUS) apontou, em 2011, que 93,8% dos municípios brasileiros tiveram nota abaixo de sete. Apenas seis municípios ficaram com nota acima de oito. Na área de educação, o resultado não é melhor. O IDEB, índice de desenvolvimento da educação básica, atestou em 2013 que apenas 20% dos municípios tiveram nota acima de 5,3. E nunca é demais lembrar que a captura do Estado por grupos privados podem fazer com que sejam perseguidos outros interesses que não aqueles que maximizam o bem-estar social. Segundo as palavras de Rodrigo Gouveia, “a independência dos organismos reguladores deve ser estabelecida relativamente à Administração Central, mas igualmente em face dos outros interesses, sobretudo em relação ao interesse dos fornecedores dos serviços de interesse geral”[14]. A pressão é maior para a pavimentação de uma rua ou para a construção de uma ponte do que para o investimento na formação dos profissionais de saúde, por exemplo. Assim, mesmo em relação a atividades essenciais, e a serem supostamente assumidas e realizadas pelo Estado, há um estímulo à ineficiência quando a responsabilidade pela sua execução remanesce sob a responsabilidade estatal.

Um modelo contemporâneo de governance não aposta todas suas fichas no dirigismo, mas no estímulo à sociedade civil para a cessação da ineficiência estatal. Cria-se um ambiente propício para uma “regulação baseada na libertação da Sociedade Civil de uma tutela estatal asfixiante”.[15] O Estado recebe, no dizer de Rolf Stober, “um mandato constitucional para apoiar o crescimento”.[16]

Esta evolução normativa destinada ao empoderamento de particulares, a fim de se materializar um modelo de Estado eficiente vem acompanhada de uma robusta preocupação estatal e apartidária com a estabilidade do comportamento do Poder Público. Sem previsibilidade quanto ao futuro não é possível ter um saudável ambiente de negócios apto a produzir riqueza. É que, conforme bem lembrado por Eugenio Rosa de Araújo, em recensão à clássica obra de Richard Posner “A Análise Econômica de Direito”, “as pessoas racionais baseiam suas decisões em suas perspectivas de futuro não em suas lamentações sobre o passado”.[17] Como exemplo dessa preocupação estatal, o ex-Ministro da Fazenda Joaquim Levy criou, no segundo semestre de 2015, um grupo de trabalho composto por autoridades do Governo Federal e por professores de Direito Administrativo[18] com o objetivo de que fossem criadas as mais diversas soluções legais para o estímulo à criação de um melhor ambiente de negócios em nosso país.

Contribuições do Direito Administrativo para o Aprimoramento do Ambiente de Negócios no Brasil.

O referido grupo, formado precipuamente por professores de Direito Administrativo, atuou em seis eixos principais. Como primeiro foco de atuação, o grupo fez um profundo estudo para o aperfeiçoamento da Lei de Licitações (Lei nº 8.666), na medida em muitos dos seus dispositivos estão ultrapassados e que inúmeros dos problemas de corrupção que estamos habituados a assistir decorrem de falhas graves no regramento do procedimento licitatório. Uma das medidas propostas foi a de aproximação do procedimento licitatório previsto na Lei nº 8.666 daquele previsto na Lei nº 10.520, Lei do Pregão, especialmente no que concerne à inversão das fases de habilitação e julgamento, com a inclusão da etapa recursal única ao final, o que implica inegável celeridade para o desfecho do procedimento.

Além disso, o projeto contemplava uma preocupação com o conteúdo do projeto básico e executivo e com a necessidade de sua conclusão previamente à abertura do certame, a fim de evitar pleitos espúrios de aditamento contratual e incertezas quanto à execução do que contratado. Fez-se, também, uma restrição às hipóteses em que poderá ocorrer a desconsideração da personalidade jurídica, com o escopo de evitar sua vulgarização indevida, na medida em que essa circunstância tem se revelado prejudicial ao pleno desenvolvimento de uma atividade empresarial. O projeto admite que sociedades estrangeiras sejam líderes dos consórcios em licitações, o que não é possível nos dias de hoje, medida que poderia incrementar a competição ampliando o número de competidores nas licitações brasileiras. Em relação às áreas necessárias à conclusão do empreendimento a serem desapropriadas ou que devam ser objeto de servidão administrativa, sua liberação se torna uma condição para a celebração do contrato pelo Poder Público. Dessa maneira, evita-se o impasse posterior à celebração do ajuste, decorrente de eventual inércia estatal na adoção de providências para a realização da desapropriação ou para a constituição da servidão. O projeto prevê, em contratos de valores mais elevados, a necessidade de menção no ajuste da forma de alocação do risco. Tal providência estimula que as próprias partes contratantes identifiquem quem deve assumir um determinado risco, o que pode variar de acordo com o tipo de contrato. Essa solução é muito mais condizente com a prática dos negócios do que qualquer previsão legal que transfira o risco para uma ou outra parte independentemente do objeto que foi contratado. Há, ainda, estímulo ao pagamento do contratado de forma variável de acordo com a eficiência na prestação do serviço, uma salutar tendência na legislação brasileira. O grupo de trabalho também sugeriu que os termos aditivos aos contratos firmados por particulares e a Administração só possam ser celebrados após a prática de atos visando à ampliação da transparência quanto a esta pretensão. Chegou-se à conclusão que os citados aditivos representam um mal necessário, mas que a transparência poderia dificultar sua utilização para fins ilícitos. Outra preocupação foi a de reduzir de noventa para trinta dias a possibilidade de a Administração atrasar o pagamento de suas obrigações contratuais e, ainda, possibilitar que, ultrapassado o aludido período de inadimplência, o contratado possa suspender unilateralmente as suas obrigações. Tal medida implica maior segurança ao contratado e reduz o valor das propostas de modo favorável ao poder público, haja vista que a certeza do pagamento se eleva.

Um segundo tema abordado pelo grupo de trabalho foi o concernente à criação de uma lei que disciplinasse o regime jurídico das agências reguladoras brasileiras. O modelo atual de regulação, em que há uma lei para cada agência criada, tem gerado insegurança jurídica e, em alguns casos, uma falta de compromisso com a técnica da regulação, especialmente, em razão da ocorrência do fenômeno da captura analisado por George Stigler[19] e da investidura de agentes políticos e não técnicos para os cargos de direção das agências. E, por conta dessas falhas normativas, ora a agência promove um discurso de forte tutela do consumidor, ora se movimenta em sentido diametralmente oposto visando a uma desproporcional tutela das sociedades empresárias que são por elas reguladas. O Estado não pode, a pretexto de ordenar uma atividade econômica, comprometer a liberdade de iniciativa do particular.

Nessa linha, a minuta de anteprojeto de lei elaborada pelo grupo de trabalho prevê requisitos rígidos para a nomeação de dirigentes das agências, de modo a evitar uma politização da escolha e a indicação de pessoas sem qualquer aderência no segmento da agência reguladora. No dizer de Sérgio Guerra, para que a regulação estatal funcione de maneira apropriada, “é necessária a separação entre regulador e governo, cujo fim é o de evitar a politização das decisões”.[20] A regulação precisa ser encarada como tema de Estado, a merecer uma decisão neutra, objetiva e técnica, e não como instrumento para materialização de política governamental. A imparcialidade do processo decisório da agência reguladora não impede que se adote um modelo de paternalismo libertário na linha da teoria nudge desenvolvida por Richard Thaler e Cass Sunstein.[21] A regulação poderá dar um “empurrãozinho” (nudge) no processo de escolha dos particulares, a fim de que as melhores decisões sejam tomadas. Tal conclusão decorre da acertada compreensão dos citados autores de que “nossas vidas são complicadas e que não podemos desperdiçar todo o nosso tempo pensando e analisando tudo”.[22] Paternalismo porque a escolha do particular é orientada e parcialmente controlada pelo Estado. Libertário porque o particular não é obrigado a seguir um caminho específico. A despeito da sugestão/orientação estatal, o indivíduo continua a ter liberdade para decidir.

Assim, a estrutura do organismo regulador deve ser plenamente condizente com os fins da regulação, que deverá satisfazer, da melhor forma possível, os anseios de todos os segmentos da sociedade por ela atingidos.[23] Previu-se, por exemplo, que o indicado tivesse uma experiência mínima de dez anos na área de atuação da agência, bem como que ele fosse submetido a uma banca de exame para a aferição do preenchimento de rigorosos requisitos para a investidura em cargo de direção na referida entidade regulatória. Tudo com o objetivo de evitar um excessivo apadrinhamento político e a prática da revolving doors, em que os dirigentes ora trabalham para o Estado, ora para aqueles atingidos pela regulação. Sob outro prisma, o texto também disciplina a tramitação de processos administrativos no âmbito das agências reguladoras. As regras sobre o processo administrativo na agência têm dois objetivos centrais: i) o de evitar que o organismo regulador profira decisões sem ouvir a sociedade ou quem melhor entende do tema controvertido, vale dizer, o destinatário da regulação,[24] e ii) o de evitar decisões inesperadas e capazes de instabilizar a concorrência no âmbito da atividade regulada. Além disso, o texto de anteprojeto veicula regras sobre a prestação de contas das agências reguladoras, a fim de evitar que uma má administração dos recursos orçamentários pudesse asfixiar o seu funcionamento e colocar em risco a regulação imparcial e técnica da referida atividade.

Como terceiro eixo de atuação, o grupo de trabalho buscou fomentar a aprovação do PLS 349 de 2015, um projeto de lei do Senador Antonio Anastasia e que tem como relatora a Sen. Simone Tebet. Este PL, cuja redação foi elaborada pelos membros do grupo de trabalho professores Carlos Ari Sundfeld e Floriano Peixoto de Azevedo Marques Neto, tem como objetivo precípuo promover alterações na Lei de Introdução às normas do Direito brasileiro capazes de estimular um processo decisório estatal mais estável, mais seguro e confiável. Com isso, haveria um aprimoramento no ambiente de negócios no Brasil. A título de exemplo, o projeto insere um artigo na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, antiga Lei de Introdução ao Código Civil, que determina que o administrador público estime as consequências práticas de suas decisões, bem como que ouça, por meio de consulta pública prévia, os diretamente afetados por um ato normativo a ser editado. Há, assim, uma preocupação com a adoção de um modelo de administração consensual, dialógica, uma Administração Pública que persegue o diálogo em lugar de se impor unilateralmente como autoridade. O administrador público passaria a ter de considerar as consequências de suas decisões, apresentando motivação suficiente que estime os efeitos sociais e econômicos dos seus atos. Nesse contexto, o Administrador ficaria obrigado a previamente considerar os efeitos negativos de um ato inválido, de modo a evitar danos anormais aos cidadãos afetados Outra novidade é a obrigatoriedade de a Administração fixar regras de transição quando tiver de criar novas normas jurídicas sobre uma determinada matéria. A Administração poderia, até mesmo, negociar com o particular a melhor solução para o amortecimento da transição. O projeto, também, prevê a diminuição da responsabilidade pessoal do agente público, a fim de que o administrador, apenas, responda pelas suas ações e omissões danosas quando a atuação for dolosa ou caracterizar erro grosseiro. A medida tem como propósito estimular uma atuação dos agentes menos temerária e mais imparcial. Outra meta do PLS 349/2015 é a de estimular a consulta pública prévia à edição de atos normativos, a fim de que os atos de efeitos genéricos tenham maior legitimidade democrática e possam contar com uma maior adesão da sociedade.

Um quarto enfoque dado pelo grupo de trabalho foi quanto à criação de uma disciplina normativa para o fomento de projetos estratégicos de infraestrutura. Um dos integrantes do grupo, professor Carlos Ari Sundfeld, elaborou um anteprojeto de lei instituindo o denominado Programa Público-Privado Avançado – PPP MAIS voltado para incrementar a parceria entre o Estado e a iniciativa privada. O objetivo foi o de permitir que o Estado pudesse adotar práticas avançadas de política setorial, de regulação, de estruturação, de liberação, de licitação, de contratação e de fomento, especialmente nos empreendimentos qualificados como de relevância nacional. A submissão de um projeto às regras do PPP + permite que ele seja tratado com prioridade por todos os agentes públicos, inclusive os de controle.

O texto desse anteprojeto de PPP+ contempla uma série de novos institutos que poderão revolucionar, no melhor dos sentidos, o ambiente de negócios estratégicos para o Brasil que demandem elevados investimentos de prolongada duração e por meio da utilização de uma contratação desburocratizada. Em linhas gerais, o texto prevê a criação de uma empresa estatal voltada para a estruturação de grandes projetos estratégicos para o país de iniciativa de qualquer ente da federação. Para tanto, a referida entidade, que poderá ser contratada com dispensa de licitação pela Administração Pública, terá competência para contratar serviços técnicos especializados de maneira mais adequada, garantidas a transparência e a disputa entre interessados por meio do processo administrativo denominado de colação. O enquadramento de um projeto de infraestrutura como estratégico será feito por um Conselho, denominado de Conselho Nacional da PPP+, e permitirá a incidência de regras mais eficientes e favoráveis à contratação, operação, estruturação e liberação do empreendimento.

O grupo de trabalho também se ocupou do tema do fomento empresarial. Hoje se tem, dentre os administrativistas brasileiros, plena consciência da necessidade de criação de uma disciplina legal para a delimitação do fomento estatal à inciativa privada que atue com finalidade lucrativa. Por incrível que possa parecer, ainda não existe, em nosso país, uma lei que aborde o tema no âmbito nacional. Projetos de grande porte demandam incentivos estatais e tudo é feito de forma amadora e com amparo em parâmetros, muitas vezes, pautados por critérios não muito transparentes ou mesmo republicanos. Consoante rememorado por José Vicente Santos de Mendonça, há, quanto ao tema do fomento público à iniciativa privada, profundas dúvidas e problemas em torno da sua duração, intensidade e quanto aos critérios objetivos a serem adotados para a sua concessão.[25] E a complexidade se eleva, na medida em que existem os mais diversos instrumentos para o fomento público. Ele pode ser fiscal, creditício, jurídico, econômico ou de outras naturezas. Faltam regras claras sobre os caminhos a serem trilhados pelo administrador publico que opte por fazer uso do fomento público como parte de sua política de governo.

O fomento deve ser planejado, submetido, caso possível, ao debate público[26] e ser garantido na extensão exata para deflagrar o processo produtivo e viabilizar a atividade econômica. Nunca deverá ser concedido por tempo excessivo ou em quantidade exagerada de modo a estimular a ineficiência. Quem muito ajuda, atrapalha e atrofia dificultando a inovação.

O maior problema da lacuna normativa quanto a essa matéria é que, hoje em dia, quando um governante fomenta um particular ou um grupo de sociedades empresárias na exploração de uma atividade econômica lucrativa, muito provavelmente ele se tornará réu em uma ação de improbidade ou popular, sob a suspeita de estar favorecendo indevidamente alguém. Isso decorre de uma ausência de regramento legal capaz de não deixar dúvidas de que o Estado e o empresário podem – e, em diversas ocasiões, devem – ser parceiros.

Outra preocupação do grupo de trabalho, esta o sexto eixo de atuação do GT, foi com a criação de uma espécie de fast track para a expedição de atos de consentimento pelo Estado brasileiro necessários para o desempenho de uma atividade empresarial. É inconcebível que uma sociedade empresária dependa de dezenas de consentimentos estatais para começar a funcionar e produzir riqueza. O Estado, que do ponto de vista do Direito Tributário assume praticamente o papel de sócio majoritário do empreendedor, não pode criar obstáculos desnecessários capazes de punir quem almeja produzir e crescer. O modelo de federação de nosso país, em que há um ambiente jurídico de necessária cooperação entre os distintos entes, acaba, por várias vezes, inviabilizando os negócios. Nesse contexto, seria ideal que os entes da federação (União, Estados e Municípios) criassem escritórios conjuntos destinados a facilitar a obtenção de licenças e a conferir celeridade aos requerimentos dirigidos por empreendedores para que possam exercer sua atividade de empresa, a fim de evitar que a burocracia desestimule o espírito empreendedor. Sob outro enfoque, é ultrapassado acreditar que o Estado é o único responsável pelo controle da qualidade e segurança de atividades realizadas por particulares. Hoje em dia, os recursos tecnológicos são capazes de propiciar uma avaliação da qualidade de serviços pelos usuários em tempo real, e isso deve substituir grande parte das licenças. No caso do Uber, por exemplo, a avaliação dos clientes gera uma qualidade muito maior do serviço do que a daquele prestado por táxis comuns, cujo exercício da atividade é, supostamente, fiscalizado pelo Poder Público.

Para uma drástica redução da burocracia estatal, que, infelizmente, ainda é uma realidade no nosso modelo de federação em que as competências são repartidas entre os Municípios, Estados e a União, também é imprescindível a adoção de mecanismos de incentivo à ampliação da transparência na atuação estatal e mecanismos de accountability em que o administrador é avaliado por rankings de desempenho.

Todas as abordagens feitas pelo grupo nas suas mais diversas áreas de estudo partiram da premissa de que o Direito Administrativo não deve encarrar contratações ordinárias da Administração da mesma forma que os ajustes por ela promovidos de elevada envergadura e complexidade. Na linha do que defendido por Carlos Ari Sundfeld, não se pode confundir o DAC com o DAN. O Direito Administrativo dos Clipes (DAC) caracteriza-se pelo seu aspecto burocrático, por não agir pautado pela busca de resultados, por não assumir prioridades e por desconfiar dos particulares. Já no caso do Direito Administrativo dos Negócios (DAN), há um eficaz gerenciamento da escassez e dos recursos, o que se materializa por meio de um maior informalismo nos ritos, estimula-se a ação do administrador, bem como a prática de soluções rápidas e consensuais que sejam fruto de um diálogo entre as partes envolvidas.[27] A autofiscalização ou autoresponsabilidade empresarial, por exemplo, é, nesse contexto, medida a ser estimulada. Tal como defendido por Rolf Stober:

toda empresa tem de ter, a longo prazo, um interesse concorrencial e de marketing, no sentido de que as suas instalações, equipamentos, locais de produção e locais de venda se encontram numa situação irrepreensível e de que os seus produtos e serviços satisfazem elevadas exigências de qualidade.[28]

Sob outro enfoque, o Estado deve adotar um comportamento previsível e evitar alterações normativas inesperadas e ofensivas à segurança jurídica. O êxito de um país passa pela confiabilidade nos atos estatais. Suas medidas devem ser coerentes, lógicas e, sobretudo, voltadas para o combate da ineficiência. Sem confiança do indíviduo na atuação estatal, não há ambiente para o desenvolvimento de operações empresariais de elevada complexidade, e nem mesmo para a criação de riqueza. Daí a necessidade de o Direito Administrativo se ocupar de temas que possam auxiliar nessa difícil tarefa de mudança radical no escopo da atuação estatal. Esse “progresso normativo”, que tem origem na mudança das regras e princípios jurídicos com o propósito de estimular o crescimento econômico, é medida urgente e que se impõe, a fim de que o ânimo de empreender não seja aniquilado por um paternalismo que nada tem de libertário.

É cediço que o Direito tem limites e que soluções para a superação de crises ou dificuldades a serem enfrentadas por uma determinada sociedade vão muito além da criação de regras e princípios. Em acertada avaliação de Sérgio Guerra, “a realidade econômica e tecnológica não pode ser explicitada completamente em normas; dependem, basicamente, da realidade social e econômica do momento”.[29] Contudo, o aprimoramento do ordenamento jurídico por meio de mudanças capazes de originar um estável ambiente de negócios pode amortecer os contratempos e pavimentar um modo de agir mais eficiente e próspero, medidas indispensáveis para o nosso Estado e a sociedade brasileira. Por mais que a identificação do interesse público comum seja algo difícil de ser compreendido em uma sociedade plural e complexa, é uníssona a compreensão que toda e qualquer sociedade só consegue se desenvolver em termos políticos, econômicos e sociais diante de um arcabouço jurídico-normativo justo, seguro e estável.[30] E, nessa altura, o Direito Administrativo pode oferecer uma expressiva contribuição criando regras mais simples, transparentes, estáveis, indutoras de um ambiente concorrencial e que sejam capazes de materializar as condições necessárias para a universalização do mínimo existencial econômico (wirtschaftliches Existenzminimum).[31][32]

Conclusões

Apresento abaixo algumas das principais ideias defendidas ao longo deste texto:

1) O Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado de 1995 veicula uma reluzente preocupação com a transformação do Estado brasileiro, um Estado patrimonialista e burocrático, em um Estado Gerencial. Há um nítido reconhecimento de que as crises pelas quais o Brasil passou, também, decorrem de uma crise no modelo de Estado adotado. Essa mudança de paradigma é apartidária, tem início em 1995 e ainda não se exauriu. O Estado brasileiro vem alterando substancialmente seu foco de atuação, na medida em que se afasta da execução direta de uma série de atividades e assume uma função de incentivador e regulador da atividade econômica. Contudo, não seria apropriado concluir que o Estado Gerencial é um Estado mínimo, um estado neoliberal. É que é mais relevante ser eficiente do que ser mínimo.

2) Em um ordenamento jurídico como o brasileiro, que é voltado para a preservação dos direitos fundamentais e da liberdade de iniciativa, os agentes econômicos devem ter a real possibilidade de criar, empreender e de, quando foro o caso, participar do processo de formação das regras que poderão interferir nas suas vidas.

3) Um modelo contemporâneo de governance não aposta todas suas fichas no dirigismo, mas no estímulo à sociedade civil para a cessação da ineficiência estatal. O ambiente propício ao crescimento e ao incremento da riqueza é aquele em que a sociedade civil tem liberdade para agir, inovar e produzir e o Estado, por sua vez, atua no seu relevante papel de ordenador, árbitro, mediador, pacificador ou, até mesmo, de mero espectador.

4) Estamos presenciando, no Brasil de hoje, uma manifesta evolução normativa destinada ao empoderamento de particulares, a fim de se materializar um modelo de Estado eficiente e que vem acompanhada de uma robusta preocupação estatal e apartidária com a estabilidade do comportamento do Poder Público. Sem previsibilidade quanto ao futuro não é possível ter um saudável ambiente de negócios apto a produzir riqueza.

5) A dogmática do Direito Administrativo pode auxiliar, sobremaneira, na construção dos alicerces para uma segura e revolucionária base normativa destinada ao aprimoramento do ambiente de negócios em nosso país. É necessário termos regras mais simples, transparentes, estáveis, indutoras de um ambiente concorrencial e que sejam capazes de materializar as condições necessárias para a universalização do mínimo existencial econômico. E essas mudanças podem atingir as mais diversas áreas de atuação do Estado brasileiro. A título de ilustração, um grupo de trabalho criado pelo Ministério da Fazendo e integrado majoritariamente por professores de Direito Administrativo propôs, ao final de 2015, expressivas modificações em nosso ordenamento que, acaso aprovadas pelo Poder Legislativo, descortinarão um novo e alvissareiro horizonte. Dentre as medidas propostas, são de destaque: i) o aperfeiçoamento pontual da Lei de Licitações (Lei nº 8.666); ii) a criação de uma lei nacional que discipline, de maneira uniforme, o regime jurídico das agências reguladoras brasileiras; iii) a promoção de alterações na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro visando à melhoria do funcionamento da Administração Pública e ao aperfeiçoamento da relação Estado-cidadão; iv) a criação de uma disciplina normativa para o fomento de projetos estratégicos de infraestrutura; v) a elaboração de uma lei nacional que regule o fomento empresarial à iniciativa privada com fins lucrativos; vi) a implementação de um sistema de fast track para a expedição mais célere possível de atos de consentimento pelo Estado brasileiro.

 

NOTAS_______________________

[1] Confira-se WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. 2ª ed. São Paulo: Pioneira. 2005.

[2] DINIZ, Eli. A reforma do Estado: uma nova perspectiva analítica. In: Política, ciência e cultura em Max Weber. COELHO, Maria Francisca Pinheiro; BANDEIRA, Lourdes, e MENEZES, Marilde Loiola de (Orgs.). Brasília: editora da UNB, 2000, pp. 140-141.

[3] LAMY FILHO, Alfredo. O Estado empresário. In: Estudos em homenagem ao prof. Caio Tácito. DIREITO, Carlos Alberto Menezes (Org.). Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 34.

[4] MONCADA, Luiz S. Cabral de. Autoridade e Liberdade na Teoria do Acto Administrativo. Contributo Dogmático. Coimbra: Coimbra editora, 2014, p. 13 e 83.

[5] SADDY, André. Limites e Técnicas de Contenção à Intervenção Direta do Estado Brasileiro na Economia. In: Estudos em homenagem ao professor Marcos Juruena Villela Souto. Belo Horizonte: Forum, 2015, p. 74.

[6] No dizer de Cabral de Moncada, “o constitucionalismo norte-americano pouco espera do Estado e tudo espera de uma Sociedade Civil viva e próspera”. MONCADA, Luiz S. Cabral de. Autoridade e Liberdade na Teoria do Acto Administrativo. Contributo Dogmático. Coimbra: Coimbra editora, 2014, p. 109.

[7] A Referida expressão foi utilizada pelo Tribunal Constitucional alemão. BVerfGE 108, 370.

[8] Na perspectiva de José Vicente Santos de Mendonça, o princípio da subsidiariedade não tem, no âmbito econômico, uma dimensão de princípio constitucional, sendo definido por uma diretriz político-administrativa de organização do Estado. Nas palavras de José Vicente, “Uma boa razão para que a subsidiariedade econômica não seja tida como princípio constitucional: o mundo muda, e, nessa mudança, pode haver suficiente consenso a favor de maior grau de intervenção estatal. (…) qual o sentido de se defender um princípio constitucional que, no fundo, não representa garantia real contra investidas estatais?” MENDONÇA, José Vicente Santos de. Direito Constitucional Econômico. A Intervenção do Estado na Economia à Luz da Razão Pública e do Pragmatismo. Belo Horizonte: Forum, 2014, p. 271.

[9] MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Administração Pública Não-Estatal e Descentralização Social. (Um estudo de caso: lei federal de gerenciamento de recursos hídricos). In: Estudos em homenagem ao prof. Caio Tácito. DIREITO, Carlos Alberto Menezes (Org.). Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 186.

[10] SADDY, André. Limites e Técnicas de Contenção à Intervenção Direta do Estado Brasileiro na Economia. In: Estudos em homenagem ao professor Marcos Juruena Villela Souto. Belo Horizonte: Forum, 2015, p. 77.

[11] ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 7. Ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1996.

[12] Estamos alinhados com o pensamento de Cabral de Moncada de que o liberalismo radical e excessivo pode ser maléfico: “O liberalismo radical é uma utopia incompatível com a vida em sociedade e o modelo da concorrência livre não é mais do que a aplicação do princípio darwiniano da struggle for life à atividade económica e social com consequências potencialmente desintegradoras da vida social”. MONCADA, Luiz S. Cabral de. Autoridade e Liberdade na Teoria do Acto Administrativo. Contributo Dogmático. Coimbra: Coimbra editora, 2014, p. 125.

[13] MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Ensaio sobre o resultado como novo paradigma do Direito Administrativo. In: Direito Administrativo. Estudos em homenagem a Francisco Mauro Dias. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 5.

[14] GOUVEIA, Rodrigo. Os Serviços de Interesse Geral em Portugal. Coimbra: Coimbra editora, 2001, p. 42.

[15] MONCADA, Luiz S. Cabral de. Autoridade e Liberdade na Teoria do Acto Administrativo. Contributo Dogmático. Coimbra: Coimbra editora, 2014, p. 131.

[16] STOBER, Rolf. Direito Administrativo Económico Geral. Fundamentos e Princípios. Direito Constitucional Económico. Lisboa: Universidade Lusíada Lisboa editora, 2008, p. 61.

[17] ARAUJO, Eugênio Rose de. Recensão à obra El Análisis del derecho de Richard Posner – Capítulos I e II. In: Revista do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Nº 57, jul/set de 2015, p. 154.

[18] O Grupo de Trabalho foi criado pela Portaria MF nº 640 de 11/08/2015 e teve como integrantes o Secretário de Acompanhamento Econômico (SEAE) Paulo Guilherme Farah Corrêa, o Secretário-Executivo Adjunto do Ministério da Fazenda Dr. Fabrício do Rozario Valle Dantas Leite e os professores Carlos Ari Sundfeld, Egon Bockmann Moreira, Flávio Amaral Garcia, Rafael Valim, Floriano Peixoto de Azevedo Marques Neto e Valter Shuenquener de Araujo.

[19] Confira-se o famoso artigo de Stigler de Chicago intitulado Theory of Economic Regulation de 1971. Disponível em: http://www.ppge.ufrgs.br/giacomo/arquivos/regulacao2/stigler-1971.pdf. Acesso em 25/04/2016.

[20] GUERRA, Sérgio. Pós-modernidade e direito administrativo: uma releitura obrigatória. In: Direito Administrativo – Estudos em Homenagem ao Professor Marcos Juruena Villela Souto. Belo Horizonte: Fórum, 2015, p. 616.

[21]THALER, Richard H.; SUNSTEIN, Cass R.. Nudge: Improving Decisions About Health, Wealth, and Happiness. New York: Penguin, 2009.

[22] Tradução livre da seguinte passagem: “our lives are complicated, and we can’t spend all our time thinking and analyzing everything.” THALER, Richard H.; SUNSTEIN, Cass R.. Nudge: Improving Decisions About Health, Wealth, and Happiness. New York: Penguin, 2009, p. 22.

[23] No dizer de Rodrigo Gouveia, “Os organismos reguladores devem ter uma estrutura adequada à prossecução dos seus objetivos e que espelhe os princípios sobre os quais deve assentar a regulação, designadamente a independência desses organismos, a melhoria da eficiência econômica dos sectores e a correção dos desequilíbrios causados pelo funcionamento do mercado, tendo sempre em atenção os diversos interesses em jogo”. GOUVEIA, Rodrigo. Os Serviços de Interesse Geral em Portugal. Coimbra: Coimbra editora, 2001, p. 47.

[24] O Estado não pode esquecer que as pessoas destinatárias da regulação são as que melhor compreendem o funcionamento do seu mercado e não podem, portanto, ser esquecidas. No dizer de José Vicente, “processos de baixo para cima são melhores do que os de cima para baixo, pois há informação derivada de know how que pode ser usada – informação que o Poder Público desconhece”. MENDONÇA, José Vicente Santos de. Direito Constitucional Econômico. A Intervenção do Estado na Economia à Luz da Razão Pública e do Pragmatismo. Belo Horizonte: Forum, 2014, p. 435.

[25] MENDONÇA, José Vicente Santos de. Direito Constitucional Econômico. A Intervenção do Estado na Economia à Luz da Razão Pública e do Pragmatismo. Belo Horizonte: Forum, 2014, p. 349.

[26] José Vicente também sustenta que o plano de fomento público deveria, se possível, ser submetido ao debate público. MENDONÇA, José Vicente Santos de. Direito Constitucional Econômico. A Intervenção do Estado na Economia à Luz da Razão Pública e do Pragmatismo. Belo Horizonte: Forum, 2014, p. 411.

[27] SUNDFELD, Carlos Ari. Direito Administrativo para Céticos. 2ª edição ampliada. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 147-148.

[28] STOBER, Rolf. Direito Administrativo Económico Geral. Fundamentos e Princípios. Direito Constitucional Económico. Lisboa: Universidade Lusíada Lisboa editora, 2008, p. 17.

[29] GUERRA, Sérgio. Pós-modernidade e direito administrativo: uma releitura obrigatória. In: Direito Administrativo – Estudos em Homenagem ao Professor Marcos Juruena Villela Souto. Belo Horizonte: Fórum, 2015, p. 620.

[30] Segundo as palavras de Cabral de Moncada, “A Sociedade Civil já não é una e simples mas multiforme e complexa e o interesse comum cada vez mais uma miragem. A Administração ressente-se obviamente da dificuldade de actuar neste contexto. (…) É preciso reformular a legitimidade democrática nas sociedades plurais, multiculturais, diferenciadas e pós-tradicionais de hoje pois que já não existe uma legitimidade democrática absoluta de que uma única instância estatal seja a titular exclusiva. (…) A característica principal das actuais sociedades democráticas é assim a ‘poliarquia’ baseada não apenas no poder político estatal mas também no que resulta de uma classe média forte, de grupos sociais activos e instituições independentes, da economia de mercado e da liberdade de imprensa. Tudo isto gera uma dispersão horizontal do poder favorável a freios e contrapesos que impedem a respectiva concentração e favorecem o equilíbrio.” MONCADA, Luiz S. Cabral de. Autoridade e Liberdade na Teoria do Acto Administrativo. Contributo Dogmático. Coimbra: Coimbra editora, 2014, p. 153 e 165.

[31] No mesmo sentido, Rolf Stober defende que a desregulação deve ter como meta “acabar com ingerências anti-mercado na concorrência, bem como tornar o direito mais simples, mais transparente, mais efectivo e mais facilmente perceptível”. STOBER, Rolf. Direito Administrativo Económico Geral. Fundamentos e Princípios. Direito Constitucional Económico. Lisboa: Universidade Lusíada Lisboa editora, 2008, p. 37.

[32] A expressão “mínimo existencial econômico” é fruto de tradução literal das palavras wirtschaftliches Existenzminimum utilizadas pelo Tribunal Constitucional alemão. BVerfGE 84, 133.