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Sistema de proteção da mulher em situação de violência doméstica

9 de agosto de 2021

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A discussão acerca das desigualdades entre homens e mulheres, como sabemos, não é recente, contrario sensu, remonta aos gregos, desde a antiguidade. Acreditava-se que a mulher era um ser inferior na escala metafísica que dividia os seres humanos, e, por isso, os homens detinham o direito de exercer a vida pública. Às mulheres, sempre foi reservado um lugar de menor destaque. Seus direitos e seus deveres estavam sempre voltados para a criação dos filhos e os cuidados do lar, portanto, para a vida privada.

O processo de “fabricação de machos e fêmeas” desenvolve-se por meio da escola, família, igreja, amigos, vizinhança e veículos de comunicação em massa. Sendo assim, aos homens, de maneira geral, são atribuídas qualidades referentes ao espaço público, domínio e agressividade. Já às mulheres foi dada a insígnia de “sexo frágil” pelo fato de serem mais expressivas (afetivas, sensíveis), traços que se contrapõem aos masculinos e, por isso mesmo, não são tão valorizados na sociedade.

Para AZEVEDO, as situações de violência contra a mulher resultam, principalmente, da relação hierárquica estabelecida entre os sexos, sacramentada ao longo da história pela diferença de papéis instituídos socialmente a homens e mulheres, fruto da educação diferenciada.

Evento histórico marcante para ruptura dessa concepção foi a II Guerra Mundial, em que os homens se ausentaram de seus lares para lutar nos campos de batalhas. Com isso, a mulher conquistou maior espaço na sociedade, provando ser capaz de fazer as mesmas atividades que antes eram exclusivamente executadas pelos homens.

Para SINA (2005, p. 23 e 24), esse lamentável conflito despertou nos Estados Unidos uma nova realidade: como milhares de homens foram deslocados para o palco das batalhas, na Europa, as mulheres tomaram as rédeas da produção, nas linhas de montagem das fábricas. É famosa a expressão We can do it, usada pelas operárias, orgulhosas de dar conta do recado onde quer que fosse.

Desde 1975, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) instituiu o Ano Internacional da Mulher, a condição feminina passou por profundas transformações. Muitas lutas foram travadas pelo movimento de mulheres, internacional e nacionalmente falando, para mudar sua situação de subordinação.

Dos instrumentos regionais dos quais o Brasil é signatário, a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher de 1994 destaca-se pelos importantes desdobramentos que teve para a legislação nacional de enfrentamento à violência contra as mulheres que, aliás, serve como guia para ação dos Estados Latino-americanos e Caribenhos.

No ponto, a Constituição brasileira proíbe a discriminação contra as mulheres ao definir em seu Art. 3° como objetivo da República promover o bem de todos(as), sem preconceito de sexo, raça, cor e idade, entre outros e, no Art. 5°, prevê que homens e mulheres são iguais em seus direitos e obrigações.

O País dispõe ainda de leis diretamente destinadas a garantir os direitos de mulheres, além de outras mais amplas que também impactam positivamente em suas vidas.

Das leis direcionadas às mulheres, são mais numerosas aquelas que se concentram no enfrentamento à violência. Em relevo, a Lei n° 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, a mais notória nesta temática, que criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.

Esta lei, a princípio, protegia apenas as mulheres. Hoje, no entanto, pode ser também aplicada, por analogia, para a proteção de homens que sofrem agressão no ambiente familiar. Além disso, em novel alteração promovida pelo Legislativo brasileiro, foi incluída, também, a identidade de gênero, como forma de atender aos indivíduos transgêneros identificados com o sexo feminino.

Mais recentemente, foi sancionada no Brasil a Lei n° 13.104/2015, Lei do Feminicídio, instituindo nova modalidade de homicídio qualificado que prevê como crime hediondo o assassinato de mulheres por razões da condição de sexo feminino, ocorridos em caso de violência doméstica e/ou familiar, menosprezo ou discriminação à condição de mulher.

Apesar do aparato legislativo, é imprescindível que sua aplicação se efetive de modo condizente às diferentes formas de violência sofridas por mulheres em função de seu pertencimento étnico-social.

Resultados, avanços e desafios retratados por dados estatísticos mostram importantes progressos na garantia dos Direitos Humanos das mulheres. Entretanto, ainda insuficientes quando se fala em equidade e igualdade de oportunidades, mormente porque os direitos humanos da mulher e da menina fazem parte, de forma inalienável, integral e indivisível, dos direitos humanos universais.

A participação plena e igualitária da mulher na vida política, civil, econômica, social e cultural em nível regional, nacional e internacional e a erradicação de todas as formas de discriminação baseada no sexo são objetivos prioritários da comunidade nacional e internacional.

A realidade em todo o mundo, porém, é que a situação da mulher está longe de ser igualitária à do homem, destoando das premissas básicas dos direitos humanos que primam pela igualdade plena e pela não-discriminação entre os sexos.

Mesmo assim, é de se reconhecer que a discriminação contra a mulher está recebendo, gradativamente, o nível de atenção que merece, em relevo os mecanismos principais para a promoção e a proteção dos direitos humanos das mulheres.

Todavia o combate à violência contra a mulher perpassa pela promoção do ensino direcionado a todos e, sobretudo aos que estão em formação, com a conscientização de que homens e mulheres merecem igual respeito e consideração. Só o distanciamento da cultura patriarcal permitirá erradicar a violência contra as mulheres. Isto quer dizer que homem e mulher devem desfrutar dos mesmos direitos e liberdades em plena equidade e sem nenhuma distinção adversa por qualquer motivo.

Notas___________________________

1 AZEVEDO, Maria Amélia. Mulheres espancadas: a violência denunciada. São Paulo: Cortez, 1985.

2 SINA, Amalía. “Mulher e trabalho: o desafio de conciliar diferentes papéis na sociedade”. São Paulo: Saraiva, 2010.