Um problema que nos envergonha como brasileiros e cidadãos: ter um dos piores sistemas prisionais do mundo. Até quando aguentaremos?

14 de janeiro de 2014

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Superlotação, violência generalizada, déficit de 240 mil vagas, corrupção sistematizada, privilégios, agressões diversificadas aos direitos humanos, ilegalidades de todos os tipos e tamanhos. O sistema penitenciário brasileiro está em crise já tem algum tempo e a situação do Maranhão com assassinatos em massa em presídios é a prova mais recente disso. O governo há tempos olha tudo e não toma providências e a questão que envolve 550 mil presos do Brasil de hoje é grave e beira o absurdo. O editorial da revista Justiça & Cidadania, edição 160, escrito por Orpheu Salles Santos já vislumbrava isso. Agora, diante de tantas críticas, pressão internacional o governo tenta recuperar o tempo perdido.  E resolve incluir no Regime Diferenciado de Contratações Públicas, – feito inicialmente para facilitar a construção de obras da Copa do Mundo, Copa das Confederações e Olimpíadas, e, posteriormente obras de infraestrutura – a construção e reforma de presídios e outros estabelecimentos penais no país. Ele simplifica a Lei de Licitações e pretende acelerar obras em todo o país. O sistema carcerário no Brasil pode, desta forma, se beneficiar com a construção de unidades prisionais necessárias e urgentes e, melhor ainda, sem demoras e burocracias.

Em dezembro de 2011, o Ministério da Justiça fez convênios para a construção de presídios e unidades prisionais com estados e municípios. Até agora, nada foi feito e nenhuma vaga nova surgiu. O governo federal tem baixíssimo nível de execução orçamentária neste setor vital para o país. A chamada reestruturação e modernização do sistema criminal e penitenciário no Brasil – alardeada em propaganda pelo governo – não passa de uma falácia: houve um desembolso de apenas 4% de uma verba de R$303 milhões previstos, ou seja, apenas R$12 milhões. Outra ação relacionada à consolidação do sistema penitenciário, gastaram-se apenas R$18 milhões de uma verba prevista de R$43 milhões.

Um dos mais graves problemas é a superlotação. 40% dos 550mil presos no Brasil aguardam julgamento e, enquanto isto, não acontece, abarrotam as celas de delegacias de polícia, todas superlotadas e onde acontece todo tipo de crime e afronta aos direitos e à dignidade do ser humano. Atualmente há 101 contratos firmados com governos estaduais, prevendo a abertura de 48 mil vagas nos presídios até o fim de 2014, em mais de 100 cadeias públicas e presídios femininos.

O Programa Nacional de Apoio ao Sistema Prisional tem uma dotação orçamentária de R$1,2 bilhão, dos quais 73% estão prontos, segundo o governo, para serem gastos, mas isso só pode ser feito à medida que as obras começarem. Mas, apenas 30 dos 101 contratos estão numa fase burocrática que permitem sua inclusão no Regime Diferenciado de Contratações Públicas. O que significa dizer que mesmo com a medida tomada – facilitar a contratação para construção e reforma de unidades prisionais – não se pode ser nada otimista. Sete presídios federais deverão ficar prontos só em meados de 2015. Isto, se tudo der certo e se no âmbito dos governos federal e estaduais, os vários trâmites burocráticos não entravarem a finalização das obras.

Equipes do Conselho Nacional de Justiça costumam realizar inspeções regulares em delegacias e presídios e promovem relatórios permanentes mostrando uma situação prisional degradante, crítica e caótica. O sistema prisional do Brasil é um dos piores do mundo. Não apenas isso: é um dos mais degradantes do planeta. Um verdadeiro inferno em que os abusos continuam à revelia da lei, onde grupos de detentos recebem privilégios à margem da sociedade, abusam de outros presos e suas famílias, agem contra a sociedade o tempo todo, matam e assassinam integrantes de grupos rivais. E a grande maioria enfrenta uma situação prisional que afronta os direitos da pessoa, que não leva a qualquer possibilidade de recuperação, ao contrário, que estimula a mais crimes, mais violência e mais degradação.

E o pior de tudo é que os governos não têm sensibilidade para enxergar que esse é um dos mais graves problemas brasileiros. Com 50% das verbas públicas utilizadas para construir estádios e outras obras para a Copa do Mundo de Futebol, o Brasil resolveria 70% de seus problemas prisionais e conta-se aqui não apenas a questão de abertura de milhares de vagas em seu sistema carcerário, mas também a questão de instalação de programas que possam diminuir em larga escala a sucessão de crimes e violações de direitos que assolam as prisões do país, põem a sociedade em pânico, assustam o mundo civilizado e denigrem a imagem do Brasil. Aqui, como em diversos setores da vida pública, administrativa e executiva do país, uma reformulação geral é preciso.

A Justiça brasileira – historicamente eivada de grandes mestres e renomados juristas, pensadores e gestores de ações relevantes – poderia ser chamada pelo governo para formulação de um plano estratégico de ação imediata para livrar o país de um de seus piores males e que ameaçam seu futuro em curto, médio e longo prazo: ter um dos mais caóticos e criminosos sistemas prisionais e carcerários do mundo.

Do jeito que está, teremos, infelizmente, a chance de ver coisas muito, mas muito piores do que o país assiste indignado no Maranhão.

Afinal, até quando aguentaremos?