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Os avanços do novo CPC: Celeridade, segurança jurídica e valorização da advocacia

27 de novembro de 2015

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Marcus ViniciusFalar das conquistas do novo Código de Processo Civil (CPC) em breves termos é tarefa desafiadora. As inovações foram tantas e de tamanha representatividade que o objetivo aqui é apenas o de apontar três ordens de modificações consideradas de relevância destacada para a compreensão da nova sistemática processual civil brasileira.

Os objetivos que guiaram a elaboração do novo Codex, intimamente vinculados às expectativas da sociedade em relação à Justiça, deram origem a três ordens de inovações de ressaltada importância, que podem ser resumidas pela (i) garantia da segurança jurídica, (ii) busca da celeridade processual e da efetiva resolução dos conflitos e (iii) valorização e reconhecimento da advocacia como função essencial à Justiça.

O contexto social e político que permeia a aprovação do novo CPC explica o caráter democrático de suas inovações. Se a Carta de 1988 recebeu o epíteto de Constituição Cidadã, o novo código pode ser reconhecido como o Código de Processo Civil Cidadão. Diferentemente dos códigos de 1939 e de 1973, ambos gestados e aprovados em períodos ditatoriais no Brasil, o novo CPC é o primeiro aprovado sob a vigência de um regime democrático e resultado de participação social visando à adequação das normas à realidade do País.

Essa característica explica em grande parte o enfoque principiológico trazido pelo novo diploma, o mandado expresso de interpretação de seus institutos à luz da Constituição Federal, bem como o desapego ao formalismo e a busca por decisões judiciais que efetivamente solucionem a lide e permitam a convivência em sociedade de forma pacífica e com vistas a garantir a dignidade e a liberdade das pessoas e grupos.

No campo da segurança jurídica, o diploma trouxe importantes avanços. Em seu art. 489, § 1o, inciso V, ao instituir requisitos específicos para a fundamentação das decisões judiciais, o novo CPC exige a exposição dos fundamentos determinantes na invocação de precedentes ou enunciados de súmula, demonstrando que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos. No mesmo sentido, o inciso VI do mesmo artigo requer a observância das súmulas, jurisprudência ou precedentes invocados pela parte e a justificação nos casos de sua não aplicação.

Ainda no quesito segurança jurídica, o novo CPC inovou com a exigência de estabilidade, integridade e coerência na formação da jurisprudência brasileira (art. 926), prevendo a enunciação de súmulas pelos tribunais, correspondentes à sua jurisprudência dominante.

Outra inovação relevante nesse sentido foi o incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 976), que busca unificar o entendimento dos tribunais a respeito de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito, bem como o risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica. Além disso, o incidente agiliza consideravelmente a decisão de processos idênticos.

Após a instauração e o julgamento do incidente, confere-se a mais ampla publicidade (art. 979, caput), exigindo-se a indicação dos fundamentos determinantes da decisão e os dispositivos normativos relacionados (art. 979, § 2o). A intenção aqui é conferir divulgação e facilitar a identificação das teses resolvidas com o incidente referido, mas o dispositivo também pode ser entendido como parte do anseio geral do novo código de conferir maior destaque às teses jurídicas em disputa, valorizando a jurisprudência. A própria racionalidade jurídica deve ser construída conforme as teses, mais que conforme aos casos.

O novo Código também trouxe importantes inovações com vistas a garantir a celeridade processual e a efetiva resolução dos conflitos. Essas modificações buscam conferir efetividade à garantia constitucional prevista no art. 5o, inc. LXXVIII, da Carta Magna: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Em respeito ao mandado constitucional, o novo diploma buscou prever os referidos meios, a fim de tornar concreta e factível a aspiração de toda a sociedade por uma Justiça mais célere e efetiva. Importante modificação nesse sentido foi a instituição da primazia da decisão de mérito, isto é, a pesada e dispendiosa máquina judicial não pode ser movimentada para, ao fim e ao cabo, proferir decisão meramente formal, que não soluciona a pretensão da parte autora. O processo deve priorizar a instrumentalidade das formas e a simplificação procedimental, a fim de que ele seja meio efetivo de se alcançar uma solução para o conflito levado ao Judiciário. Essa é a inteligência do art. 6o do novo Codex: “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”.

Para além disso, o novo CPC, ao estimular a mediação e a conciliação (art. 3o), busca retirar das partes processuais uma postura passiva, que aguarda a resolução de seus conflitos por meio da decisão de um terceiro externo à relação processual – o juiz – para conferir a elas o lugar de sujeitos ativos na construção conjunta da melhor decisão para a lide. Essa mudança cultural no processo implica maior respeito às decisões, pois as partes se sentem corresponsáveis por sua construção, reduzindo o nível de insatisfação com o Judiciário e o retorno a ele em razão de causas mal resolvidas.

O princípio da instrumentalidade das formas também ganhou peso nas recentes normativas. O novo CPC se preocupa com esse princípio ao determinar, em diversos casos, a intimação do advogado sobre o vício processual para que sane o defeito e dê prosseguimento ao processo, bem como ao mitigar a preclusão no tocante às decisões interlocutórias, de forma que o profissional da advocacia não mais deverá recorrer de quaisquer decisões pouco importantes do magistrado, as quais poderão ser impu­gnadas em outro momento. Além disso, orientado pela racionalização dos procedimentos, o novo código também institui a possibilidade de intimação em nome da sociedade de advogado.

Nessa esteira, sob uma ótica global das alterações instituídas pelo novo diploma, é possível afirmar que este busca a racionalização dos procedimentos, de modo a facilitar, simplificar e desburocratizar os trâmites processuais, visando, em última instância, ampliar a efetividade das tutelas pretendidas por meio do processo civil, bem como conferir substância ao princípio constitucional da razoável duração do processo.

Por fim, outra série de mudanças fundamentais trazidas pelo novo CPC diz respeito à regulamentação das demandas relativas à advocacia. O novo código reconheceu pleitos históricos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), reforçando o que já consagrava a Constituição Federal, em seu art. 133, no tocante à indispensabilidade do advogado para a administração da Justiça.

O Estado democrático de direito, o devido processo legal e o acesso à justiça somente são possíveis com a atuação e o trabalho do advogado. É ele quem detém o jus postulandi, isto é, a prerrogativa de postular junto às instâncias judiciais, seja para apresentar uma pretensão resistida à Justiça, solicitando a sua intervenção, seja para defender um cidadão de um pedido ou acusação que contra ele se faz.

Reconhecendo a importância da figura do advogado para a realização da justiça e para a tutela dos direitos e garantias constitucionais, o novo CPC instituiu a contagem de prazos em dias úteis e as férias dos advogados, concedendo direitos fundamentais à classe, há muito já reconhecidos a outras profissões, mas negados até então aos advogados. Instituiu, também, o julgamento cronológico dos processos, provendo maior certeza e segurança aos advogados e respeito aos seus pleitos.

O Código também reconheceu a natureza alimentar dos honorários advocatícios, a qual foi ratificada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por meio da Súmula Vinculante no 47. Foram garantidos, ainda, os honorários da Advocacia Pública – direito de qualquer advogado. Quanto à fixação de honorários contra a Fazenda Pública, definiu-se critérios de fixação objetivos e justos, a fim de se enfrentar o problema estabelecido pelo Código anterior, que, nas causas em que fosse vencida a Fazenda, permitia “fixação equitativa” pelo juiz, o que na prática dava margem para o aviltamento de honorários e a desvalorização da profissão.

São inúmeras as conquistas da classe no novo diploma, que representam o reconhecimento da sociedade e da ordem jurídica em torno da profissão da advocacia.

O novo Código instaura, portanto, nova era na processualística civil brasileira. Requer não apenas mudanças de prática, mas de cultura e mentalidade, influindo na forma como os operadores do Direito enxergam e aplicam o processo civil. Este deve ser encarado como instrumento de tutela e de realização dos direitos. E essa tutela somente será efetiva se ocorrer em tempo hábil, se fornecer segurança jurídica às partes e se resolver, verdadeiramente, suas pretensões e os conflitos levados em juízo.