Onde se conta a jamais imaginada trajetória de Orpheu Santos Salles

3 de maio de 2021

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Recebi com muita satisfação o convite do Ministro do Superior Tribunal de Justiça Luis Felipe Salomão, Presidente do Conselho Editorial da Revista Justiça & Cidadania, e de seu Editor-Chefe, Tiago Salles, para, no ano do centenário de nascimento do jornalista Orpheu dos Santos Salles, tecer algumas considerações sobre sua trajetória.

Desse modo, inicio estas breves palavras, registrando que não existe democracia sem independência dos Poderes da República e sem uma imprensa livre. Orpheu serviu com distinção a esses pilares fundamentais da melhor tradição democrática. Nascido em 17 de outubro de 1921, em São Paulo, ele conquistou prestígio, estima e admiração por onde passou, com uma trajetória de luta em prol do Direito e das causas sociais, que teve como pano de fundo as profundas transformações econômicas, sociais e políticas atravessadas pelo País, do Estado Novo à Nova República.

Em 1943, quando uma caravana de alunos da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco foi ao Rio de Janeiro conhecer Getúlio Vargas, Orpheu chamou a atenção como orador da turma e foi convidado pelo próprio Vargas para trabalhar em seu gabinete. Tornou-se amigo pessoal do Presidente, que voltou a convidá-lo a compor o gabinete, em 1950, quando, eleito, retornou ao poder e, mais tarde, o designaria chefe da Delegacia do Trabalho em Santos (SP).

Contudo, após o suicídio do Presidente e a greve dos portuários e marítimos de 1954, Orpheu deixa o governo e passa a se dedicar ao jornalismo na extinta Rádio Marconi.

Fundador da Revista Justiça & Cidadania, Orpheu, com pena firme, sempre realçou o papel da Justiça, em especial na divulgação e conscientização dos direitos fundamentais e do pleno exercício da cidadania.

Em abril de 2014, Orpheu foi eleito diretor administrativo da Associação Brasileira de Imprensa (ABI). Quando faleceu aos 94 anos, em 2016, ainda atuando como redator e editor da Revista JC, Orpheu Salles era o sócio mais antigo da ABI e o último integrante vivo do gabinete de Governo Vargas.

Foi Orpheu quem criou os Troféus Dom Quixote e Sancho Pança, que tiveram como primeiros agraciados o então Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Carlos Velloso, e seu Vice-Presidente, Ministro Marco Aurélio Mello. Hoje, após 29 edições do prêmio, já são mais de 500 homenageados entre as personalidades do mundo jurídico que mais se destacaram em defesa da ética e dos direitos da cidadania.

Leitor do escritor espanhol Miguel de Cervantes, de cuja obra tirou a inspiração para a Revista e para os Troféus, Orpheu Salles fez de sua própria vida uma verdadeira epopeia de coragem, renúncia e determinação. Viveu sonhando, realizando, correndo riscos, como um Dom Quixote. Atacou os moinhos de vento e verdadeiramente nos ensinou a:

“Sonhar o sonho impossível,

Sofrer a angústia implacável,

Pisar onde os bravos não ousam,

Reparar o mal irreparável,

Amar um amor casto a distância,

Enfrentar o inimigo invencível,

Tentar quando as forças se esvaem,

Alcançar a estrela inatingível:

Essa é a minha busca.”

(Dom Quixote)