OAB na defesa do mercado da advocacia

5 de novembro de 2020

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Ordem atua contra startups e escritórios estrangeiros irregulares no País

A atuação da OAB Nacional na defesa da advocacia brasileira alcançou, nos últimos meses, escritórios de advocacia estrangeiros que firmaram contratos com empresas estatais, como a Petrobras e o Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES). As investigações identificaram irregularidades em mais de 20 escritórios contratados pelas empresas, que deverão ter suas inscrições canceladas pela OAB. A assessoria jurídica da Ordem também avalia medidas que poderão ser adotadas para garantir que não haverá desrespeito à legislação da advocacia em todos os contratos efetuados pelas estatais, com ou sem licitação.

“O mercado brasileiro é cobiçado pela advocacia mundial, é um mercado de mais de R$ 50 bilhões por ano, e é tarefa da Ordem resguardar esse mercado”, afirmou o Presidente da OAB, Felipe Santa Cruz. “Se é certo que queremos nos aproximar do comércio internacional, da advocacia de vários países, também é certo que é nossa tarefa resguardar o mercado nacional”, continuou. Para Santa Cruz, a advocacia precisa estar atenta à concorrência desleal e a qualquer irregularidade na contratação de escritórios estrangeiros.

“A OAB está permanentemente vigilante quanto a essa realidade. Já agimos concretamente em relação ao BNDES e à Petrobras, que vinham contratando bancas internacionais com honorários altíssimos, fora dos parâmetros para pagamento nacional. Nós já denunciamos esses contratos e estamos intimando as bancas, porque na nossa leitura e na da Corregedoria Nacional, que tem feito um belo trabalho nesse sentido, não houve a observância da nossa legislação”, disse Santa Cruz.

As investigações conduzidas pela Coordenação Nacional de Fiscalização da Atividade Profissional da Advocacia sobre a atuação desses escritórios tiveram início após notícias publicadas na imprensa e denúncias encaminhadas por seccionais da OAB. De acordo com as notícias, a atuação dos escritórios contratados pela Petrobras envolveria custos em torno de R$ 200 milhões.

Após análise dos contratos realizados pela Petrobras com 24 escritórios para prestarem consultoria, nos últimos cinco anos, a Coordenação constatou irregularidades em 22 deles. A apuração foi realizada com base nos contratos enviados pela estatal para atuação somente acerca de direito estrangeiro. Dos 24 escritórios, dois possuem inscrição como consultores estrangeiros junto à OAB-RJ, quatro possuem inscrição junto à OAB-SP e não foram localizadas inscrição de 18 escritórios.

A Coordenação identificou indícios de que alguns escritórios, de algum modo, desempenharam suas atividades no território brasileiro, com cláusulas expressas de realização de algumas atividades no Brasil, contrariando as normas. Outros contratos preveem a realização de despesas para atividades excepcionais realizadas no Brasil. Identificou-se ainda contrato que prevê a prestação de serviços jurídicos relacionados à legislação brasileira.

“Não assiste fundamento ao argumento da Petrobras no sentido de que as consultorias jurídicas contratadas foram prestadas exclusivamente em território estrangeiro ou em outro estado que não o do Rio de Janeiro”, afirma o despacho do corregedor nacional e coordenador nacional de Fiscalização, Ary Raghiant Neto. “E, da análise da atuação desses escritórios estrangeiros em território brasileiro, ainda que por atuação remota, constata-se, em tese, violação à legislação aplicável à assessoria jurídica estrangeira no território nacional, especialmente a Lei nº 8.906/1994 e do Provimento nº 91/2000 do Conselho Federal da OAB (CFOAB)”, continua o documento.

O art. 3º da lei estabelece que “o exercício da atividade de advocacia no território brasileiro e a denominação de advogado são privativos dos inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil”.  E o artigo 1º do Provimento afirma que “o estrangeiro profissional em Direito, regularmente admitido em seu país a exercer a advocacia, somente poderá prestar tais serviços no Brasil após autorizado pela Ordem dos Advogados do Brasil”.

A análise concluiu que apenas dois entre os escritórios contratados cumpriram o Provimento com inscrição no Rio, circunscrição da sede da Petrobras: Hogan Lovells e Baker Botts. Outros quatro escritórios possuem inscrição junto à OAB-SP, seccional diversa daquela onde prestou o serviço, violando a Provimento: Cleary Gottlieb Steen & Hamilton, Clyde & Co, Gibson, Dunn & Crutcher e While & Case.

Quanto à atuação dos demais escritórios que não possuem inscrição nos quadros da OAB, o despacho enfatiza que a prestação de serviços “revela-se irregular quando praticados por sociedades não inscritas na OAB o que, em tese, constitui contravenção penal de exercício ilegal da profissão, conforme art. 47 do Decreto-Lei nº 3.688/1941 e art. 4º do Regulamento Geral da OAB”.

O documento considera que a contratação de escritórios estrangeiros sem inscrição na OAB ou com inscrição irregular “não atende o interesse público, tampouco os critérios de lisura dos procedimentos, de licitude e de probidade, podendo configurar má gestão de recursos públicos”.

A corregedoria determinou às seccionais da OAB no Rio e em São Paulo que abram procedimento administrativo interno para suspender/cancelar as inscrições dos escritórios. A assessoria jurídica do CFOAB vai avaliar a possibilidade de oferecer representação junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) informando o descumprimento da legislação pela Petrobrás.

Procedimento semelhante já foi determinado às duas seccionais, do Rio de Janeiro e de São Paulo, quanto aos contratos do BNDES com escritórios estrangeiros, envolvendo os escritórios Cleary Gottlieb Steen & Hamilton, Clifford Chance e White & Case, além do escritório nacional Levy & Salomão por ter prestado consultoria em Direito nacional, na modalidade de concurso, em conjunto o escritório estrangeiro Cleary Gottlieb Steen & Hamilton. A Corregedoria Nacional da OAB vai acompanhar as medidas adotadas pelas seccionais.

Na mesma linha de defesa do mercado brasileiro, as ações da Coordenação de fiscalização resultaram em mais de 90 notificações a sites e plataformas que oferecem serviços jurídicos privativos de advogados. As startups aéreas e jurídicas concentraram grande parte dessas denuncias.

A valorização do exercício da advocacia, com a defesa de suas prerrogativas e de suas atividades privativas, é um dos pilares da atuação da OAB Nacional, juntamente com a defesa do Estado Democrático de Direito. Criada por portaria do Presidente Felipe Santa Cruz no final do ano passado, a Coordenação desenvolve ações de fiscalização do exercício profissional em todo o País, com o objetivo de impedir o exercício ilegal.

Neste período de pandemia do novo coronavírus, de 17 de março a 13 de outubro, a Coordenação instaurou mais de 110 procedimentos e mais de 40 empresas e mais de 40 escritórios estrangeiros foram investigados no período. Considerando o período de janeiro a meados de outubro, tramitaram 214 denúncias na Coordenação de Fiscalização.

As principais infrações denunciadas envolveram a prática de captação indevida de clientela, o uso de publicidade irregular e o exercício irregular de atividade privativa de advogado. As denúncias recebidas se desdobraram em investigações envolvendo aproximadamente 288 advogados, 40 escritórios de advocacia estrangeiros, 32 escritórios de advocacia brasileiros, 49 pessoas jurídicas não inscritas na OAB e seis pessoas físicas não inscritas na OAB.

O coordenador e secretário-geral adjunto, Ary Raghiant, considerou que os números demonstram o acerto da diretoria na criação do órgão, que atua em parceria com as seccionais. “Os resultados até aqui alcançados são visíveis e servem para coibir ações repetidas e para orientar aqueles que não agem com dolo”, disse Raghiant.

O Código de Ética e Disciplina da OAB estabelece que a publicidade profissional do advogado tem caráter meramente informativo, não podendo configurar captação de clientela ou mercantilização da profissão. Levantamento realizado pela Coordenação de Fiscalização apontou que a maior parte das startups notificadas atua oferecendo serviços a clientes de companhias aéreas, buscando captar clientes indevidamente, atingindo atividades privativas dos advogados.

Nas investigações, a Coordenação também notificou startups que prometem conectar advogados e clientes, contrariando as regras que não permitem a atuação de plataformas de intermediação entre clientes e advogados. Foram notificadas 68 startups aéreas, dez startups jurídicas, oito empresas de consultoria e auditoria e cinco empresas privadas. Na lista, há empresas que cometeram mais de uma infração, como, por exemplo, a captação indevida por meio de publicidade irregular.

Outras infrações computadas foram: exercício irregular da atividade de advocacia, exercício da profissão quando impedido, prestar concurso a terceiros para realização de ato contrário à lei e fazer falsa prova para inscrição na OAB.