O Judiciário e a retomada da economia no Rio

14 de setembro de 2021

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Por Luis Felipe Salomão*, Monica di Piero**, Agostinho Teixeira de Almeida Filho*** e Flavio Galdino****

Ainda ameaçada por novas variantes do coronavírus, a retomada das atividades econômicas é um desafio de grandes proporções. Há o consenso inequívoco de que inúmeras atividades necessitarão de investimentos pesados, algumas precisarão ser reestruturadas e, infelizmente, outras terminarão por ser liquidadas. Tudo isso deve ser feito da forma mais eficiente possível. Para tanto, é imperativo que seja criado um ambiente de segurança jurídica, de modo a não prejudicar os direitos de terceiros e trabalhadores. Diversamente dos Poderes Executivo e Legislativo, a quem competem a idealização e a implementação de políticas públicas, o Judiciário tem a incumbência de atuar para resolver e pacificar, com justiça, as inúmeras disputas que se apresentam em razão da crise econômica. Quando os agentes econômicos não se entendem acerca das alocações dos prejuízos e/ou dos investimentos, das reestruturações ou das liquidações, as disputas são formalizadas por meio de litígios societários, recuperações e falências, que são submetidos ao Poder Judiciário.

Assim, cabe ao Judiciário organizar-se para atuar de modo eficiente, propiciando o maior grau de segurança jurídica aos agentes econômicos, o que se traduz em estabilidade e previsibilidade.

No plano internacional, diversos estudos ressaltam a relevância da criação de um ambiente seguro para o desenvolvimento de atividades empresariais. Em comum, todos eles apontam a necessidade de aparelhamento dos órgãos judiciários com instrumentos capazes de propiciar estabilidade e previsibilidade. Nesse instrumental, destaca-se sempre a necessidade de especialização dos órgãos judiciários, para fazer frente à acelerada complexidade das relações sociais e econômicas.

Também no Brasil, estudos capitaneados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e por outras instituições ressaltam a relevância da especialização dos órgãos judiciários para a otimização do ambiente de negócios, evidenciando que órgãos especializados apresentam padrões de eficiência substancialmente elevados em relação àqueles não especializados.

No Rio de Janeiro, as questões empresariais já são submetidas à apreciação de órgãos especializados em primeiro grau. As Varas Empresariais especializadas contam 20 anos e gozam do reconhecimento dos próprios integrantes do Judiciário, dos advogados militantes e da comunidade empresarial. Todavia é imperioso prosseguir e, como muito bem ressaltado pelo desembargador Henrique Figueira, presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), em recente seminário, dar um passo adiante no sentido de especializar também a jurisdição em matéria empresarial no âmbito do segundo grau.

A experiência da especialização em segundo grau é bem-sucedida em todos os tribunais em que foi aplicada. Em Cortes com muitos magistrados, surgem divergências naturais de interpretações acerca da mesma lei federal, sendo certo que o tempo representa uma variável muito sensível e custosa. A necessidade de segurança jurídica e eficiência impõe a criação de órgãos especializados, que sejam capazes de produzir decisões em ritmo eficiente e que possam estabilizar a jurisprudência, trazendo a indispensável previsibilidade.

Além das pesquisas comprovando a eficiência da especialização em segundo grau, disponíveis no site do Banco Mundial, há recomendação específica do CNJ para que os Tribunais de Justiça promovam a especialização de varas e a criação de câmaras ou turmas especializadas em falência, recuperação empresarial e outras matérias de Direito Empresarial.

Essa será uma decisiva contribuição do Poder Judiciário para a retomada das atividades econômicas no Estado do Rio de Janeiro.

*Ministro do Superior Tribunal de Justiça
**Desembargadora do TJRJ
***Desembargadore do TJRJ
****Professor de Direito Processual na Faculdade de Direito da Uerj.

Os quatro autores integram o Grupo de Trabalho do CNJ para sugerir medidas voltadas à modernização e à efetividade do Poder Judiciário nos processos de recuperação empresarial e de falência

Publicação original: O Globo