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Inversão do Ônus da Prova. Relação de Consumo. Hipossuficiência Técnica e Hipossuficiência Econômica.

5 de setembro de 2001

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É direito do consumidor, assegurado pelo Código de Defesa do Consumidor, a facilitação da defesa dos seus direitos, com a inversão do ônus da prova, quer quando verossímil sua alegação, quer quando hipossuficiente.

O princípio da inversão do ônus da prova, consagrado no inciso VIII, do art. 6º, da lei nº 8.780/90, é um dos princípios norteadores do CODECON, em perfeita sintonia com os demais princípios consumeristas que se dirigem ao atendimento das necessidades do consumidor, reconhecendo o princípio da vulnerabilidade do consumidor no mercado do consumo (inc. I) e assegurando o acesso aos órgãos judiciários e administrativos (inc. VII).

A hipossuficiência técnica do consumidor não se confunde, no entanto, com a hipossuficiência econômica.

A hipossuficiência econômica está amparada pela Lei nº 1.060/50, que assegura os benefícios da gratuidade de justiça a todos aqueles que não podem arcar com as custas judiciais sem o desfalque do necessário ao seu sustento ou de sua família.

A hipossuficiência técnica do consumidor, como causa de inversão do ônus da prova, visa preservar o incauto, o inciente, aquele que por falta de cultura ou de experiência ordinária, se deixa ludibriar em um contrato de consumo.

Invertendo o ônus da prova, na defesa do hipossuficiente técnico, a lei consumerista transfere ao produtor ou prestador de serviços o ônus de provar sua inocência.

Como de sabença, até o advento da lei de defesa do consumidor, o ônus de provar a culpa do produtor ou do prestador de serviços era do consumidor.

Com a nova regra, basta a justificada assertiva do consumidor, de que há vício no produto, quer de ordem qualitativa, como de ordem quantitativa, para transferir ao produtor ou ao prestador do serviço o ônus de provar sua inocência.

Ao produtor ou prestador de serviço cabe, para eximir-se da responsabilidade, atribuir e provar a culpa pelo vício ao consumidor ou a terceiro.

A inversão do ônus da prova, em frontal discordância com a regra inserida no art. 333, da Lei de Ritos, é corolário do princípio do acesso aos órgãos judiciários ou administrativos, facilitando o acesso à justiça, assegurado a ampla reparação dos danos.

Está, no entanto, sujeito a dois pressupostos expressos no inc. VII, do art. 6º, do Código de Defesa do Consumidor: a verossi-milhança da alegação e a hipossuficiência.

Comentando o texto legal, esclareceu o Desembargador Jorge de Miranda Magalhães (Princípios Gerais do Código de Defesa do Consumidor: Visão Histórica, publicado na Revista da EMERJ, vol. 2, nº 06, 1999):

“Não há que se confundir aqui, hipossuficiência técnica, a respeito das regras ordinárias de experiência, com a hipossuficiência econômica, responsável pela concessão da Justiça Gratuita aos que não possam enfrentar as custas judiciais sem o desfalque do necessário ao seu sustento, nos termos da Lei nº 1060/50 (Lei de Assistência Judiciária).

Aqui, a lei quis proteger o leigo, o incauto, o inciente, aquele que, por falta de cultura ou de experiência ordinária, se deixa ludibriar em um contrato de consumo, do qual lhe resultem danos materiais ou morais.”

Se não se trata de hipossuficiência econômica e sim de hipossuficiência técnica, a inversão do ônus da prova não implica na inversão do ônus do pagamento dos honorários periciais.

Aliás, o inciso VII, do art. 6º, da Lei 8780/90, ao reconhecer a vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo, assegurando o acesso aos órgãos judiciais e administrativos como um de seus direitos básicos, referiu-se à proteção jurídica, administrativa e técnica dos necessitados.

Há evidente e clara distinção. Se o consumidor é necessitado, seu direito como hipossuficiente econômico está amparado pela Lei nº 1.060/50. Se, no entanto, a hipótese é de hipossuficiência técnica, a lei consu-merista, como garantia dos direitos básicos do consumidor, visando assegurar o acesso aos órgãos judiciários e administrativos, concedeu a inversão do ônus da prova, imputando ao produtor ou ao prestador do serviço o ônus de provar sua inocência.