Controle externo do Judiciário

5 de junho de 2003

Vice-Prefeito de São Paulo e Presidente da Comissão Municipal de Direitos Humanos

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O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Marco Aurélio de Mello, ao comentar as propostas existentes para a instituição do chamado controle externo da magistratura, pôs em evidencia a circunstancia de que, ao criarmos um órgão controlador do Poder Judiciário, sedamos levados, talvez a curto prazo, a criar um outro órgão controlador e assim por diante, ad infinitum.

E, realmente, assim é. Se entendermos fundamental que tenhamos um órgão que controle e fiscalize o Poder Judiciário, esse órgão, ao se desviar de suas finalidades, estaria a requerer a existência de órgão que lhe seja superior.

Essa questão do controle externo de órgão ou instituições governamentais tem sido posta no plano das discussões com alto grau de emocionalidade, como – no caso da magistratura – se todas as mazelas decorrentes da atividade jurisdicional fossem o resultado da má atuação dos nossos juízes.

Se as causas entregues a decisão da Justiça se eternizam com as características, muitas vezes, de verdadeira denegação de justiça, importando, na área criminal, na impunidade de delinqüentes de todas as espécies, semelhante situação não pode ser imputada, pura e simplesmente, a atuação dos juízes. Ela é resultante de omissões que impediram, até hoje, a modernização do sistema judiciário, amarrado, ainda, ao espírito das remotas Ordenações do Reino, do Brasil Colônia.

Diante do aumento do numero de demandas, na área criminal e em outras áreas, como civil, comercial, administrativa etc., manteve-se a mesma organização judiciária que qualificou o século passado, herdeiro de um sistema incapaz de responder as premências de uma sociedade em constante ascensão.

Ao invés de ir-se ao cerne da questão que é uma real descentralização da atividade judiciária – passou-se a criação de uma incipiente Justiça de Pequenas Causas, numa discriminação capitalista do que sejam causas grandes ou pequenas, tendo em vista seu valor expresso em moeda corrente.

Os resultados obtidos não foram expressivos, de tal arte que a situação de crise perdurou, com reflexos negativos em todas as áreas de sua atuação. Nessa mesma linha de pensamento, os tribunais de alçada que se constituíram numa esperança para o desafogo da Justiça de segunda instância, começam a desaparecer, absorvidos pelos tribunais de Justiça.

Assim, no campo da reforma, seria importante que os juízes de primeira instancia e os jurisdicionados estivessem mais próximos, atuando em pequenos distritos, resultantes da divisão das grandes cidades. Os tribunais de Justiça seriam também descentralizados, atuando em regiões do estado, estrategicamente selecionadas.

O órgão harmonizador da jurisprudência, em nível estadual, permaneceria nas capitais. O Superior Tribunal de Justiça passaria a atuar como o responsável, em nível federal, pela nivelação da jurisprudência.

Ao Supremo Tribunal Federal incumbir-se-iam, tão somente, as questões constitucionais.

É evidente que, paralelamente, deveriam ser revistos os códigos processuais, para que as demandas pudessem ser agilizadas na colheita da prova, perante os juízos inferiores, e, depois, nas decisões dos colégios superiores.

Com semelhante organização, contaríamos não com um órgão, mas com um sistema controlador, cujas responsabilidades seriam divididas entre os jurisdicionados, sempre próximos dos juízos, advogados e membros do Ministério Público.

Dessa maneira, não seria necessária a criação de um órgão, de duvidosa constitucionalidade, pois, segundo o artigo 20° da Carta Magna brasileira, os poderes da União (Legislativo, Executivo e Judiciário) são independentes e harmônicos entre si.

Como, portanto, criar-se um órgão que, sem ter as prerrogativas do Judiciário, a ele se sobreponha? De que natureza será esse órgão? Ou será mais um poder da União?

São pontos a refletir e que evidenciam, senão a desnecessidade do órgão controlador, a sua, descaracterização institucional.

Para chegarmos ao controle desejado – o mais amplo possível – é preciso que sejam feitas, em primeiro lugar, as reformas das leis processuais, para que, com uma descentralização para valer, de juízos e tribunais, fiquem próximos partes, magistrados e demais operadores do Direito, tornando, assim, realmente efetiva, uma fiscalização que, ao invés de vir de cima para baixo, será feita paralelamente aos juízos e tribunais.

Mais do que um órgão controlador, necessitamos, isto sim, de um sistema de controle, abrangente e não burocratizado. E ai de apelar-se a participação popular, pedra de toque do moderno Estado Democrático de Direito.

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